Considerado um dos programas de extensão mais antigos da Unifesp, o MEB ensina como a massagem pode ajudar mães na ampliação do vínculo afetivo e no estímulo ao desenvolvimento de seus bebês
(Fotografia: Alex Reipert)
Texto: Denis Dana
Ciência em movimentos que aproximam mães e pais de seus filhos, estreitam laços e contribuem para o desenvolvimento infantil. Assim pode ser caracterizada a shantala, técnica de massagem que surgiu na Índia e que tem sido estudada de maneira aprofundada desde 1996 pelo Grupo de Estudos Massagem e Estimulação com Bebês (GEMEB). Vinculado ao Departamento de Enfermagem Pediátrica da Escola Paulista de Enfermagem (EPE/Unifesp) – Campus São Paulo, o trabalho, que se iniciou como um projeto, evoluiu, passando a ser chamado de Massagem e Estimulação com Bebês (MEB), integrando três ações educativas – grupo de estudos, grupo terapêutico e oficinas para estudantes, profissionais da saúde e da educação infantil – e transformou-se em um dos programas de extensão mais antigos da Unifesp.
“Naquela época já era perceptível a necessidade de preparar de maneira mais adequada os futuros profissionais da saúde com conhecimentos sobre o desenvolvimento neuropsicomotor e afetivo, de forma a entender que faz parte da promoção à saúde da criança o fortalecimento das competências dos adultos, assim como a valorização de momentos de cuidado como espaço educativo”, explica Maria das Graças Barreto da Silva, docente na EPE/Unifesp, que está à frente do trabalho desde a sua criação.
“Naquela época já era perceptível a necessidade de preparar de maneira mais adequada os futuros profissionais da saúde com conhecimentos sobre o desenvolvimento neuropsicomotor e afetivo, de forma a entender que faz parte da promoção à saúde da criança o fortalecimento das competências dos adultos, assim como a valorização de momentos de cuidado como espaço educativo”, explica Maria das Graças Barreto da Silva, docente na EPE/Unifesp, que está à frente do trabalho desde a sua criação.
Essa percepção foi, então, grande motivação para a criação do grupo. Para Silva, “por meio do trabalho corporal propiciado pela massagem, realizada de forma sistematizada, possibilitou-se ampliar fronteiras que, além de preencher essa lacuna, viabilizou compartilhar saberes com as famílias”, explica.
Conhecimento e difusão do saber
No início do projeto os benefícios da massagem ainda eram desconhecidos. “Ela era usada muito mais como uma estratégia didática, um chamariz para atrair os estudantes para a necessidade de se conhecer mais profundamente o comportamento dos bebês e torná-los sujeitos da ação”.
Nessa época, o desafio do então GEMEB era compartilhar com a população saberes produzidos academicamente sobre o desenvolvimento infantil por meio da prática da shantala. Enquanto isso, os estudos acerca da massagem em bebês começavam a indicar seus benefícios, como a melhora na comunicação entre mãe e bebê, o relaxamento e os estímulos ao desenvolvimento motor e sensorial da criança, entre outros.
Em 2017, um novo marco para a shantala
Enquanto o trabalho era desenvolvido e se consolidava como uma importante contribuição da ciência em forma de amor e respeito entre mães e seus pequenos, o Ministério da Saúde também compreendia o valor desse tipo de intervenção. Em março de 2017, o órgão inseriu a shantala na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares como abordagem de cuidado no Sistema Único de Saúde (SUS).
“Essa inserção foi um marco da shantala aqui no Brasil, já que trouxe como possibilidade ofertá-la no âmbito da saúde pública. Ampliou, também, as probabilidades de realização de pesquisas em outros cenários, como o hospitalar e o educacional, o que só vem a somar ao trabalho realizado pelo MEB”, ressalta Silva.
Na Unifesp, a difusão dos benefícios da shantala também causou impacto positivo, cativando o interesse de muitos estudantes pelas suas ações educativas. Mais de 860 universitários passaram pelo programa de extensão. Grande parte teve origem na EPE/Unifesp. Mas, o MEB também recebe estudantes dos cursos de Fonoaudiologia, Medicina e Pedagogia. “São acadêmicos da Unifesp que se inscrevem para aprofundar seus conhecimentos acerca do desenvolvimento infantil, tendo como base as potencialidades envolvidas nessa técnica de massagem com bebês”, explica a coordenadora.
Atualmente, o grupo conta com a participação de 19 estudantes. Maria Luiza Souza Santos, 19, e Fernanda Isabela Ferreira, 23, fazem parte da equipe como monitoras. Ambas cursam o 2º ano de Enfermagem e logo que ingressaram na universidade se interessaram em integrar o MEB.
