quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Inquéritos de violência contra a mulher crescem 38% em 3 anos em Uberlândia

Cindhi Belafonte Repórter

O número de inquéritos para apurar a violência contra a mulher em Uberlândia aumentou 38% em três anos. De acordo com informações da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, em 2013, foram realizados 1.255 procedimentos, entre registros em flagrantes, casos fora do estado de flagrância e medidas protetivas. O total representa uma média de 70 investigações por mês. Em 2011, a quantidade de processos abertos chegou a 909.

A delegada da mulher, Juliana Machado Acipreste, afirma que o número de ocorrências de agressão é superior à quantidade de procedimentos instaurados. “Nem todas as ocorrências viram inquéritos e há muitos casos de mulheres que passam apenas pelo atendimento psicossocial ou pela defensoria pública do CIM [Centro Integrado da Mulher], sem que haja a abertura de procedimento”, disse.

Agressão a mulheres gera 1.255 inquéritos
Delagada Juliana Machado diz que,
depois que o inquérito é instaurado,
não é possível arquivá-lo
(Foto: Marcos Ribeiro 31/10/2013)
Ainda segundo ela, uma vez instaurado o inquérito, cerca de 30% das vítimas retornam à delegacia para pedir o arquivamento. “Antes da Lei Maria da Penha, [que visa aumentar o rigor das punições de agressão contra mulheres no âmbito familiar], era possível retirar a queixa na delegacia. Hoje, depois de instaurado, o inquérito corre mesmo que a vítima não queira”, afirmou.

De acordo com a delegada, a vontade de desistir do processo é motivada por vários fatores. “Muitas vezes, as mulheres já reataram o relacionamento ou têm pelo agressor dependência emocional, econômica. Algumas também desistem por vergonha, medo de sofrerem mais violência ou até para preservar a família.”

Neste ano, duas mulheres foram assassinadas, uma pelo marido, outra pelo ex-companheiro e, no fim de semana do dia 18 de janeiro, segundo informações da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, oito ocorrências chegaram à Polícia Civil, a maioria de casos reincidentes. A delegada explica que a violência pode estar relacionada ao machismo e ao sentimento de posse. “Alguns homens acham que são donos das mulheres e que, por isso, devem controlar tudo.”

Um dos procedimentos adotados é a aplicação de medidas protetivas. “É uma etapa posterior à instauração do inquérito e não é taxativa, porque depende da necessidade das partes envolvidas”, disse. Entre elas, estão a suspensão do porte de arma, de visitas e a recondução da vítima à casa, com a retirada do agressor. “A cada caso é aplicada uma medida diferente, mas há registro de mulheres que, ainda que tenham solicitado a medida protetiva, a descumprem e reatam o relacionamento com o agressor” afirmou.

Familiares de mulher morta a pauladas querem justiça

Quase duas semanas depois do assassinato de Sidilene Alves Santos, de 34 anos, que foi morta a pauladas em casa pelo marido no dia 20 de janeiro, a família da mulher pede justiça. “Queremos que o culpado pague pelo que fez com ela”, disse Sidineide Alves Santos, irmã da vítima. Ela conta que Sidilene Santos sofria com depressão e vivia um relacionamento conturbado com o marido. “As brigas entre eles eram muito constantes, mas não passava de agressão verbal. Não imaginávamos que as coisas fossem chegar a esse ponto”, afirmou. O crime aconteceu no bairro Campo Alegre, na zona sul, e foi confessado pelo marido, segundo a Polícia Militar.

Agressão a mulheres gera 1.255 inquéritos
Adenice Santos afirma que os desentendimentos
entre a filha e o genro eram constantes
(Foto: Diogo Machado)
A mãe da vítima, Adenice Alves Santos, disse que por causa dos desentendimentos constantes e da depressão a filha já havia tentado suicídio. “Depois das brigas, ele saía de casa e ela ficava muito abalada, falava que não ia viver sem ele, porque era apaixonada e não queria se separar”, disse.

