Bélgica debate estender direito à eutanásia a crianças
Márcia Bizzotto
De Bruxelas para a BBC Brasil
O Senado belga está debatendo uma proposta de lei que estenderia aos menores de idade o direito de solicitar eutanásia, legalizada para os adultos em 2002.
A proposta foi apresentada pelos líderes de quatro dos cinco partidos que formam o governo de coalizão - os socialistas PS e SPA e os liberais MR e Open VLD - sendo que os dois maiores partidos da oposição, Ecolo e Groen, já expressaram seu apoio, o que garantiria a aprovação da ideia.
A Bélgica é um dos poucos países do mundo que autoriza a morte assistida, junto com Suíça, Luxemburgo e Holanda - este último o único onde o direito se aplica também a menores de idade, apesar de nenhum caso ter sido registrado até hoje.
O objetivo da proposta é "atender as crianças que se encontram em uma situação médica sem solução, que enfrentam um sofrimento físico ou psíquico constante e insuportável", explicou ao jornal La Libre Belgique o senador socialista Philippe Mahoux, um dos autores do texto, que também participou da elaboração da lei de 2002 sobre o direito à eutanásia.
Capacidade de discernimento
Os senadores preferiram não determinar uma idade a partir da qual uma criança poderia solicitar o procedimento.
Caberia a um pedopsiquiatra (psiquiatra de crianças) ou a um psicólogo julgar sua capacidade de discernimento e atestar que o paciente é consciente das consequências de seu pedido antes de aprová-lo.
"Todos os especialistas pediátricos consultados (para a elaboração da proposta) insistiram sobre a extraordinária maturidade que as crianças tendem a adquirir quando enfrentam uma doença letal", afirmou Mahoux, médico de formação.
No entanto, durante os debates no Senado, Dominique Biarent, chefe da unidade de tratamento intensivo do Hospital Universitário Infantil Rainha Fabiola, chamou atenção para o fato de que "até os 7 ou 8 anos de idade as crianças não compreendem o caráter definitivo da morte".
"Até os 7 ou 8 anos de idade as crianças não compreendem o caráter definitivo da morte"
Dominique Biarent, médico
Também seria necessário a autorização dos pais do paciente.
Controvérsia
A ampliação da lei conta com o apoio da Associação pelo Direito a uma Morte Digna e do Centro pela Igualdade de Oportunidades e pela Luta Contra o Racismo, mas é duramente criticada pela Igreja católica belga.
"É estranho que os menores de idade sejam considerados legalmente incapacitados para certos atos, como casar-se, mas de repente sejam suficientemente maduros para pedir que os matem", ressaltou em um comunicado o arcebispo André-Joseph Léonard, presidente da Confederação Episcopal da Bélgica.
Os religiosos defendem que, em lugar de estudar ampliar o direito à eutanásia, os legisladores belgas deveriam analisar como o sistema público de saúde poderia cuidar melhor dos portadores de doenças incuráveis.
"Hoje em dia dispomos de cuidados paliativos eficientes e, em caso de intenso sofrimento, podemos apelar à sedação como último recurso", afirmou Léonard.
A proposta em trâmite também prevê um acompanhamento psicológico por tempo indefinido para os pais de uma criança que receba eventualmente a eutanásia.
O Senado ainda não determinou a data de votação, mas os autores do texto querem que ocorra antes do início das férias parlamentares, dia 26 de julho.
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