A existência somente ganha sentido quando paramos de viver no piloto automático e de ficar de olho na vida alheia. É preciso estar em posse da própria vida.
Josués e Antônias estavam sempre à espera que seus companheiros ou companheiras tomassem as decisões. Nas comemorações do Natal e Ano Novo ou nas férias ou no fim de semana e até mesmo durante a semana, eles e elas se encaixavam na programação que o outro determinava. Dentro de si, pairavam sensações estranhas de insegurança e de desencontro com eles próprios.
Lenices e Amarildos sofriam com a chegada do fim do ano. Olhavam para trás e constatavam que não tinham aproveitado a vida. Não sabiam viver intensamente, deviam estar fazendo algo de errado. Todo mundo curtia ao máximo e eles não. A autocobrança martelava na cabeça e uma angústia forte aparecia.
Carlos e Célias viviam para o trabalho. Faziam horas extras, sempre trabalhavam pelo menos algumas horas nos dias de folga. Os exames médicos estavam atrasados, o sono também, o viver em família também, namorar também, o sonho das aulas de ioga deixado de lado. O cansaço físico e mental se acumulava e não recebia atenção.
Letícias e Tarcísios iam empurrando com a barriga, mas os fantasmas internos não davam trégua. Apareciam em forma de inveja, ciúmes, vergonha, tristeza, ansiedade, porém tudo era rapidamente jogado para debaixo do tapete. Ou resolviam com um remedinho antidepressivo. Sofriam por fugir de si mesmos.
Como se não tivessem em posse, no controle da própria vida, as pessoas seguiam vagando pelas órbitas alheias: do companheiro ou na doda chefe ou na da sociedade. Se o outro estava disponível, ótimo, lá estavam elas e eles presentes. Mas se a órbita deles e delas estivesse ocupada, voltavam para a órbita própria e simplesmente não sabiam o que fazer porque haviam esquecido de si mesmos, dos seus desejos, sonhos, do que gostavam de fazer, do alimento que o corpo, a mente e o espírito pediam.
Viver a vida do outro ou não olhar para si traz inúmeros distúrbios psíquicos, além, claro, de virarmos um fantoche facilmente manipulado por governantes que só pensam no poder e enriquecer. O capitalismo diz: aproveite gastando. Mas, qual é o seu aproveite? Um café com pão e manteiga, uma caminhada com o amigo?
Há um discurso medicalizante agressivo na nossa sociedade. Muitos medicamentos existem para manter eu, você, ele, ela e nós funcionando, rendendo, trabalhando. Essa tarefa é sua de se perguntar: por que estou me sentindo assim? Dou conta de me entender ou preciso de ajuda psicoterápica?
O encontro consigo mesmo talvez seja uma das mais importantes tarefas a se fazer na vida. Difícil, mas necessário e que, com certeza, irá trazer um sentimento profundo de estar vivo, de ser um ser vivo. A verdadeira integridade.
Muito provável que as respostas sobre o que você deseja, para onde quer ir, o que quer fazer, com quem você quer estar, não venham de imediato. Algumas podem vir, outras podem demorar bastante tempo. É um processo em construção que só vai terminar no momento da nossa partida, quando morrermos. Não tem problema. Aos poucos, vá ocupando a sua órbita. Deixa ela do seu jeito para ter uma vida que faz sentido para você.
Keila Bis é jornalista de bem-estar, terapeuta floral e psicanalista. Há alguns anos vem se dedicando a estar mais próxima do seu mundo interior. Além disso, escreve na primeira terça-feira de cada mês aqui no Portal. Para entrar em contato, mande seu e-mail para: kbismorais@yahoo.com.br
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