Assumindo a posição de seu marido no Exército francês, Favez formou-se em medicina e tornou-se a primeira mulher a atuar profissionalmente na região
ISABELA BARREIROS PUBLICADO EM 01/02/2020

No século 19, mulheres eram proibidas de exercerem muitos papeis na sociedade. Devido a essa impedição, a maioria delas continuou seguindo esse modelo, — o que não impediu que outras o enfrentassem.
Enrique Favez era um médico vindo da Suíça. Nascido em 1791, ele dizia ter estudado Medicina na França, atuado como médico de guerra e ainda como soldado no batalhão de Napoleão Bonaparte. Veio para a América Latina em 1819 e se estabeleceu em Cuba onde, em pouco tempo, tornou-se um importante cirurgião de Baracoa, povoado que morava. No entanto, guardava um segredo: na verdade, era Enriqueta Favez.
Enrique Favez era um médico vindo da Suíça. Nascido em 1791, ele dizia ter estudado Medicina na França, atuado como médico de guerra e ainda como soldado no batalhão de Napoleão Bonaparte. Veio para a América Latina em 1819 e se estabeleceu em Cuba onde, em pouco tempo, tornou-se um importante cirurgião de Baracoa, povoado que morava. No entanto, guardava um segredo: na verdade, era Enriqueta Favez.
A verdadeira história do doutor veio à tona por ninguém mais ninguém menos que sua própria esposa. Enrique e Juana de León haviam se casado e viviam uma vida tranquila na região, apesar de alguns relatos de abuso de bebidas alcoólicas pelo marido e também envolvimento em brigas.
Assim que a denúncia foi feita, em 1824, Enrique — ou Enriqueta —, foi duramente punido por manter em sigilo sua verdadeira identidade.
A narrativa contada por ele era a seguinte: durante a guerra, havia sido capturado por tropas britânicas e mantido prisioneiro por um tempo. Ao ser liberado, decidiu ir até o novo continente para tentar conseguir uma vida melhor, visto que era médico e ainda tinha sua atuação no conflito em seu currículo.
De acordo com o historiador cubano Julio César González Pagés, autor de Por Andar Vestida de Homem, que conta a história, o contexto de Enriqueta perpassou pelo Exército de Napoleão, mas quem era o soldado era seu marido.
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"Há documentação histórica que mostra que Enriqueta esteve casada com um soldado do exército de Napoleão, que morreu. Tiveram um filho, que também morreu poucos dias depois do nascimento. A partir de então, ela começou a se vestir de homem e assumir uma identidade masculina", explicou à BBC Mundo.
Ela teria, assim, assumido a posição de seu marido durante a guerra, vestindo-se como militar e se colocando no lugar do homem na linha de combate francesa. Depois disso, apenas apropriou-se da personalidade masculina que já estava construindo.
O romancista cubano Antonio Benítez Rojo também investigou a história para escrever seu conto biográfico Mulher em Traje de Batalha. Segundo Rojo, ela realmente estudou Medicina em Paris — vestida de homem. Na época, a profissão destinava-se apenas a homens, mas Enriqueta conseguiu ultrapassar essa barreira ao transformar-se em tal.
Ele ainda alega que ela serviu como médica de guerra durante a Campanha Russa, como ficou conhecida a invasão francesa ao país em 1812.
Mas toda a farsa caiu ao chão quando Juana de León decidiu depor a real situação de seu marido. "Aparentemente, uma empregada da casa chegou um dia e Favez estava bêbado, sobre a cama, com a camisa desabotoada, e com os seios à mostra. A partir daí, começaram os rumores e parece que Juana, temendo o que poderia acontecer com ela e as pressões da própria família, decidiu fazer a denúncia”, explicou Pagés.
Ele foi levado ao tribunal e, quando ameaçado com um exame físico e determinação de andar sem roupas pelo vilarejo, admitiu que era, na verdade, uma mulher. Isso aconteceu em 6 de fevereiro de 1824.
Mesmo assim, teve seu corpo invadido e analisado por médicos. Os documentos, que hoje residem no Arquivo Nacional de Cuba, alegam que a pessoa "é dotada de todas as partes pudendas próprias do sexo feminino", concluindo que é uma "mulher real e perfeita". Foi, então, expulsa de todo o território latino-americano.
Ainda assim, a história mostra-se como um curioso rompimento com as regras da época. "Quando viaja para América, ocorre um processo muito interessante, porque se converte na primeira mulher a exercer a medicina em terra em Cuba, senão na América Latina", explica o historiador cubano.
Outro ponto importante é que a união de Enriqueta e Juana foi firmada oficialmente pela Igreja Católica, com todos os ritos do casamento religioso. Pagés relembra que “até onde se sabe, não havia casos públicos de lesbianismo na América Latina, e também são as primeiras mulheres que se casam com a benção da igreja em toda a hispanoamérica”.
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