quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Clínicas estão oferecendo “reversão do aborto” nos EUA – e arriscando a vida de mulheres


Um estudo sobre a eficácia do procedimento teve que ser interrompido por causar hemorragia grave nas pacientes

Decidir fazer ou não um aborto pode ser uma das decisões mais difíceis da vida de uma mulher. Em situações ideais, o procedimento pode ser feito em uma clínica médica especializada, ou tomando dois remédios específicos. Aí está feito. Mas agora, instituições estão prometendo “reverter o aborto” e dar continuidade à gravidez.

No Brasil, o aborto induzido só é permitido por Lei se a gravidez representar risco para a vida da gestante – caso seja resultado de estupro ou se o feto for anencefálico (não possuir cérebro).
Nos Estados Unidos é diferente. O aborto é legalizado com restrições e especificidades da Lei de cada estado. Após passar por uma série de exames e consultas, a mulher pode optar pelo aborto. 
No caso dos remédios, a paciente deve tomar o primeiro medicamento, chamado mifepristona, nas primeiras dez semanas de gravidez. A substância bloqueia a progesterona, hormônio responsável pela manutenção da gestação e fixação do feto na parede do útero. Depois de um ou dois dias, a mulher toma a segunda pílula, de misoprostol, que causa um sangramento e expulsão do feto.
É aí que a “reversão do aborto” entra. Ativistas antiaborto afirmam que, se a mulher ainda não tiver tomado a segunda pílula, ela pode reverter o procedimento. Algumas clínicas oferecem altas doses de progesterona para as mulheres “retomarem” a gravidez.
Oito estados americanos exigem que os médicos ofereçam essa opção para mulheres que buscam pelo aborto. O problema é que esse procedimento pode ser extremamente perigoso para as mulheres.
Segundo a Associação Americana de Obstetras e Ginecologistas, tratamentos de reversão do aborto não são sustentados pela ciência: as poucas pesquisas existentes a favor da reversão não possuem o rigor científico e ética necessários.
Um estudo feito com 40 mulheres pretendia verificar se introduzir progesterona após a primeira pílula realmente interromperia o aborto de maneira eficaz e segura. As participantes – que já haviam optado pelo aborto cirúrgico após a finalização da pesquisa – tomaram a primeira pílula e em seguida receberam ou a dose de progesterona ou um placebo.
Acontece que a pesquisa não pôde ser concluída. Apenas 12 participantes haviam começado o procedimento quando ele precisou ser interrompido para preservar a segurança e a saúde das mulheres. Três participantes tiveram hemorragias fortes ao deixar de tomar a segunda pílula.
A hemorragia faz parte do processo de aborto, mas o sangramento sofrido pelas pacientes foi muito mais grave que o esperado. As três precisaram receber tratamento de emergência – uma delas precisou de transfusão de sangue.
Duas dessas mulheres haviam recebido a progesterona, e uma tinha tomado o placebo. Ou seja, o mero fato de não tomar o segundo medicamento, com ou sem o uso de progesterona, já leva a um risco de hemorragia grave, que coloca a vida em risco.  
A Associação Médica Americana se opõe fortemente às leis que exigem que os médicos ofereçam a reversão do aborto às pacientes. “Somos contra qualquer lei ou regulação que limite nosso direito de conversar honestamente com os pacientes sobre sua saúde e tratamentos. Essas leis obrigam profissionais a dar informações falsas e sem evidências às pacientes”, disse a presidente da associação Patrice A. Harris ao Washington Post.

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