Conheça a equipe de sete mulheres responsável pelos acordos confidenciais de leniência firmados entre empresas envolvidas em malfeitos e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica
Débora Bergamasco
05.05.17
Hoje, somente sete mulheres no Brasil têm acesso total e participação em todas as etapas das ultra sigilosas negociações de acordo de leniência com o Cade, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Esses contratos são como as delações premiadas, mas aqui, firmados com empresas. Qualquer companhia que queira admitir e denunciar a prática de cartel deve procurar o órgão federal e então iniciar um longo e duro processo de tratativas com a equipe comandada pela chefe de gabinete da superintendência-geral do Cade, Amanda Athayde, de 29 anos.
Com a experiência de quem está há quatro anos no comando da Coordenação de Leniência, Amanda impôs uma linha de conduta. Doutora em Direto Comercial pela USP, ela orientou seu grupo de trabalho no sentido de que jamais e em tempo algum mencione o nome de empresas envolvidas em negociações em curso. Não está permitido sequer pronunciar o setor de atuação da empresa. Seja por e-mail, telefone ou em reuniões internas dentro do prédio do Conselho, a regra é citar apenas os nomes dos advogados, como uma espécie de senha. É o código para que todas saibam do que se trata. Para a coordenadora do grupo, todo cuidado é pouco quando se lida com a preservação do sigilo, “pois dele depende o sucesso das investigações”, prega ela.
A equipe, considerada linha-dura, já teve diversas outras formações, mas a ausência de homens na composição atual nada teve a ver com opções para garantir inclusão de mulheres ou com empoderamento feminino. Tudo ocorreu, digamos, por acaso. O critério foi exclusivamente escalar profissionais de carreira ou gestores públicos em cargo de confiança com extrema qualificação técnica e com perfil discreto para exercer a função. O fato de as melhores classificações terem sido alçadas por mulheres foi apenas conjuntural, relatou. “Nunca sofri preconceito aqui dentro por ser mulher nem por ser jovem e exercer um cargo de chefia. De uma maneira geral, nós, mulheres, ainda temos muito a caminhar, mas acredito que este caminho esteja promissor”, relata. “E isso passa pelo reconhecimento do trabalho feminino tanto por parte das próprias mulheres quanto dos homens”, avaliou ela, que diz reconhecer que nem sempre as mulheres podem se orgulhar dessa experiência positiva no mercado de trabalho.
A leniência
O primeiro acordo de leniência assinado com o Cade foi em 2003. A procura vem aumentado ano a ano. Só para se ter uma ideia, de 2015 para 2016, houve um aumento de 510% na procura por esse tipo de negociação. O boom começou alimentado pelo escândalo do metrô de São Paulo, que levou ao fechamento de colaboração com a gigante Siemens. Mas foi a Operação Lava Jato que turbinou a corrida de empresas ao Cade.
O acordo de leniência é uma espécie de delação premiada, porém firmado com a pessoa jurídica. A primeira empresa a procurar o Cade para denunciar existência ou participação em crime de cartel do qual o órgão não tenha conhecimento prévio inicia negociação para assinatura do acordo. As tratativas podem durar mais de um ano e o desfecho positivo passa obrigatoriamente pela apresentação de provas comprobatórias. Em 2016, para cada um dos acordos assinados, outro foi rejeitado, geralmente por falta de elementos relevantes para a investigação, ou por desistência da firma. Quem assina a colaboração pode conseguir imunidade de sanções administrativas e criminais. Mas vale somente para a primeira envolvida no ilícito a procurar o Cade. A segunda da fila, se tiver informações relevantes para contribuir, não assina leniência, mas sim um TCC, Termo de Compromisso de Cessação, e não recebe isenção de penas, apenas desconto nelas. Quem firmar o TCC pode celebrar também a leninência plus. Um exemplo prático dessa modalidade foi o que aconteceu no caso da Petrobras. A Toyo Setal foi a primeira a procurar o Cade para denunciar a cartelização na estatal. A Camargo Corrêa foi a segunda, por isso fechou o termo de compromisso de cessação. Mas como tornou-se a primeira a indicar a prática criminosa em Angra III, conseguiu acordar a leniência plus. Por isso, conseguiu mais descontos sobre suas penalidades. A lei não exige a participação do Ministério Público nessas assinaturas, mas todos até agora têm sido fechados com a participação da instituição, para garantir segurança jurídica aos colaboradores.
Os números das negociações
O primeiro acordo de leniência assinado com o Cade foi em 2003
Mais de 50 já foram assinados pela autoridade antitruste brasileira
De 2015 para 2016, houve um aumento de 510% na procura pelos acordos de leniência, graças à Lava Jato
O Cade celebra apenas UM ÚNICO Acordo de Leniência por infração denunciada, de modo que as empresas e/ou indivíduos participantes de um cartel estão em uma corrida entre si para reportar a conduta
A celebração do acerto confere aos signatários imunidade administrativa e criminal e redução de um a DOIS TERÇOS das penalidades
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