Nem vou falar aqui do homem bonzinho. Esse tipo de atitude é ainda mais inaceitável na nossa cultura do que a da mulher boazinha. O homem, para ser valorizado como parceiro amoroso, tem que ter atitude, pegada, ambição e ser batalhador.
Nem mauzinhos nem bonzinhos demais
Claro que homens e mulheres devem ser gentis e dedicados ao cônjuge. Segundo John Gottman, famoso pesquisador e autor de vários livros sobre esse tema, para que um relacionamento traga satisfações, os parceiros devem levar para o outro cinco unidades de coisas positivas para cada unidade de coisas negativas. Os problemas começam a acontecer quando essa proporção fica muito alterada. Por exemplo, um parceiro leva oito unidades de coisas negativas para cada unidade de coisas positivas (Esse parceiro é “ruinzinho demais”: ele produz muitas coisas desagradáveis e poucas agradáveis). Outro exemplo, um parceiro produz dez unidaes de coisas positivas para cada unidade de coisas negativas (ele é “bonzinho demais”!)
Kátia, a mulher boazinha que acabou se dando mal
James, o marido, era muito bravo: alterava-se facilmente, era muito crítico e intolerante e não hesitava em esbravejar. Era um “reizinho”, déspota e mimado.
Mesmo assim, ou por isso mesmo, Kátia, a esposa, o adorava. Tentava prever tudo o que o agradava, e assim que descobria algo nesse sentido, agia de acordo: casa “nos trinques”, comidinha especial que ele gostava, cuidados para que suas roupas estivessem sempre impecáveis, programas do agrado dele, sexo do jeito que ele gostava….
Tentava prever tudo que o desagradava e se abstinha de agir de modo a incomodá-lo: nenhuma reinvindicação que pudesse contrariá-lo, gastos espartanos, evitação de visitas de parentes que ele não gostava,…
Claro que ele ficava contente com as coisas que ela fazia e deixava de ficar aborrecido com as coisas que ela deixava de fazer que pudessem desagradá-lo.
Os efeitos imediatos eram bons: para ele, ela era uma fonte contínua de satisfações e ausência de aborrecimentos.
O preço em médio e longo prazo do modo de agir Kátia foi muito alto. Ela foi perdendo a vitalidade. Foi deixando de saber o que queria e o que não queria. Esse tipo de percepção não era exercitado. Pelo contrário, era inibido. Tomar conhecimento dos seus próprios desejos e incômodos só atrapalhava os seus planos para atender as vontades do marido. Assim, foi a aprendendo a ignorar, logo no nascedouro, o que queria ou deixava de querer.
Ela foi deixando de ser uma fonte de novidades e desafios para o marido. Como era sempre cordata e não manifestava o que pensava e queria, relacionar-se com ela foi ficando cada vez mais monótono e desinteressante.
Tempos depois, ele arranjou outra mulher “mais viva, desafiadora e interessante”, e a dispensou.
Monotonia: uma das principais causas das separações
Nos primeiros anos do casamento pode acontecer uma nítida diminuição da satisfação dos cônjuges e um decréscimo de vários tipos de comportamentos que são desejáveis neste tipo de relacionamento (diminuição do sexo, das manifestações românticas, do desejo de passar tempo na companhia do cônjuge, etc.). Um dos motivos apontados para essa deterioração da qualidade do relacionamento é a diminuição de novidades provenientes dos comportamentos do parceiro.
Trocar de parceiros não é a solução indicada para combater esse tipo de diminuição das novidades. Quando há troca, o processo se repete rapidamente. A melhor solução é aprender como continuar a ser fonte de novidades.
