22/06/2016 por Tiago de Toledo Rodrigues
Inquestionavelmente, os graus de insegurança, violência e impunidade, no Brasil, são elevados. Também nos parece indiscutível que os episódios de desrespeito aos direitos humanos fundamentais envolvendo adolescentes – como autores ou vítimas –, inadmissíveis em uma sociedade que se ambiciona civilizada, são frequentes.
Inquestionavelmente, os graus de insegurança, violência e impunidade, no Brasil, são elevados. Também nos parece indiscutível que os episódios de desrespeito aos direitos humanos fundamentais envolvendo adolescentes – como autores ou vítimas –, inadmissíveis em uma sociedade que se ambiciona civilizada, são frequentes.
Houve um recrudescimento da violência, sobretudo nos grandes centros urbanos onde se constata um crescimento exponencial das apreensões por atos infracionais, cada vez mais graves. Dados da Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente e do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) registram um aumento de 544,16%[1], entre os anos de 1996 e 2013, na população de adolescentes em regime de privação de liberdade – medidas que pressupõe a prática das mais graves infrações.
Ao mesmo tempo, conforme o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, no período de 1980 a 2006, o número de casos de violência policial, no Brasil, aumentou 56,25%[2].
É igualmente certo que os mecanismos de prevenção e punição da violência, de preservação da paz, e de garantia do respeito aos direitos dos menores de dezoito anos, tal como empregados até o momento, foram incapazes de propiciar condições de harmonia e segurança que afiancem uma saudável vida coletiva, e evitem a ocorrência de fatos graves como os testemunhados recentemente.
Sem dúvida o aperfeiçoamento do sistema, lastreado em diagnósticos indubitáveis, exige mudanças no conjunto normativo que atinge, imediata ou mediatamente, a proteção integral de crianças e adolescentes.
Mas infortunadamente o horizonte não exibe indicadores de alterações sistêmicas positivas e eficientes. Entretanto não é preciso aguardar o surgimento de mudanças legislativas para aperfeiçoar a execução do sistema da proteção integral e implementar sua doutrina de maneira efetiva e qualificada.
Sabidamente, muitos dos atos infracionais são fruto da cooptação feita por imputáveis, que aliciam menores, induzindo-os, instigando-os e auxiliando-os a infracionar. Não é raro que estes recrutamentos iniciem adolescentes no ambiente infracional que, posteriormente, terão extrema dificuldade de exonerar.
Neste ponto, família, sociedade e Estado têm papel fundamental a desempenhar. O aliciamento infracional encontra espaço e fertilidade onde o acompanhamento familiar, o amparo comunitário e a rede de atendimento público deixaram lacunas.
E esta importante função se inicia dentro de cada lar, com a educação familiar. Refiro-me àquela transmissão de valores e princípios, feita de uma geração para outra, que semeia, desde os primeiros dias de vida, compreensão, solidariedade, respeito, consideração, compaixão e limites, entre outros inúmeros conceitos sem os quais seria impossível – ou muito difícil, no mínimo – a vida em sociedade.
Esta educação familiar, base de todo processo educativo do ser humano, é insubstituível. Pode ser sedimentada, ampliada e fortalecida pela educação formal fornecida pelo Estado (rede pública) ou sociedade (rede privada), mas é única e imprescindível. Nenhum Estado do mundo, por mais aperfeiçoado que seja, conseguira suprir integral e plenamente a ausência de uma mãe ou um pai.
Para permitir que este fundamental papel seja exercido pela família, dispomos de uma série de ferramentas jurídicas e sociais, que envolvem a rede pública de atendimento à saúde, assistência social e emprego; orientação, apoio e acompanhamento sócio-familiar; apoio sócio-educativo; inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; abrigo em entidade; acolhimento institucional; inclusão em programa de acolhimento familiar; e colocação em família substituta.
Este conjunto de providências, se adotadas com eficiência e critério, auxiliarão na prevenção de que crianças e adolescentes entrem em conflito com a Lei. A cooptação de menores e seu aliciamento criminoso é um processo gradual e duradouro. Nenhuma pessoa aprende a dirigir, manusear armas de fogo, mensurar entorpecentes com precisão, desativar sistemas de rastreamento de veículos, entre outras malfeitorias, de um minuto para outro. Invariavelmente é necessário o incentivo, introdução e apoio de alguém já minimamente versado no assunto, instruções e treinamento, além do fornecimento de uma estrutura mínima – sobretudo nas hipóteses de direção de veículos e manuseio de armas. Em síntese, para que uma criança se torne um criminoso é preciso, dentre outros aspectos, que o aliciador invista na formação delinquencial.
O mesmo investimento pode e deve ser feito pela comunidade (sociedade), pela família e pelo Estado para propiciar uma formação saudável destas mesmas crianças.
Além disso, é importante ter em mente que jamais acabaremos, de maneira absoluta e definitiva, com os atos infracionais ou crimes. Infelizmente não há medida milagrosa que nos permita acabar, vez por todas, com todas as infrações.
Entretanto, é possível concluir: o conflito com a lei somente germina e floresce onde, dentre outros aspectos, a educação familiar falta.
___________________________________________
[1] Consoante sistematização do número de adolescentes em privação de liberdade, elaborada pela Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente em 2006 (www.planalto.gov.br/sedh/), no ano de 1996 o Brasil registrava 4.245 adolescentes internados ou em semiliberdade. De acordo com a nota técnica do IPEA no 5, de junho de 2015, no ano de 2013 existia um total de 23,1 mil adolescentes provados de liberdade (http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=25621&Itemid=9). A Secretaria nacional de Direitos Humanos, em levantamento preliminar de 2013, indica que 23.066 adolescentes estavam em regime de internação ou semiliberdade naquele ano (http://www.sdh.gov.br/assuntos/criancas-e-adolescentes/pdf/levantamento-sinase-2013) - sítios consultados em agosto de 2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário