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quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Cantadas fora de lugar

A enorme repercussão do movimento Chega de Fiu-Fiu mostra que há algo de errado na forma como as mulheres são tratadas nas ruas do Brasil. O que se pode fazer sobre isso

THAIS LAZZERI

A edição 798 de ÉPOCA trouxe um artigo da jornalista Karin Hueck destinado a fazer barulho. Com o título de “As cantadas ofendem”, ele apresentava o resultado de uma campanha na internet contra a maneira desrespeitosa como os homens se dirigem às mulheres nas ruas do Brasil, promovida pelo site Think Olga, um espaço virtual para discutir questões femininas. Com o nome de “Chega de Fiu-Fiu”, o movimento conseguiu que mais de 8 mil mulheres respondessem a um questionário online com a experiência delas da abordagem masculina. O resultado: 99% afirmaram ser incomodadas nas ruas. 85% disseram ter sido tocadas ao andar sozinhas. Apenas 27% reclamam porque todas acham que podem apanhar. 51% sentem medo quando saem às ruas.
Publicado em epoca.com.br na semana passada, o artigo de Karin foi lido por 90 mil pessoas e obteve um enorme índice de aprovação: 25 mil pessoas apertaram o botão de “curtir”. Ao pé do texto, uma enquete organizada pelo site de ÉPOCA tentava entender melhor o que os nossos leitores pensam sobre o assunto. Perguntamos: “Você concorda que cantar mulheres na rua é ofensivo?” Pouco mais de 6 mil leitores responderam, da seguinte maneira: Sim, é ofensivo (65,42%); Depende do tipo de cantada (32,29%); Não é ofensivo (2,29%).
A pesquisa do Think Olga e a enquete de epoca.com.br parecem sinalizar a mesma coisa: as mulheres brasileiras são muito assediadas na rua, sentem-se ameaçadas e gostariam que não acontecesse. Ou, pelo menos, que abordagem fosse feita de forma delicada.
Ouvida por ÉPOCA, a secretária nacional de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, Aparecida Gonçalves, ligada à Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, considerou preocupante a intimidação que as cantadas representam, por cercear o direito da mulher de ir e vir sem sofrer constrangimento – um direito previsto na Constituição Federal. “A gente não tinha ideia da dimensão desse problema”, diz Aparecida. “Vamos discutir e debater como incluir a temática nas campanhas de prevenção à violência, inclusive nas escolas.”
Para a psicanalista gaúcha Diana Corso, o machismo está no cerne dessa discussão. A falta de modos diante das mulheres é uma maneira que os homens encontraram para explicitar a própria sexualidade diante do grupo de homens. “A cantada é o anúncio de uma intenção sexual. Assim a virilidade do homem não é questionada”, diz Diana. Mas, assim como existem homens que cobram esse tipo de comportamento viril dos amigos, há outros que são pressionados pelo grupo a agir dessa maneira. Quem pode ajudar a romper esse comportamento são as próprias mulheres.
Movimentos como o “Chega de Fiu-Fiu” colocam a questão do assédio na pauta social. Permitem que as mulheres se manifestem claramente sobre o assunto e abrem espaço aos homens para refletir e assumir o lado delas na discussão. No momento em que a sociedade percebe a gravidade das agressões verbais e físicas contra as mulheres, todos são levados a repensar seus valores. “Você leva a discussão para dentro de casa e faz com que mais pessoas se engajem na luta”, afirma Carmita Abdo, coordenadora do Projeto Sexualidade (ProSex) do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.
Nas redes sociais, alguns homens se manifestaram com perplexidade diante da condenação da cantadas. “Então a gente não vai poder falar com mulher alguma?”, questionou um deles. A pergunta é pertinente. Os brasileiros se orgulham de uma relação flexível e espontânea entre os sexos. Ela permite que homens e mulheres se aproximem em situações que outras culturas achariam inapropriadas. Será que a repressão às cantadas de rua vai impedir essa aproximação? Será que, em nome do respeito à mulher, os brasileiros terão de agir como americanos e ingleses, que se aproximam delas apenas pela internet?
Karim Hueck, a autora do texto publicado por ÉPOCA, acha que não. “Nem toda cantada ofende”, ela afirma. “Homens e mulheres não vão parar de flertar. Em determinadas situações, as pessoas estão abertas para se conhecer, como em uma balada ou em um bar com os amigos.” A pergunta que os homens precisam se fazer é simples: chamar uma garota de “gostosa” e passar a mão nela é a maneira certa de iniciar uma aproximação? Afinal, comentar a aparência de uma estranha e forçar intimidade com ela são atitudes obviamente grosseiras. Devem ser evitadas na rua e em qualquer lugar. Fica a dica.

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