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sábado, 19 de outubro de 2013

Me ouve aqui rapidinho, por favor

por Nádia Lapa  
Feminismo.
Só dizer ou ouvir essa palavra já provoca arrepios em muita gente. Se você diz que é feminista, então, um mar de estereótipos inunda qualquer outro argumento que você use. O que fica é uma dúvida gigantesca: por quais meios você aprendeu - o que seja - sobre feminismo?
Como não existe uma "escola de feminismo", um diploma, um curso no Senac¹, o feminismo, assim como outros movimentos sociais, não é considerado uma área de conhecimento. Assim, pessoas aleatórias repetem discursos que em nada fogem ao senso comum sobre o assunto. E geralmente elas estão erradas. Como todos somos afetados pelo sexismo, esta influência nas nossas vidas nos dá a errônea impressão que já conhecemos tudo o que tínhamos de saber sobre o feminismo.
Ajuda o fato de que o movimento tem grandes pensadoras, mas não líderes. Não existe livro de regras; as correntes ideológicas estão aí, se misturando e se complementando; o assunto prolifera nas redes sociais, onde é fácil criar antipatia por uma pessoa - e transferir esse desconforto à causa que a tal pessoa antipática defende.
Junte a esse caldeirão a ideia romântica de que todos somos iguais, que o mundo é lindo, que qualquer pessoa com esforço conquista o que quiser. "Silvio Santos era camelô e veja aí onde ele está", "Obama, negro, é presidente", "Dilma, mulher, é presidenta", como se as oportunidades fossem iguais para todos, classes sociais não existissem, racismo fosse coisa do passado.
O pior, mesmo, é ter noções de feminismo completamente datadas e que chegaram até você por terceiros, nunca diretamente por uma feminista. Aqui no Brasil, por exemplo, não temos nenhuma revista feminista. Livros de teoria básica estão esgotados há anos, como o excelente e imprescindível O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir. Outros, tão importantes quanto, jamais foram traduzidos para o português.
Ficamos, então, reféns da grande mídia, que só agora está dando espaço a pautas e autoras feministas, como é o caso deste blog. E a imprensa fez questão, nas décadas de 1960 e 1970, quando acontecia a segunda onda do feminismo, de estereotipar todas as militantes. Feias, peludas, lésbicas, raivosas. Uma mulher "normal" não ia querer ser confundida com "essas aí". Colocaram as feministas numa espécie de purgatório, como se pertencessem a outra espécie de gente, mesmo que elas estivessem conseguindo coisas extraordinárias para outras mulheres, como os direitos reprodutivos.
A grande virada disso tudo é que algumas muitas de nós somos mesmo feias, peludas, lésbicas e raivosas. O problema é o que você faz com essa informação. Você vai menosprezar um movimento de emancipação e empoderamento feminino porque há militantes feias? Por que temos pelos? Isso não é meio pueril da sua parte? Pior ainda: se é porque somos lésbicas, isso se enquadra num preconceito ainda pior, a lesbofobia.
O feminismo é capaz de mudar a vida de todos nós. Já mudou demais a minha, para melhor, muito melhor. Mas é preciso que as pedras sejam baixadas e os braços, descruzados. Não estamos vitimizando mulheres; pelo contrário, queremos empoderá-las e transformá-las em sobreviventes. Lutamos pela diminuição dos casos de estupro, da violência de gênero, da mutilação genital. Queremos distribuir emprego e renda para mulheres que têm filhos para criar. Trabalhamos para que a representação da mulher na mídia seja real, e não modificada a ponto de transformar nossas jovens em pacientes de transtornos alimentares. Como se colocar contra todas essas pautas?
bell hooks, autora feminista negra norteamericana, costuma dizer que o feminismo é para todos. E nos faz um convite, que eu já aceitei, e espero que você também aceite: chegue mais perto do feminismo. Vem pra cá com a gente.
*o título desse post é, na verdade, uma ironia. mulheres temos que ser dóceis, pedirmos "por favor", dizermos "obrigada", começarmos qualquer frase que conteste o interlocutor com um "desculpe, mas". uma mulher incisiva é logo chamada de mandona ou problemática (falta-lhe amor, falta-lhe sexo, falta-lhe qualquer coisa que só um homem pode lhe proporcionar. como diria Sheryl Sandberg, chefe de operações do Facebook e autora de Faça Acontecer, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, "desde muito cedo, os meninos são incentivados a se encarregar de alguma coisa e a dar suas opiniões. (...) O perigo não se resume a esse silêncio que as figuras de autoridade impõem à voz das mulheres. As jovens interiorizam dicas sociais sobre o comportamento "adequado" e, por sua vez, elas mesmas silenciam". Mas isso é papo para outro post. Apenas pense em quantas vezes você tentou silenciar uma mulher.
¹ Mas existem, sim, pós graduações a respeito do tema. E, no exterior, grande parte das universidades oferece women's studies na grade curricular.

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