“O aprendizado vai muito além da técnica da massagem. Nesse programa de extensão, aprendemos também outros princípios, como o momento em que se deve focar na criança, a importância do estímulo para o desenvolvimento infantil e até na atuação profissional, com a criação de um olhar diferenciado e mais observador para os bebês. Esse conhecimento é fundamental para minha pretensão, que é seguir carreira na enfermagem pediátrica, com foco na promoção da saúde e qualidade de vida para as crianças”, diz Maria Luiza.
O desejo é compartilhado por Fernanda, que ao ingressar no curso de Enfermagem já pensava em trabalhar com bebês e crianças. “A experiência obtida no programa de extensão certamente nos ajudará a lidar e dialogar melhor com as mães de nossos futuros pacientes, além de nos ensinar a compreender e respeitar o momento do bebê, cuidado fundamental no trabalho de atendimento humanizado”, relata a estudante.
A monitora Fernanda Isabela Ferreira ensina os movimentos para Bibiana e seu bebê (Fotografia: Alex Reipert)
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Maria das Graças Barreto da Silva (EPE/Unifesp), coordenadora do trabalho (Fotografia: Alex Reipert) |
A estudante Maria Luiza Souza Santos em sessão de shantala com Lucilene e seu filho (Fotografia: Alex Reipert) |
Cumplicidade, afeto e mais benefícios
Nesses 23 anos de atividade, o MEB soma o atendimento a 1.840 famílias. “No Centro de Incentivo e Apoio ao Aleitamento Materno (Ciaam), onde acontecem as sessões de shantala, já recebemos alguns casais, mas a maior parte do público atendido é formado por mães, das mais variadas idades”, descreve Silva. “São pessoas de diferentes classes sociais e regiões da cidade, que buscam ampliar o vínculo afetivo com seus filhos”, explica.
Foi exatamente esse o motivo que fez Lucilene Monaris da Silva Araújo, 37, mãe de um bebê de seis meses, procurar o grupo. “Tive dificuldades na amamentação e ao procurar auxílio no Banco de Leite, descobri que a Unifesp também oferecia esse tipo de serviço”, destaca Lucilene.
Ao todo, foram cinco sessões de shantala sob a orientação da coordenadora e equipe, com mudanças e avanços já percebidos pela mãe. “Aprendi a explorar as sensações dele por meio do toque e fortaleci nosso vínculo, nossa afinidade. Também percebi que a massagem tem auxiliado no desenvolvimento de sua parte motora, com o fortalecimento das pernas e a evolução em alguns movimentos, como o rolamento. Ele está mais autoconfiante e mais independente”, comemora Lucilene.
Bibiana Lima de Jesus Ferreira, 39, é outra mãe frequentadora do MEB. Veio por intermédio de uma amiga e também se encantou pelos benefícios proporcionados pela shantala ao seu filho de seis meses. “Esse é o momento só nosso, quando permanecemos juntos e totalmente integrados. Em cinco sessões, percebi que nos divertimos, relaxamos e estreitamos ainda mais nossos laços, o que é muito gratificante”, descreve.
Além do vínculo entre mãe e filho, tanto Bibiana quanto Lucilene fizeram questão de destacar o laço estreitado entre sociedade e universidade por meio do trabalho do MEB. “É muito bom saber que a sociedade, por meio de serviços do SUS, oferecidos gratuitamente, pode ter acesso a uma parcela de todo o conhecimento que é produzido dentro de uma universidade. Para nós, trata-se de um aprendizado de imensurável valor”, explica Bibiana.
A origem do nome shantala
Em uma de suas visitas ao sul da Índia, o renomado médico ginecologista e obstetra francês Frédérick Leboyer ficou hipnotizado ao ver, em plena rua, uma jovem indiana paralítica massagear seu bebê em um verdadeiro ritual de carinho e cumplicidade. O momento de grande paz expresso naquele vínculo contrastava com o ambiente hostil daquele local, uma favela de Calcutá.
Encantado com a cena, Leboyer se aproximou e descobriu que aquela jovem mãe se chamava Shantala e que aqueles toques eram tradicionalmente ensinados, passados de mãe para filha.
O médico pediu autorização para registrar em fotos cada movimento que Shantala fazia em sua criança. As imagens, então, foram transformadas em um livro que o médico francês difundiu na Europa com o nome de sua modelo inspiradora.
A técnica de massagem logo extrapolou as fronteiras e ganhou projeção mundial, com todos os seus benefícios diretamente ligados à saúde e ao afeto entre mães, pais e filhos.
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