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quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

A relevância da palavra da vítima nos processos de violência doméstica

Publicado por Tatiana Naumann
30/12/2019

“Você está exagerando”. “Pare de surtar”. “Não aceita nem uma brincadeira?”. “Você está louca”; “Você não sabe o que fala”. “”Você está mentindo”.
Encaradas como emocionalmente frágeis, irracionais, luxuriosas, instáveis, perversas, ignorantes e mentirosas ao longo da História, e muitas vezes privadas de direitos fundamentais, as mulheres tiveram que brigar muito para ter voz, poder, e algum espaço.

A desvalorização da mulher é uma realidade comum a inúmeras civilizações de todos os tempos e lugares. A origem da sua retórica situa-se no berço da civilização ocidental. A história da misoginia e do insulto da mulher é também a história da herança cultural e, em última instância, da palavra escrita. Domínio secularmente exclusivo do homem, a palavra foi sendo também um inimigo, por ação e até supressão, da mulher, votada ao silêncio tanto por imposição, como por falta de cultura.
Não é raro ver que permanece na sociedade um tipo de machismo oculto, que a cada oportunidade, coloca a palavra feminina sob suspeição. Quando isso acontece em situações de denúncia de violência e outros abusos, as consequências podem ser fatais. Como fica, então, a situação dessa palavra nos casos em que ela está no centro de denúncias de violência de gênero?
Quase como uma reparação histórica pela supracitada herança cultural, predomina o entendimento no Superior Tribunal de Justiça de que, em crimes praticados no âmbito doméstico, a palavra da vítima possui especial relevância, uma vez que, em sua maioria, tais crimes são praticados de modo clandestino, não podendo a palavra da vítima ser desconsiderada, notadamente quando corroborada por outros elementos probatórios . Nesse sentido:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. CRIMES PRATICADOS COM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA. CONDENAÇÃO MANTIDA.
AGRAVO DESPROVIDO.
1. Para alterar o entendimento da Corte Estadual e atender ao pleito de absolvição por insuficiência de provas seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos. A palavra da vítima tem especial relevância para fundamentar a condenação,
mormente porque se trata de violência doméstica ou familiar, não havendo que se falar em insuficiência probatória. Precedentes.
2. Agravo regimental desprovido.
AgRg no AREsp 1352082 / DF
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2018/0218490-0, Ministro JOEL ILAN PACIORNIK (1183), T5 - QUINTA TURMA, Data da Publicação/Fonte
DJe 05/04/2019
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LESÕES CORPORAIS PRATICADAS COM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. ABSOLVIÇÃO. LEGÍTIMA DEFESA. PRETENDIDA CARACTERIZAÇÃO. REVISÃO INVIÁVEL. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Não há qualquer ilegalidade no fato de a condenação referente a delitos praticados em ambiente doméstico ou familiar estar lastreada no depoimento prestado pela ofendida, já que tais ilícitos geralmente são praticados à clandestinidade, sem a presença de testemunhas, e muitas vezes sem deixar rastros materiais, motivo pelo qual a palavra da vítima possui especial relevância. 2. Na espécie, da análise do material colhido ao longo da instrução criminal, as instâncias de origem concluíram acerca da materialidade e autoria assestadas ao agravante, de forma que julgaram inviável sua absolvição, sendo que, indemonstrada a ocorrência da excludente da legítima defesa, deve o acórdão recorrido ser mantido. 3. É inviável, por parte desta Corte Superior de Justiça, a análise acerca da aptidão das provas para a manutenção da sentença condenatória, porquanto a verificação do conteúdo dos elementos de convicção produzidos no curso do feito implicaria o aprofundado revolvimento de matéria fático-probatória, providência que é vedada na via eleita, em razão do óbice da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 1225082/MS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 3/5/2018, DJe 11/5/2018 - Grifo Nosso).
CONSTITUCIONAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. AMEAÇA E LESÃO CORPORAL. ABSOLVIÇÃO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. ESPECIAL RELEVÂ̂NCIA À PALAVRA DA VÍTIMA COMO FUNDAMENTO PARA A CONDENAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. WRIT NÃO CONHECIDO.
1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado. 2. Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo probatório produzido nos autos, entenderam, de forma fundamentada, ser o réu autor dos delitos descritos na exordial acusatória, a análise das alegações concernentes ao pleito de absolvição demandaria exame detido de provas, inviável em sede de writ. Precedente. 3. No que se refere ao crime de ameaça, a palavra da vítima possui especial relevância para fundamentar a condenação, notadamente se a conduta foi praticada em contexto de violência doméstica ou familiar. Precedente. 4. Habeas corpus não conhecido. (HC 327.231/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 10/3/2016, DJe 17/3/2016 “
Portanto, a palavra da vítima- se corroborada por outras provas - tem especial relevância, em virtude da natureza do delito de violência doméstica, que ocorre, na sua maioria, sem a presença de testemunhas.
Tatiana Moreira Naumann é advogada especializada em Direito de Família e atende principalmente mulheres.

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