segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Como falar com crianças sobre violência


Crianças participam de ato pela paz no Alemão
Quinta-feira, 30/07/2015, por Andrea Ramal

Quando eu dava aula na alfabetização, certa vez o desenho de uma criança me preocupou: ao lado da escola, pedestres fugiam de homens armados com fuzis. Havia pessoas feridas, balas passando sobre as cabeças e muitos borrifos de sangue. Uma criança chorava ao lado do pai morto. A cena era de um tom vermelho assustador. Na época, conversamos com a família, que relatou que o menino andava agitado. Orientamos que os pais e professores ficassem atentos e, eventualmente, procurassem o apoio de um especialista.

Os anos passaram e, lamentavelmente, desenhos desse tipo foram se tornando cada vez mais comuns nas turmas infantis. A violência – não aquele divertida, dos filmes de aventuras, mas a do pavor cotidiano de ter a vida de parentes e amigos em risco –  passou a ser retratada diariamente.
Nas redações, li textos de crianças angustiadas, que relatavam seu temor a cada vez que os pais não chegavam em casa no horário habitual. Vi crianças chorarem de apreensão, no recreio, quando os pais não atendiam o celular. Uma das mães pediu que a escola lhe permitisse enviar uma mensagem à filha cada vez que ela chegasse ao trabalho, mesmo que fosse durante a aula, caso contrário a menina não conseguiria prestar atenção na matéria.
Segundo pesquisa divulgada em julho pelo Ibope, 61% das crianças e adolescentes de São Paulo sentem medo de violência e roubo. Em certas regiões o número pode ser mais alto. Numa caminhada pela paz no Complexo do Alemão, em abril, as crianças participaram do protesto pela paz, após a morte do menino Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos, que foi baleada enquanto brincava na porta de casa. As imagens surpreendem quando se pensa na infância como o tempo da brincadeira, da leveza, do mágico despertar para o mundo.
Qual mundo? Este que inventamos está longe do que gostaríamos de oferecer aos nossos filhos. Como os ajudaremos a lidar com essas realidades? Por mais que pareça difícil, em primeiro lugar, há que evitar passar a eles os mesmos temores dos adultos. A criança precisa se sentir protegida por pais e professores.
Longe de tentar parecer super-herói, o ideal é conversar com as crianças e adolescentes, ouvir sua visão sobre os acontecimentos, perguntar como se sentem, transmitir tranquilidade. Levar em conta a idade deles, poupando os mais novos de notícias que possam assustá-los. Explicar que todos somos responsáveis pela segurança, por exemplo em casa e na escola. Mostrar que é difícil, mesmo para os adultos, entender que existam pessoas que maltratem ou firam os demais. Não incentivar o acesso a armas – mesmo de brinquedo – e defender que a violência nunca pode ser a solução dos problemas. Com os adolescentes, refletir sobre a frase “A paz é fruto da justiça”.
Há que observar o estado de ânimo dos filhos e nunca recorrer a medicamentos sem orientação médica. Por fim, manter um ambiente familiar de harmonia. Afinal, a paz também pode ser ensinada. Esse é agora o nosso desafio: ensinar às crianças de hoje como construir um mundo diferente.

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