Somos naturalmente variáveis
Não precisamos buscar a variabilidade e nem maneiras de introduzi-la artificialmente no relacionamento. Muita gente pensa que para haver novidades no relacionamento é necessário fazer novos programas, viajar, ir a motéis, introduzir novas práticas sexuais, etc. Tudo isso pode ajudar, mas essas práticas só são possíveis esporadicamente e têm outro tipo de conteúdo: são tentativas de suprir a monotonia do relacionamento pelas novidades de programas externos. A novidade mais nutritiva e vitalizadora é aquela que acontece momento a momento e tem origem no próprio relacionamento. Esse tipo de variabilidade não precisa ser procurado, ele é inerente ao ser humano. O que precisamos é da coragem de expressar parte da variabilidade que já existe em nós.
Variamos bastante de um dia para outro e até de um momento para outro. Nossas emoções mudam, nosso humor muda, nossas preocupações mudam, nosso apetite muda, nosso desejo sexual muda…
A assertividade para agir assim envolve alguns riscos imediatos e ganhos certos em médio prazo. A passividade da omissão produz a segurança imediata e a morte certa da novidade e vitalidade em médio e longo prazo.
Tendemos a repetir o que deu certo. Tendemos a tratar a nossa parceira da forma que anteriormente deu certo e a evitar aquilo que trouxe problemas imediatos.
Tememos mostrar nossos novos desejos e sentimentos e sermos rejeitados ou punidos. Quando nos rendemos a esses temores, produzimos a mesmice, a falta de novidade.
A nossa atenção diminui para aquilo que já é conhecido. Por exemplo, a nossa atenção e nosso prazer geralmente diminuem quando jogamos um jogo que já dominamos completamente, lemos novamente o mesmo livro, assistimos outra vez o mesmo filme, ouvimos novamente a mesma piada…
Sintomas da passividade excessiva
As pessoas que estão excessivamente passivas apresentam os seguintes sintomas:
- Sensação de perda do controle de áreas importantes da própria vida. Essas pessoas dizem frases do tipo: “Não posso fazer nada. A situação é mais forte do que eu.” “Estou sendo levada pela correnteza”. “Estou sem forças para agir”.
- Diminuição do entusiasmo. Nada entusiasma muito. Essas pessoas não sentem a mesma energia que sentiam em outras épocas, quando eram menos passivas.
- Diminuição da atratividade: as pessoas passivas são menos atraentes e interessantes do que as pessoas ativas. Elas têm menos vitalidade, reagem fracamente ao que dizem para elas, são companheiras menos entusiasmadas, etc.
- Perda da consciência sobre os próprios sentimentos, desejos e incômodos. Estas pessoas têm baixo grau de consciência sobre o quão passivas estão sendo ou ficaram. Deixaram de perceber como poderiam agir naquelas situações em que estão sendo passivas.
- Baixa na autoestima. Passividade é sinônimo de anulação:
“Não consigo expressar e fazer valer aquilo que sinto e penso”.
“Sou ignorado. O parceiro não me dá importância. Não me leva em conta e eu permito que seja assim”.
“Devo ser uma porcaria”
- Perda do ânimo para começar a mudar. Quem é passivo há muito tempo pode desanimar-se diante da enorme tarefa de mudar seu estilo e maneiras de agir. Esse tipo de percepção desanima ainda mais.
O terapeuta a ajudará a perceber os perigos dessa forma de agir. Perigos para a sua saúde psicológica e para a qualidade e manutenção do seu relacionamento.
A nossa cultura desvaloriza quem é passivo demais
Aquelas pessoas que são exageradamente passivas são estigmatizadas e rotuladaspelas outras pessoas. Alguns dos rótulos que são colocados nas pessoas passivas demais são os seguintes:
“Apagado”
“Em-cima-do-muro”
“Maria-vai-com-as-outras”
“Pau mandado”
“Café com leite”
“Inexpressivo”
“Bundão”
“Lacaio”
“Cachorrinho” (“basta assoviar…”)
“Zero-a-esquerda”
Você é boazinha demais e, por isso, está se tornado chata e perdendo a atenção do companheiro? Procure a ajuda de um psicólogo!
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