A menor incidência da covid-19 em crianças não as torna imunes às suas consequências. A proteção delas deve ser priorizada, especialmente nos países mais desiguais
FLORENCIA LÓPEZ BOO
27 JUL 2020
Três em cada quatro crianças no mundo deixaram de frequentar a escola por causa da covid-19. É uma das grandes mudanças causadas por uma pandemia cujas dimensões surpreenderam o mundo inteiro em todos os setores econômico e social. A necessidade de conter o número de infecções e de cuidar de milhares de pessoas infectadas monopolizou a atenção dos governos que, com alívio, viram que o vírus parecia não afetar em grande medida as crianças. Isso mergulhou a infância em uma invisibilidade perigosa, que está fazendo soar o alarme com os efeitos devastadores da crise a curto, a médio e a longo prazo, especialmente em crianças com menos de cinco anos de idade, que estão em um momento fundamental em seu desenvolvimento físico, intelectual e emocional.
Pela primeira vez em mais de 60 anos, a mortalidade infantil poderia aumentar devido aos efeitos indiretos da pandemia na nutrição e na falta de acesso aos serviços de saúde. O não cumprimento dos cronogramas de vacinação prevê um aumento de doenças até então controladas e a interrupção dos serviços da primeira infância, sejam eles centros de atendimento, educação infantil ou atendimento domiciliar, anuncia atrasos significativos não apenas no desenvolvimento infantil e aprendizagem das crianças, mas na sua saúde física e mental. Junto com isso, as mudanças na dinâmica familiar como consequência do confinamento, a diminuição da renda familiar, estresse ou ansiedade dos membros da família, entre muitos outros, agravam situações de violência doméstica.
Pela primeira vez em mais de 60 anos, a mortalidade infantil poderia aumentar devido aos efeitos indiretos da pandemia na nutrição e na falta de acesso aos serviços de saúde. O não cumprimento dos cronogramas de vacinação prevê um aumento de doenças até então controladas e a interrupção dos serviços da primeira infância, sejam eles centros de atendimento, educação infantil ou atendimento domiciliar, anuncia atrasos significativos não apenas no desenvolvimento infantil e aprendizagem das crianças, mas na sua saúde física e mental. Junto com isso, as mudanças na dinâmica familiar como consequência do confinamento, a diminuição da renda familiar, estresse ou ansiedade dos membros da família, entre muitos outros, agravam situações de violência doméstica.
Na América Latina e no Caribe, a região já mais desigual do planeta, a crise causada pela covid-19 trará um aumento nos níveis de pobreza, bem como um aumento dramático nas desigualdades econômicas e no acesso a serviços sociais e de saúde. Estimativas do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) indicam que, nos melhores cenários, a crise econômica mundial durará até 2021. Em termos práticos, muitas crianças nesta região viverão seus primeiros anos de infância em pobreza ou pobreza extrema, o que terá um efeito negativo ao longo de suas vidas e as colocará em uma situação mais precária, se é que isso é possível, pois elas já são o grupo etário que recebe o menor investimento público.
Apesar do cenário preocupante, a crise atual oferece uma oportunidade única de transformar a prestação de serviços na primeira infância nessa região. A grande maioria dos professores e trabalhadores do setor fizeram esforços incessantes para ajudar suas crianças e famílias e oferecer atenção personalizada o máximo possível. Uma publicação recente do BID compila grande parte das respostas colocadas em prática no curto prazo e propõe outras medidas, que enfrentem os desafios no médio prazo e na transição para a nova normalidade.
Em alguns dias, por exemplo, os educadores adaptaram seus métodos aos novos requisitos da distância física exigida pelas condições sanitárias, fizeram inovações curriculares que enfatizam conteúdos mais simples e versáteis, introduziram materiais disponíveis nas casas e que podiam ser facilmente integrados às rotinas diárias ou exploraram todas as rotas de acesso, seja através da Internet, telefone, rádio, televisão ou cartazes, para espalhar seu conteúdo.
Todas essas são medidas que facilitam a chegada e aceitação de intervenções nos territórios e comunidades mais remotas e diversas, como a população rural, as comunidades indígenas e outros grupos com conectividade limitada. Da mesma forma, mudanças na organização e no equipamento dos centros de assistência e educação contribuirão positivamente para o cuidado e a dedicação oferecidos às crianças e permitirão melhorias na dinâmica que afeta as interações entre educadores/cuidadores e as crianças.
A necessidade forçou uma reação com rapidez e eficiência, mas agora é o momento de definir e consolidar mecanismos de apoio governamental para os cuidadores nos lares e priorizar ações que deem continuidade aos processos de desenvolvimento e aprendizado da primeira infância. É necessário aproveitar o espírito inovador para desenvolver novas estratégias que respondam às necessidades de todas as famílias, independentemente do seu nível socioeconômico, e encontrar maneiras de adaptar os materiais e ferramentas que se mostraram eficazes antes da pandemia à situação atual.
É essencial alcançar aqueles que mais o precisam e com a maior urgência; portanto, agora mais do que nunca, é necessário realizar um trabalho colaborativo que permita desafios permanentes e o intercâmbio de soluções entre os países. Por esse motivo, o portal dedicado à covid-19, lançado pelo BID, fornece informações atualizadas sobre a situação dos serviços nos países da América Latina e no Caribe, com indicações de materiais e recursos já em uso e diretrizes para protocolos de reabertura, cujo conhecimento é essencial para os gestores públicos e privados. Os apelos à união com slogans como “Juntos saíremos dessa” têm sido amplamente utilizados nos últimos meses em todo o mundo. Na América Latina e no Caribe, juntos devemos priorizar o apoio e a proteção das crianças e de seus cuidadores para enfrentar as consequências da pandemia e construir sociedades mais resilientes e menos díspares.
Florencia López Boo é economista líder na divisão de Saúde e Proteção Social do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
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