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domingo, 8 de novembro de 2015

Os pais podem ser "escola do crime" para os filhos?

03/11/2015 por Luiz Flávio Gomes

A teoria da associação diferencial, de Shuterland, que afirma que o crime é aprendido (com os pais, com outros delinquentes, com chefes ou diretores numa empresa etc.) assim como qualquer profissão, não perdeu sua atualidade. Temos visto, ultimamente, incontáveis pais envolvidos em crimes semelhantes com os filhos. Jogadores de futebol, filhos de políticos ou de presidentes de empresas etc. (veja Ruy Castro (Folha 14/10/15: A2).

Na operação Lava Jato, recentemente, um pai disse que tem duas filhas e que se elas cometessem um crime e uma delatasse a outra, ele reprovaria duramente a segunda, porque essa é sua escala de valores!

Como se fabrica um criminoso no mundo da criminalidade dos poderosos? Isso foi estudado pela primeira vez em 1939, pelo criminólogo norte-americano Shuterland (veja comentários de Germán Aller, em El delito de cuello blanco, tradução de Laura Belloqui, Montevideo-Buenos Aires: B de f, 2009, p. XXVII e ss.), que criou a teoria da associação diferencial, com base nas doutrinas de Quételet, Guerry e, particularmente, G. Tarde (1843-1904), que dizia que o crime se aprende por imitação, consoante três regras:

“(1) em proporção direta ao grau de proximidade ou intimidade [entre os envolvidos]; (2) o superior [ou mais antigo] é imitado pelo inferior [ou mais jovem]; (3) inserção da moda nova que substitui a anterior, com algumas exceções”.

O criminoso (no mundo da criminalidade corrupta dos poderosos, ao menos, que foi a pioneiramente estudada por Shuterland, na década de 30 do século 20) aprende a delinquir similarmente ao processo de aprendizagem do novato numa profissão.

As premissas e etapas de aprendizagem da carreira criminal (consoante a teoria da associação diferencial do criminólogo citado) são as seguintes:
a) “o comportamento criminoso se aprende” [poderíamos chamar essa etapa de convivência];
b) “o comportamento criminoso se aprende em interação com outras pessoas mediante um processo de comunicação” [vislumbramos nessa etapa a conivência];
c) “a principal parte da aprendizagem do comportamento criminoso ocorre mediante contatos pessoais com grupos íntimos” [nessa etapa reside o desenvolvimento da apetência];
d) “quando se aprende o comportamento criminoso, a aprendizagem abarca: (a) técnicas para cometer o delito, que são em algumas vezes complexas e outras muito simples [desenvolvimento da apetência] e (b) a específica orientação dos motivos, tendências, meios e atitudes” [nasce aqui a concupiscência];
e) “a específica orientação de motivos e tendências é aprendida desde as definições dos códigos legais como favorável ou desfavorável” [relação custo-benefício, anomia, risco de afetação da reputação e possibilidade de locupletação – poderíamos chamar essa etapa de inferência ou conveniência];
f) “uma pessoa se converte em delinquente porque um excesso de definições favoráveis à violação da lei prevalece sobre as desfavoráveis” [chance de impunidade, total do enriquecimento possível, risco de prisão e de restituição do locupletado etc. – é a fase da canalha-existência e, eventualmente, da incontinência: busca de ganhos megalomaníacos];
g) “a associação diferencial pode variar na frequência, duração, prioridade e intensidade” [tudo depende do nível de concupiscência];
h) “o processo de aprendizagem do comportamento criminoso mediante a associação com modelos criminais e anticriminais, inclui todos os mesmos mecanismos que qualquer outro tipo de aprendizagem” [convivência, conivência e apetência];
i) “enquanto que o comportamento criminoso é uma expressão de necessidades e valores gerais [comportamento justificado e leniente], não se explica por essas necessidades e valores gerais , posto que o comportamento não criminoso é uma expressão das mesmas necessidades e dos mesmos valores” [anomia, relativização absoluta dos valores, ausência de hierarquia entre eles, falta de ética e moral etc.].

Em suma, o processo de aprendizagem da associação diferencial de Shuterland percorre as etapas da convivência, conivência, apetência, concupiscência, inferência ou conveniência, canalha-existência, leniência, anomia, falta de ética, incontinência e, em casos mais agudos de sociopatia, crise de abstinência. A atualidade das pesquisas e das conclusões de Shuterland continua impressionando e se comprovando a cada dia, particularmente nos países (verdadeiras cleptocracias) onde a corrupção se tornou sistêmica.

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