Sidineide Santos afirmou ainda que a briga mais recente aconteceu porque ela tinha resolvido se separar. “Ela disse que não queria mais continuar com ele, porque ele estava maltratando a filha dela, de 13 anos, que é de um relacionamento anterior”, disse.

Além de Sidilene Santos, Luzia Coelho da Conceição, de 27 anos, foi morta com quatro facadas pelo ex-marido, que também confessou o crime, segundo a PM, no bairro Novo Mundo, na zona leste. Ela morava há três dias com o atual companheiro em uma ocupação de sem-teto ao lado do bairro. Segundo a PM, um homem a chamou na entrada da invasão para que assinasse documentos e a atacou.

Mulher tem serviços especializados

Com o objetivo de coibir as relações conjugais e familiares marcadas por violência, foi criada em Uberlândia, em 1997, a ONG SOS Mulher e Família. A instituição, sem fins lucrativos, oferece atendimento especializado e apoio psicológico a mulheres, casais e famílias que estejam em contexto de violência doméstica. Em 2013, a ONG – que conta com 45 colaboradores, entre assistentes sociais, psicólogos, assessores jurídicos, publicitários e diretores – realizou 2.086 atendimentos.

Agressão a mulheres gera 1.255 inquéritos
Cláudia Cruz: “denunciar ou se afastar
do agressor não é simples”
(Foto: Marcos Ribeiro)
A psicóloga e presidente da instituição, Cláudia Cruz, afirma que o número de casos é crescente, mas nem sempre chega ao conhecimento das autoridades. “Romper com o ciclo de violência e denunciar, ou se afastar do agressor, não é uma coisa simples. Há questões religiosas e culturais que dificultam isso. Pode ser que o casal tenha filhos, o que pesa para uma tomada de decisão”, disse. Segundo ela, a maioria dos atendimentos é realizada na sede da ONG, com horário marcado. “Ao procurarem a ONG, elas passam por uma triagem e são encaminhadas para atendimento psicológico.”

Em 2003, a ONG SOS Mulher e Família criou, por meio da parceria com a Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Prefeitura de Uberlândia e Polícia Militar (PM), a Patrulha de Atendimento Multidisciplinar (PAM), que tem como objetivo levar atendimento profissional a mulheres vítimas de violência em suas casas.

A coordenadora de núcleo e assistente social do programa, Rosaneide Borges, explica que as visitas são feitas diariamente. “Um policial militar, uma assistente social e outro profissional de área afim compõem a equipe. Fazemos uma leitura cuidadosa dos boletins de ocorrência, triamos os casos e, em seguida, fazemos as visitas”, disse.

Núcleo oferece apoio a vítimas

Localizado no Centro Integrado da Mulher (CIM), o Núcleo de Apoio à Mulher visa oferecer atendimento psicossocial a vítimas de violência doméstica e familiar. O órgão funciona no mesmo prédio que a Delegacia Especializada e acolhe mulheres que vão prestar queixa da agressão que sofreram. “As vítimas são atendidas por uma psicóloga e uma assistente social que as orientam sobre a legislação e oferecem apoio na situação”, afirmou a psicóloga Elaine Ribeiro de Queiroz, que trabalha no órgão.

Ela e uma das assistentes sociais responsável pelo atendimento, Elena Lourenço, explicam que, na maioria dos casos, as mulheres não querem que o inquérito seja instaurado. “Muitas têm medo das consequências ou até mesmo desconhecem a legislação e os seus direitos. Outras optam por não seguirem na denúncia, por dependência emocional ou financeira dos parceiros, que são agressores”, disse.

Elas explicam ainda que a maioria das ocorrências está ligada à dependência química. “Geralmente, o agressor é alcoólatra ou usuário de drogas e fica violento sob o efeito dos entorpecentes”, disse Elena Lourenço.

Para a superintendente da mulher, Marli Anastácio de Freitas, o órgão é mais um instrumento para fortalecer a luta contra a violência. “Nosso trabalho visa dar mais segurança e bem-estar às mulheres, acolhendo-as sem distinção e com cidadania. Para este ano, queremos divulgar ainda mais as atividades do CIM, para que as vítimas saibam onde buscar ajuda”, disse.

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