sábado, 13 de dezembro de 2014

Aos 43 de Iguala, ao de Ferguson e aos 21633 do Brasil


09.12.2014
Adital

Por Luis Emmanuel Barbosa Cunha

Esses números mostram a cruel constatação de uma das faces da desigualdade social e sua seletividade. A violência policial é presente em toda a América, desde os Estados Unidos, reconhecidos por terem uma força policial eficiente, até por toda a América Latina, reconhecida por ter, em geral, uma força policial corrupta e ineficiente.

O episódio dos 43 estudantes sequestrados em Iguala, no México, supostamente entregues por policiais locais ao Cartel Guerreros Unidos, o caso de Michael Brown, morto após sofrer seis disparos de arma do fogo do policial Darren Wilson em Ferguson, Estado de Missouri, Estados Unidos, e a constatação do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de que 21633 pessoas foram mortas em ações policiais no Brasil entre 2000 e 2012 são eventos que aproximam as forças policiais, eficientes ou ineficientes, pelo elo da discriminação.

Os jovens, os pobres, os de periferia, os negros, os do sexo masculino formam o perfil dessas vítimas da violência ilegal das polícias da América. Não se trata de um sofisma, é estatístico. No México, nos Estados Unidos e no Brasil, a discriminação social e racial é dado presente para definição de abordagem de suspeitos e aplicação de violência, seja pelo uso de algemas, seja pelo uso de arma de fogo. O objetivo da formação policial em Direitos Humanos é justamente favorecer o enfrentamento à violência ao abolir os esteriótipos sociais e fazer o policial se concentrar nas causas da violência, prevenindo-a, e nos elementos do tipos penais.

Em 2007, Philip Alston, Relator Especial da ONU sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias já recomendava ao Brasil abolir os autos de resistência e instigar todas as mortes, resultados de ações policiais, e tratá-las como suposto homicídio até que se configurasse, porventura, a legítima defesa. Com efeito, o trabalho policial é risco e, considerando a falta de compromisso e apoio concreto das altas autoridades do Estado brasileiro quanto à segurança cidadã, ele se torna de alto risco. Morrem mais policiais fora de serviço do que em serviço (Anuário, 2014, p.36). Entretanto, é inadmissível que os cidadãos comuns, a parte desamparada, desprotegida e desarmada dessa cadeia de sujeitos, permaneça sofrer os constrangimentos, perigos e danos dessa violência. Efetivar essa recomendação é uma das formas de se ajudar o bom policial, que respeita os procedimentos, os colegas e o cidadão comum, e se responsabilizar o mau policial, que abusa de sua condição.

Em Pernambuco, especificamente, na vigência do Pacto Pela Vida, programa governamental criado para reduzir a violência a partir de uma série de ações integradas de prevenção e enfrentamento qualificado da violência, efetivamente, percebe-se a hipertrofia da repressão e da violência policial. De 2000 a 2006, foram 54 pessoas mortas em ações policiais. Já durante o Pacto Pela Vida, de 2007 a 2012, foram 188 pessoas mortas em ações policiais em Pernambuco (Anuário, 2013, p.124).

A formação policial e o uso de instrumentos letais estão em cheque. Qual polícia não se comporta como força social de proteção? Qual polícia trata o cidadão como inimigo e a cidade como um campo de batalha? Mata-se mais, prende-se mais e se previne menos. Precisamos aprender na prática a respeitar a dignidade das pessoas. Precisamos nos civilizar.

*Advogado e Professor universitário

Nenhum comentário:

Postar um comentário