mulher 300x225 Estados latino americanos descumprem direitos das mulheres
Cidade do México, México, 10/5/2013 – Os Estados latino-americanos seguem em dívida quanto à garantia de direitos educacionais, sexuais e reprodutivos das mulheres, segundo ativistas de diferentes regiões do mundo reunidas na capital mexicana. “Há temas pendentes em economia, educação, violência e saúde sexual e reprodutiva. O cumprimento das leis é a parte mais fraca. Não há uma política integral dos governos para atender esses temas”, disse à IPS a argentina María Oviedo, responsável em capacitação do não governamental Comitê da América Latina e do Caribe para a Defesa dos Direitos das Mulheres (Cladem).
Oviedo participou, junto a dezenas de defensoras de direitos femininos da América Latina, Europa, Ásia e África, do seminário Incidência em rede: o desafio para que os Estados cumpram os direitos humanos das mulheres, que começou no dia 7 e acaba hoje. Essa rede, criada em 1987, lançou em 2011 a campanha mundial Por um Estado que Cumpra os Direitos Humanos das Mulheres. Já é Hora, Já é Tempo, com financiamento da União Europeia e da organização holandesa Oxfam Novib, que terminará em 2015.
Na América Latina os indicadores de educação primária, trabalho e renda melhoraram na última década, mas as mulheres ainda enfrentam brechas importantes em relação aos homens, as quais mantêm a persistência da desigualdade de gênero, em uma região com uma cultura muito patriarcal. Os homens somam 163 milhões e as mulheres 113 milhões da população economicamente ativa da região, e a previsão para 2020 é que esses números cheguem a 188 milhões e 141 milhões, respectivamente, segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).
Além disso, a participação na atividade econômica das mulheres da região está aumentando e a Cepal calcula que em 2020 as que trabalharão fora de casa representarão 56% do total, contra 52% em 2010. “Na violência cotidiana impera a desigualdade e a injustiça. Onde estão emperradas todas as lutas das mulheres é nos processos de justiça. Por isso é preciso mudar estruturas”, disse à IPS a especialista Gabriela Delgado, do Programa Universitário de Direitos Humanos da estatal Universidade Autônoma Nacional do México.
Entre as obrigações pendentes dos Estados figuram reformas legislativas para alcançar a igualdade formal, aplicação de políticas para conseguir essa meta no acesso a recursos econômicos, viver sem violência, dispor de direitos sexuais e reprodutivos, além de educação antidiscriminatória e não sexista.
As ativistas identificaram leis que toleram a violação sexual, sob pretextos como casamento entre vítima e algoz; que estipulam idades diferentes para homens e mulheres se casarem, ou maiores direitos matrimoniais para os homens em países como Argentina, Bolívia, Guatemala, Haiti, Nicarágua e Panamá. Na região, entre 17% e 53% das mulheres sofrem violência, e o que agrava esse panorama é que 92% das denúncias ficam impunes. Além disso, apenas dez nações latino-americanas despenalizaram o aborto, enquanto na maioria ainda predominam legislações que o proíbem ou restringem.
Para a espanhola Rosa Cobo, acadêmica da Universidade A Coruña, surge uma mescla de formas de violência antigas que ressuscitam e outras novas, associadas a fenômenos emergentes como a economia ilegal e o crime organizado. “Vivemos um cenário mundial de desordem geopolítica, econômica, política e patriarcal que produz um excedente de violência que sempre recai em setores que estão em inferioridade social ou mais fracos”, explicou Cobo à IPS.
A especialista citou entre essas manifestações os feminicídios na Guatemala e em Ciudad Juárez, na fronteira do México com os Estados Unidos, a violência de gênero em conflitos armados, o tráfico de mulheres para exploração sexual, e a compra de noivas na Ásia. As ativistas querem dos Estados a garantia de igualdade entre mulheres e homens, mediante a eliminação de normas e práticas discriminatórias, o impulso da igualdade e divisão de responsabilidades nos trabalhos domésticos para erradicar a pobreza, e uma vida livre de violência para mulheres e meninas.
Também pedem autonomia sexual e reprodutiva, acesso a recursos e serviços nessa área e educação laica, intercultural, não sexista e não discriminatória. Os fenômenos citados “mostram uma dívida preocupante e que demorarão anos para serem abatidos”, afirmou Oviedo. O Cladem, cuja sede principal fica em Lima, no Peru, iniciou aCampanha por uma Educação não Sexista e Antidiscriminatória para contar com um ensino baseado em relações de respeito, igualdade e cooperação entre os gêneros.
“Não haverá uma relação entre esta violência extrema e a obtenção de direitos das mulheres nos últimos anos?”, perguntou Cobo. Esse tipo de violência “manifesta uma vontade de controle como resposta a uma realidade social que questiona o estatuto das mulheres. Definiu-se um deslocamento da violência do espaço conhecido para o desconhecido, no qual homens matam mulheres que não conhecem”, acrescentou. Envolverde/IPS