domingo, 16 de outubro de 2016

Especialistas apontam necessidade de melhorar governança corporativa no Brasil


Na segunda conferência do ciclo “Repensar o Brasil”, promovido pela FEA, conferencistas falaram sobre os desafios da governança no mundo atual

Edgar Cornacchione_ Nelson Carvalho_ Adalberto Fischmann_ Sandra Guerra_ Jerônimo Antunes
“É importante formar profissionais preparados para os desafios da governança”, diz Nelson Carvalho
Dando seguimento às comemorações aos 70 anos da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, ocorreu na manhã de quinta-feira, 13 de outubro, a segunda conferência do ciclo Repensar o Brasil. Desta vez, o tema discutido foi “Integridade corporativa no Brasil”. Os professores da FEA Nelson Carvalho e Jerônimo Antunes e a presidente do conselho de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) sentaram-se à mesa do Salão de Conferências da faculdade para tratar, principalmente, dos desafios da área da governança no País e no mundo moderno.


O professor Carvalho iniciou com uma breve definição do conceito de integridade corporativa, caracterizando-o como um sistema que permite que uma empresa seja bem-sucedida. Mas, sendo professor e falando dentro de uma universidade, Carvalho chamou a atenção para outra face da discussão: “Nenhum dos muitos desafios do Brasil poderá ser transposto sem educação. Portanto, devemos aqui estar preocupados em formar economistas, administradores, atuários e contadores capazes de enfrentar esses desafios”.

Sandra Guerra voltou então à explicação sobre a governança corporativa. “Trata-se de um conceito para dirigir, monitorar e incentivar organizações (não apenas empresas), guiando seu corpo de agentes – donos, acionistas, associados, administradores, auditores”, explicou. Segundo ela, o objetivo é uma melhor administração e a otimização dos valores gerados pela organização, tanto econômicos como sociais (no sentido do efeito que a organização gera e o que ela oferece à sociedade).


Ela relaciona a crise de integridade vivida pelo Brasil a falhas de governança corporativa, assim como diversas outras grandes crises que ocorreram recentemente no mundo. Com isso, ressalta que devemos lembrar também que, apesar de o pensamento sempre se voltar primeiro à política, empresas privadas estão envolvidas nessas crises e escândalos. “A governança corporativa é um elemento de proteção, um sistema que propicia criação de valor e sua proteção, através de princípios como transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa”, afirma.

Apesar do que Sandra chama de um “tsunami que varre o Brasil”, ela enxerga grandes avanços no País em relação ao assunto. Ela lembra que vinte anos atrás nem havia um termo em português para a governança corporativa, e o conceito nem se encaixava aqui, pois as empresas brasileiras operavam com capital centralizado, não disperso na bolsa de valores, como já ocorria no Hemisfério Norte. Hoje, segundo ela, embora o mercado de capitais ainda seja muito pequeno no Brasil, há um interesse em melhorar a governança nas empresas, porém ainda há um longo caminho a percorrer. “Quando a água do ‘tsunami’ baixar, teremos que rever a governança das estatais e das empresas de economia mista, mas vejo um cenário positivo e promissor para quando esse momento chegar”, analisa.


Sandra Guerra_ Foto Marcos Santos 683
“Há avanços na governança no Brasil, mas ainda há muito o que fazer”, afirma Sandra Guerra

O professor Carvalho colocou em pauta alguns desafios que o avanço digital impõe aos agentes da governança. Entre eles, estão os bitcoins, uma espécie de moeda digital que foge ao controle dos bancos centrais e, assim, pode ser utilizada com má fé; também as fintechs, abreviação para financial technology (tecnologia financeira), que operam basicamente como bancos, porém sem agências físicas, o que também gera problemas para a governança; e a high frequency trading(comércio de alta frequência), através da qual se vendem e compram ações em nanossegundos. Sem falar em questões que tocam as relações humanas de trabalho, como a crescente adesão ao sistema de home office, em que se trabalha de casa e que requer mudanças na disciplina da conduta pessoal.


Para Sandra, o grande desafio nesses casos é redefinir estratégias. “As mudanças trazidas pela tecnologia são, além de muito aceleradas, avassaladoras, alteram completamente o jeito de se pensar negócios e, consequentemente, fatores como relações trabalhistas e outros que são levados em conta na governança corporativa”, avalia. Ela cita empresas como a Uber ou a Air B&B, a primeira um novo gigante dos transportes, que, porém, não possui um veículo sequer, e a segunda, uma crescente alternativa no ramo de hospedagem, que também não possui hotéis.

Sandra se diz preocupada com a velocidade e o dinamismo do mundo digital do ponto de vista do processo de tomada de decisão. “A todo momento, uma coisa nova pode acontecer e mudar completamente a realidade de uma empresa, enquanto o administrador está numa reunião, por exemplo. Com isso, as decisões têm que ser tomadas muito rapidamente, não há um tempo de maturação”, explica. Nesse ponto, ela destaca a importância do comportamento humano e do debate de ideias como fatores que influenciam diretamente a integridade corporativa. “O sistema de governança é mutável, é contextual”, conclui.

A próxima conferência do ciclo Repensar o Brasil terá o tema “Previdência Social: um modelo equilibrado e duradouro?”, e terá as presenças dos professores Hélio Zylberstajn e Luis Eduardo Afonso e de Eduardo Zylberstajn. Ela ocorrerá no dia 24 de outubro, às 11h15, no Salão de Conferências da FEA (Avenida Prof. Luciano Gualberto, 908, Cidade Universitária, São Paulo – SP).


Ouça entrevista do repórter Diego Smirne com o professor Nelson Carvalho para a Rádio USP.

USP

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