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quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Sentidos da vida: conferencistas do Fronteiras falam sobre o propósito da existência humana

Fronteiras do Pensamento
14.11.2019

Nobel da Paz, Denis Mukwege no Fronteiras 2019
Nobel da Paz, Denis Mukwege no Fronteiras 2019
Ao longo de 2019, o Fronteiras do Pensamento reuniu grandes pensadores dos mais diversos locais do mundo para debater os Sentidos da Vida a partir de diferentes abordagens - da astronomia, passando pelo cinema até a psicanálise.
Em Porto Alegre e São Paulo, o projeto acolheu as ideias de Graça Machel, Paul Auster, Roger Scruton, Denis Mukwege, Janna Levin, Werner Herzog, Contardo Calligaris e Luc Ferry.
E quais são as conclusões? O filósofo francês Luc Ferry encerrou a temporada afirmando que o grande propósito da vida contemporânea é o amor - pela família, pelos jovens, por pessoas que desconhecemos, mas cujo sofrimento nos impacta.
Fronteiras do Pensamento 2019 | Os Sentidos da Vida



GRAÇA MACHEL | Cabe à nossa geração, em especial aos mais novos do que eu, redefinir a nova causa comum: dignificar a vida humana. Precisamos reconhecer a dignidade de todo e qualquer ser humano. Esse é o principal sentido da vida e está ao alcance de todos nós.
Naturalmente, sempre há coisas que ficam por fazer, ou que fazemos e sentimos que são imperfeitas. Mas, eu penso que, em cada dia, o melhor é o quanto cada um de nós pode sentir que fez o melhor que podia fazer naquele momento. Pode identificar outras formas de fazer melhor no futuro, mas naquele exato momento, este é o melhor que podia fazer.
Eu creio que é essa beleza interior que estou a falar, e insisto nisso porque eu penso que está ao alcance de todos nós. Não precisa esperar por ninguém para ter a oportunidade de fazer o melhor que pode.
Eu creio que a melhoria da nossa condição humana depende do esforço individual e do esforço coletivo, porque depois definimos as pessoas com quem nos identificamos mais nestes valores, ampliamos o espaço e sentimos que somos centenas, somos milhões que lutam pela melhoria da condição e dignidade humana.



PAUL AUSTER (videoconferência) Todo mundo precisa das histórias e eu acredito que a maneira mais interessante de se observar isso é tentar imaginar um mundo sem histórias. Você não consegue, porque cada cultura, desde o início da sociedade mais primitiva da humanidade, contou histórias sobre o nascimento do mundo, sobre o nascimento do seu povo, histórias explanatórias, tentando fazer sentido no mundo.
Isso acontece porque o mundo é um lugar muito misterioso, confuso e assustador. Nós escrevemos histórias para nos guiar, para uma compreensão mais profunda do que está à nossa volta.
As histórias trazem coerência quando lá fora tudo é caos. Essa claridade da contação de histórias nos ajuda a compreender o caos. A beleza da vida humana, do esforço humano, é continuar fazendo perguntas. Os artistas tentam fazer através de sua arte. Mas nossas respostas sempre nos levam a novas perguntas.



ROGER SCRUTON | A realidade humana não é o eu, mas a pessoa, esse ser tridimensional em nosso ambiente compartilhado, que me aborda com palavras e olhares, e que também é objeto de amor, afeição e ressentimento. A redenção não vem do ego; vem do Outro. Isso acontece porque reconhecemos, em nosso ser, que não estamos sozinhos. Nossa salvação é o amor que o outro nos traz.
Há pessoas que escreveram sobre os valores estéticos, sobre a arte, música, arquitetura. Todos reconhecem que a vida humana sem Beleza tem toda uma dimensão social removida.
Sempre procurei consolo na arte, na literatura e na música. Isso começou muito cedo na minha vida, quando eu tinha 15 ou 16 anos. Devo confessar que as relações pessoais vieram em segundo lugar. Em decorrência disso, nunca foram tão bem-sucedidas quanto deveriam.
Mas, por outro lado, arte, literatura e música só fazem sentido no contexto humano. Assim, em última instância, elas nos levam à relação com os outros, que são necessárias, mas eu levei muito tempo para encontrar o tipo de paz que todos nós buscamos.
A Filosofia foi uma espécie de subproduto do meu amor pela arte. Eu reconheço isso especialmente na música, que é uma fonte de grande reflexão e grande emoção.



DENIS MUKWEGE O que nos faz levantar todas as manhãs é ter um objetivo, ter um sentido que a gente deu à vida. A cada vez que a gente levanta de manhã, há alguma coisa a fazer, algum objetivo para atingir, algo a transformar.
Eu digo no meu entorno que a gente pode dar sentidos diferentes à vida, causas diferentes, mas eu sempre tenho esse sentimento, que se eu tivesse que viver só por mim, para mim, eu faria muito pouco, porque eu não tenho necessidade de tudo que eu fiz se fosse somente para mim.
Então, uma vida só tem sentido, só tem uma motivação para ser vivida quando a gente vive pelos outros, ou para os outros, quando a gente vive por uma causa. Isso te permite, a cada vez, empurrar os limites para mais longe. Se fosse só para nós mesmos, acho que nós faríamos muito pouco. Eu digo aos jovens: você não pode fazer coisas na vida se não tiver um sentido que te empurre a poder seguir sempre ir adiante.
Quando a gente projeta a vida para os outros, é um limite difícil de atingir, mas que te empurra todos os dias para te dizer: o que eu posso fazer a mais? Cada vez que você chegar no seu trabalho, faça a pergunta: o que eu vou fazer hoje de bem para uma pessoa? Uma pessoa apenas. O que eu posso fazer de bom para uma pessoa? Isso transforma completamente a sua vida. Às vezes, é apenas um sorriso. Eu penso que a vida só pode ser vivida quando a gente vive pelos outros.



