domingo, 6 de julho de 2014

A atuação do poder público brasileiro frente aos agressores de violência doméstica contra a mulher, por Sheila Cristina Pereira

Trabalho apresentado ao curso de Serviço Social da Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada Santista, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Profª Drª Luzia Fátima Baierl.
Resumo
Esta pesquisa apresenta um levantamento sobre os serviços existentes no Brasil para atender aos agressores de violência doméstica contra a mulher. Após a promulgação da Lei Maria da Penha, a temática ganhou visibilidade na sociedade como um todo, mas o agressor ainda é pouco lembrado neste processo de enfrentamento.
A fim de entender melhor a invisibilidade do agressor aos olhos do poder público, essa monografia constrói uma reflexão sobre os serviços e mecanismos existentes para atender ao agressor, tentando desvendar onde estão esses serviços, qual a finalidade deles, quais os rebatimentos que as ações propostas causam nas relações intrafamiliares e, consequentemente, na sociedade, e o que pensam os profissionais que atuam no cerne do problema.
O caminho teórico metodológico consiste em análise documental e entrevistas realizadas com profissionais de diversas esferas cujo trabalho esteja relacionado ao atendimento dos agressores, numa tentativa de abarcar o debate sobre a mais ampla perspectiva.
Palavras-chave: violência doméstica contra a mulher; agressores; Lei Maria da Penha.
Introdução
A violência doméstica contra a mulher é o fenômeno social mais democrático e globalizado que existe – não faz distinção de raça, cor, etnia, classe social, religião, idade, etc.; embora apresente especificidades em suas formas de manifestações dentro de cada marcador social da diferença. Está presente todos os dias, em todos os cantos do mundo. É quase invisível porque acontece entre quatro paredes, na privacidade das relações, no entanto seus danos são sentidos pela sociedade como um todo. Vem de onde menos se espera e é difícil superá-la, pois é cometida por pessoas que compõe laços afetivos e de confiança.
Há três anos tive meu primeiro contato com a temática, violência doméstica contra a mulher, quando realizei projeto de Iniciação científica. Desde então venho realizando estudos sobre a questão. Em 2012 finalizei uma pesquisa de iniciação científica intitulada A atuação do CREAS no trâmite da violência doméstica em Santos : Mulheres em foco e em sua conclusão percebi que haviam lacunas a serem preenchidas ao falar do como lidar com essa violência, tais como : onde se localiza o agressor no processo de combate à violência; com que viés são construídas ações para o agressor e como se dá a reinserção do agressor no núcleo familiar (se o há) após as ocorrências de violência tratadas pela polícia.
Defendo a ideia de que o agressor é ponto fundamental na erradicação da violência doméstica contra a mulher, até mais do que as próprias mulheres, visto que o ciclo da violência é perpetrado, via de regra, por ele e não por ela, embora a violência doméstica seja relacional. A mulher, ao sair da relação violenta, encerra o ciclo da violência para ela, na vida dela; mas o agressor não encerra este ciclo, porque na vida dele a produção de sentidos sobre a violência não foi alterada, então ele vai entrar em outra relação, com outra mulher, e o ciclo da violência vai continuar fazendo outras vítimas.
Tem sido cada vez mais popular o debate sobre o enfrentamento da violência doméstica contra a mulher. Com a criação da Lei Maria da Penha em 2006, a causa ganhou notoriedade e passou a compor a agenda do poder público com a divulgação de campanhas e serviços de atendimento e proteção às mulheres agredidas, e da sociedade civil, com inúmeros movimentos sociais e organizações não governamentais que promovem ações feministas, fazendo assim com que os profissionais se especializem cada vez mais para lidar com a situação, e impulsionando a busca das mulheres pela efetivação de seus direitos. No entanto, observa-se que quase oito anos depois, a Lei Maria da Penha ainda não foi efetivada por completo, principalmente no que tange aos agressores, não havendo qualquer ação expressiva que os levem em consideração. Diante dessa inquietação, o presente estudo se propõe a constatar a efetividade ou não da Lei Maria da Penha no que tange ao agressor, em relação aos artigos 30, 35 e 45 da respectiva lei; e identificar ações e propostas para lidar com os agressores em território nacional, seja no formato de lei, seja no formato de Politica Pública. São eles:
Art. 30° Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes. [...]
Art. 35° A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências: [...]
V – centros de educação e de reabilitação para os agressores. [...]
Art. 45° O art. 152 da Lei no7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 152. ……………………………………………
Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.”
O caminho metodológico necessário para atingir os objetivos colocados exigem examinar a legislação atual à procura das determinações legais em relação ao agressor, examinar o processo histórico de construção dessas determinações legais e seus efeitos, e fazer um levantamento nacional sobre políticas públicas, ações, propostas e serviços que visam atender aos agressores. Trata-se de uma pesquisa de campo e documental. O universo da pesquisa são os serviços de atendimento aos agressores de violência doméstica contra a mulher, tanto no âmbito da Assistência Social quanto no âmbito da Segurança Pública. Foi feito um mapeamento de organizações públicas e ONG’s que trabalham com agressores de violência contra a mulher, sendo a busca realizada através de sites oficiais disponíveis na internet e contatos via telefone e e-mail onde foi utilizado como instrumento da pesquisa de campo questionários enviados aos profissionais das organizações e entrevistas (anexo 2: roteiro de questionário).
O estudo é composto por três capítulos, sendo o primeiro destinado a entender as categorias teóricas do debate sobre a violência doméstica que serão abordadas na pesquisa, sendo elas: gênero e patriarcado, violência doméstica contra a mulher, agressor, e ciclo da violência. Busca-se apresentar que fenômeno é esse, e quem são os sujeitos dessas relações. O segundo capítulo é destinado a resgatar o processo histórico de construção das políticas públicas e mecanismos existentes para coibir e tratar da questão da violência doméstica contra a mulher, avaliando desde os aspectos históricos aos jurídicos e executores dessas políticas, com o objetivo de entender como se dá a implantação de tais serviços e o que existe por trás de cada um deles, principalmente a Lei Maria da Penha, que representa o mecanismo central dessa questão. O terceiro capítulo se dedica a desvelar a invisibilidade do sujeito agressor, promovendo reflexão sobre o serviços que o atendem, quais os limites e desafios dos profissionais que trabalham com o agressor e o que pensa o Poder Público sobre tais mecanismos. E por fim, conclui-se todo esse percurso, de forma que possibilite algumas reflexões importantes sobre todo esse universo que é a violência doméstica contra a mulher.
Sumário
Introdução
Cap. 1: Violência doméstica contra a mulher: Uma categoria de análise
1.1 Mulher: vítima, cúmplice ou culpada?
1.2 A cara que a violência tem
1.3 Desvelando a invisibilidade do sujeito agressor
1.4 O ciclo da violência: conhecer para erradicar
Cap. 2: Regulamentação da violência: Quando bater virou crime
2.1 O direito de ser reconhecida enquanto ser humano: A trajetória histórica das mulheres
2.2 Respostas da sociedade à violência doméstica contra a mulher no Brasil
2.3 Lei Maria da Penha: mitos e verdades
Cap. 3: Agressor: Sujeito ignorado
3.1 Mapa nacional: Atendimento ao agressor
3.2 O que diz o Poder Público
Considerações finais
Referências
Anexo


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