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sábado, 29 de dezembro de 2018

Miúcha deixa obra bela e relevante, mas abafada pelos laços familiares

Cantora foi mais do que a 'irmã de Chico', a 'ex-mulher de João' e a 'mãe de Bebel'

Por Mauro Ferreira, G1
27/12/2018
Miúcha deixa obra bela e relevante, mas abafada pelos laços familiares
Reprodução
Heloísa Maria Buarque de Hollanda (30 de novembro de 1937 – 27 de dezembro de 2018), a cantora e (eventual) compositora carioca conhecida como Miúcha, saiu de cena no fim da tarde de hoje, na cidade natal do Rio de Janeiro, aos 81 anos, sem o devido reconhecimento.

Miúcha foi cantora interessante e deixou discos relevantes, mas sempre pareceu ser mais conhecida como a irmã de Chico Buarque. Ou a ex-mulher de João Gilberto. Ou, a partir dos anos 2000, a mãe de Bebel Gilberto.
Nada mais injusto. Quem identificava Miúcha somente pelos nobres laços familiares da artista provavelmente ignorava que ela foi a única cantora que gravou, em 1977 e em 1979, dois álbuns de estúdio com ninguém menos do que o soberano Antonio Carlos Jobim (1927 – 1994). Sem contar um terceiro, ao vivo, gravado em 1977 em show antológico que juntou Tom e Miúcha com a dupla formada na década de 1970 por Vinicius de Moraes (1913 – 1980) com Toquinho.
Mais tarde, em 1989, foi Miúcha quem deu voz a quatro músicas de Guinga – com letras de Paulo César Pinheiro – em disco lançado anos antes de Guinga ser descoberto pelos críticos musicais e alçado à condição de gênio da MPB.
Miúcha deixa discografia que inclui três álbuns gravados com Tom Jobim — Foto: Beti Niemeyer / DivulgaçãoMiúcha deixa discografia que inclui três álbuns gravados com Tom Jobim — Foto: Beti Niemeyer / Divulgação
Miúcha deixa discografia que inclui três álbuns gravados com Tom Jobim — Foto: Beti Niemeyer / Divulgação
Miúcha nunca fez questão de ser moderna, de seguir as modas musicais, e nisso sempre foi bem parecida com o irmão Chico Buarque. Miúcha gostava de cantar e gravar músicas de Tom Jobim, de Vinicius de Moraes e do próprio Chico, claro.
O universo particular da cantora sempre gravitou em torno dos cancioneiros dos compositores que abasteceram os repertórios da Bossa Nova e da MPB surgida na era dos festivais dos anos 1960.
São esses compositores – Chico, Tom, Vinicius, Guinga, eventualmente Edu Lobo ou Carlos Lyra – que predominam nas assinaturas dos repertórios de álbuns como Rosa amarela (feito em 1997 para o Japão e lançado no Brasil em 1999), Miúcha.Compositores (2002), Miúcha canta Vinicius & Vinicius (2003), Outros sonhos (2007) e o derradeiro Ao vivo no Paço Imperial (2015).
Em 1978, ano em que a então censurada música Cálice (1973) foi liberada, Miúcha registrou a parceria de Chico com Gilberto Gil em compacto raro e obscuro no qual apresentou a filha Bebel Gilberto.
Miúcha deixa uma obra. Uma obra iniciada com compacto editado em 1975 e que inclui disco de 1976 assinado com o saxofonista norte-americano de jazz Stan Getz (1927 – 1991) e com João Gilberto. Uma obra que, por contingências do mercado fonográfico, perdeu o impulso da fase inicial 1975-1980 até ser retomada com regularidade nos anos 2000 com o ingresso da cantora na gravadora Biscoito Fino.
De todo modo, para a maior parte do público, talvez Miúcha continuará sendo a irmã do Chico, a ex-mulher do João e até mesmo a mãe de Bebel.
Azar de quem nunca abriu os ouvidos para escutar com atenção gravações precisas, feitas com suavidade e sem afetações. Gravações como as da canção fraterna Maninha (Chico Buarque, 1977) e da valsa Pela luz dos olhos teus (Vinicius de Moraes, 1960), da qual Miúcha fez em 1977 o melhor registro, aliás.
Miúcha sai de cena. Mas o canto da artista há de ficar para a posteridade e de ter o devido valor reconhecido no futuro. Ou talvez a morte da cantora a faça receber postumamente as flores que quase nunca lhe deram em vida.

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