sábado, 8 de novembro de 2014

Qual a relação entre transtornos alimentares e bactérias intestinais?

JOEL RENNO
06 Novembro 2014

Os transtornos alimentares (TA) como a anorexia nervosa, bulimia e compulsão alimentar afetam aproximadamente 5-10% da população em geral, mas os mecanismos biológicos envolvidos são desconhecidos. Pesquisadores da Inserm Unit 1073, “Nutrição, inflamação e disfunção do eixo intestino-cérebro” (Inserm/Universidade de Rouen) demonstraram a participação de uma proteína produzida por algumas bactérias intestinais que podem ser a fonte desses transtornos. Os anticorpos produzidos pelo organismo contra esta proteína também reagem com o principal hormônio da saciedade, que é semelhante em estrutura. Segundo os pesquisadores, pode em última instância corrigir este mecanismo que causa variações no consumo de alimentos.
Estes resultados são publicados na Revista Translational Psychiatry, na edição on-line de 07 de outubro de 2014.
A anorexia nervosa, bulimia e compulsão alimentar são todos transtornos alimentares (TA). Incluindo não tão bem definidas e atípicas, os TA afetam 15-20% da população, particularmente adolescentes e jovens adultos. Apesar de vários estudos psiquiátricos, genéticos e neurobiológicos, o mecanismo molecular responsável por esses transtornos permanece um mistério. A característica comum das diferentes formas de TA é a desregulação do consumo de alimentos, o qual é diminuído ou aumentado, dependendo da situação.
A equipe de Sergueï Fetissov em Inserm Joint Research Unit 1073, “Nutrição, inflamação e disfunção do eixo intestino-cérebro” (Inserm/Universidade de Rouen), liderada por Pierre Déchelotte, estuda as relações entre o intestino e o cérebro que poderiam explicar esta desregulação.
O imitador do hormônio da saciedade
Neste novo estudo, os pesquisadores identificaram uma proteína que passa a ser um imitador do hormônio da saciedade (melanotropina). Esta proteína (ClpB) é produzida por determinadas bactérias, tais como Escherichia coli, que estão naturalmente presentes na flora intestinal. Sempre que esta proteína está presente, o corpo produz anticorpos contra ela. Estes também se ligam ao hormônio da saciedade, devido à sua homologia estrutural com a ClpB, e, assim, modificam o efeito sacietogênico do hormônio. A sensação de saciedade é atingido (anorexia) ou não atingida (bulimia ou excessos). Além disso, a própria proteína bacteriana parece ter propriedades anorexígenas.
Variações na ingestão de alimentos na presença da proteína bacteriana
Para atingir estes resultados, os investigadores modificaram a composição da flora intestinal de ratos para estudar sua resposta imunológica e comportamental. A ingestão de alimentos e o nível de anticorpos contra melanotropina no primeiro grupo de ratos, que receberam a bactéria E. coli (não produzindo ClpB) mutante não sofreram alterações. Em contraste, o nível de anticorpos e ingestão de alimentos variou no segundo grupo de animais, que receberam E. coli produzindo proteína ClpB.
A provável participação desta proteína bacteriana no comportamento alimentar desordenado em humanos foi estabelecida através da análise de dados de 60 pacientes.
A escala padronizada “Inventário de Distúrbios Alimentares-2″ foi usada para diagnosticar esses pacientes e avaliar a gravidade de suas doenças, com base em um questionário sobre seu comportamento e suas emoções (desejo de perder peso, bulimia, medo de maturidade, etc.). Os níveis plasmáticos de anticorpos para ClpB e melanotropina foram mais elevados nestes pacientes. Além disso, a sua resposta imunológica determinou o desenvolvimento de desordens alimentares na direção da anorexia ou da bulimia.
Estes dados confirmam, assim, a participação da proteína bacteriana na regulação do apetite, e abrem novas perspectivas para o diagnóstico e tratamento específico dos transtornos alimentares.
Corrigindo a ação da proteína imitando o hormônio da saciedade
“Estamos atualmente trabalhando para desenvolver um exame de sangue com base na detecção da proteína bacteriana ClpB. Se isto for atingido com sucesso, será possível estabelecer tratamentos específicos e individualizados para transtornos alimentares”, diz Pierre Déchelotte e Sergueï Fetissov, autores deste estudo.
Ao mesmo tempo, os pesquisadores estão usando ratos para estudar a forma de corrigir a ação da proteína bacteriana, a fim de evitar a desregulação da ingestão de alimentos que ela gera. “De acordo as nossas observações iniciais feitas, seria de fato possível neutralizar essa proteína bacteriana utilizando anticorpos específicos, sem afetar o hormônio da saciedade”, concluem.
Referências:
Proville R. et al, Cerebellum involvement in cortical sensorimotor circuits for the control of voluntary movements. Nature Neuroscience, 2014
Fonte: Science Daily e MedCenter

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