JANNA LEVIN | Pense no quão extraordinário é refletir onde estamos localizados no esquema do universo. É difícil pensar que não há vida lá fora. Provavelmente, há mais planetas do que estrelas. Pense na nossa pequeneza e, ao mesmo tempo, na vastidão do nosso conhecimento.
Realmente é uma observação importante. Refletirmos em combinação, considerando quão pequenos somos, mas considerando também a vastidão do nosso conhecimento. Eu acho que é um contraste bonito. Porque nos lembra que há significado em aceitarmos a nossa insignificância.




WERNER HERZOG | Sobre a mistura da fantasia com realidade, é como nos sonhos. Nós sonhamos à noite. Eu sou um desses que não lembra dos sonhos. Talvez, por isso que eu tenha me tornado cineasta, porque não sonhar à noite é um defeito. Mas, nós podemos sonhar, fantasiar e alterar realidades. Podemos atribuir afeição às coisas.
Um exemplo: sou uma criança que brinca com um ursinho e o amo. Tenho um sentimento autêntico pelo meu ursinho. Ele não é um ser animado, mas ainda assim é um sentimento verdadeiro.
De alguma forma, esse é o assunto do filme que eu fiz no Japão, Family Romance, LCC. Se você é uma pessoa solitária, nesse filme você pode alugar um amigo que vai conversar com você, vai ao bar com você. Ou no dia do seu casamento, que o seu pai alcoólatra não pode ir, a sua família aluga um pai.
Nesse filme tudo é fabricado, tudo é construído, e ainda assim as emoções são autênticas. Isso é o mais estranho de tudo: descobrir que os nossos sentimentos humanos são sempre autênticos.  



CONTARDO CALLIGARIS Somos, infelizmente, uma sociedade muito pouco hedonista. E sabe por quê? Porque o hedonismo, como a própria apreciação estética, pede uma extrema atenção ao mundo. E somos distraídos demais para sermos hedonistas. Ninguém é hedonista com um celular na mão. Pode ter um hedonismo do celular. Mas a distração é tamanha que é muito difícil a apreciação.
Quando entendo que as nossas vidas devem ou podem ser julgadas pela sua qualidade estética, será que estou tendo uma vida feia ou bonita? E o que isso quer dizer? O que é uma vida boa por ser bonita? O que isso significa? Claro que não depende da cor da camisa que escolhi hoje à noite. Nem do corte do meu terno. Depende de algum tipo de elegância entre aspas do nosso comportamento. O que faz com que nós sejamos feios ou não.
Pensar no juízo estético como uma espécie de critério moral é geralmente considerado como uma atitude estupidamente hedonista. O cara gosta de sensações agradáveis. Na verdade, não. É um empreendimento, pois o hedonismo neste caso é um empreendimento cultural duríssimo, sem fim. Porque não tem como ter um aproveitamento estético do mundo sem cultura.



LUC FERRY | O amor dá sentido às nossas vidas e isso é uma evidência para mim, mas eu não sou ingênuo, eu percebo que os homens são capazes disso. A história do século XX é basicamente a história do ódio, então nós somos capazes disso.
Freud tem uma metáfora emprestada de Schopenhauer que gosto muito. Ela diz o seguinte: nós somos como um pequeno porco-espinho. Quando eles têm frio, se aproximam uns dos outros, mas, às vezes, se machucam com seus próprios espinhos. Ao se aproximar, você nunca sabe qual é a distância adequada ou segura.
Essa é a explicação das relações humanas e o problema da democracia. Esse é o pequeno porco-espinho, mas a boa distância não é fácil de encontrar, porque estamos constantemente muito no amor ou muito no ódio.
Na questão das grandes respostas para a vida boa, eu penso que existem 5 respostas: a primeira grande resposta é a dos gregos: a harmonia entre você e o mundo. A segunda resposta é a das religiões: a harmonia de si com o divino, com Deus. Não com o cosmos. Deus nos promete a imortalidade em troca. A terceira resposta é se colocar em harmonia com a humanidade. A liberdade tem que terminar quando começa a dos outros. A quarta resposta é a colocação da harmonia de si consigo mesmo, de Freud e depois da psicologia positiva: amar a si mesmo, se reconciliar consigo mesmo.
As 4 respostas são como uma escada. O cosmos é muito exterior ao humano, Deus já é mais humano, a humanidade é muito humano e você mesmo é muito, muito humano. A quinta resposta é a minha: a harmonia de si com aquele que amamos ou que poderíamos amar. Nós podemos encontrar pessoas em qualquer lugar do mundo que nós poderíamos vir a amar.      

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