Homens russos estão se organizando nas redes sociais para perseguir mulheres russas que se relacionam com estrangeiros durante o Mundial de futebol
03.07.2018 | POR BÁRBARA TAVARES
Bem distante da alegria do futebol, o machismo também está dando goleada na Rússia, país-sede da Copa do Mundo de 2018. Depois dos diversos vídeos que circularam na imprensa e redes sociais de mulheres sendo assediadas, surge outro alerta: grupos ultranacionalistas russos que ofendem e ameaçam mulheres que se relacionam com estrangeiros.
Alena Popova, 35, a jurista que ficou conhecida por criar uma petição online para indiciar judicialmente os brasileiros que ofenderam uma mulher russa em vídeo, é quem faz o alerta. Alena tem um longo histórico de defesa dos direitos da mulher no país, ela é co-autora da lei contra a violência doméstica – similar à Lei Maria da Penha no Brasil, ainda em fase de aprovação na Rússia.
Em entrevista exclusiva à Marie Claire, a advogada falou sobre a criação desses grupos no VKontakte – ou só VK – rede social russa semelhante ao Facebook com mais de 140 milhões de usuários. “Alguns homens russos criaram grupos com o nome ‘Pink Vaginas’, onde se voluntariam para matar e espancar mulheres russas que se relacionarem com homens estrangeiros. Parece loucura, mas eles espalham fotos de mulheres russas que, por exemplo, têm namorados estrangeiros, tentam identificá-las e se organizam para persegui-las”, disse.
Perseguição online
Em uma das comunidades que Marie Claire teve acesso, foram compartilhadas fotos e alguns vídeos de mulheres russas interagindo com estrangeiros de várias nacionalidades. Elas aparecem se divertindo e, em alguns momentos, abraçando-os e beijando-os, num clima natural de confraternização e festa. “Já estou com nojo”, disse um homem em um comentário. “Quando ele for embora, ela vai morrer sozinha”, disse outro.
Uma jovem que postou uma foto abraçada a um turista contou que recebeu ameaças pelo VK logo após a publicação, que logo foi deletada por ela, por temer represálias. “Eles escreveram que iam cortar o meu útero e até anexaram fotos com armas”, disse ela em entrevista à BBC.
Em um vídeo do ano passado compartilhado na comunidade, o dono de um canal no YouTube chamado “Natural Select” (seleção natural, em tradução livre) realiza uma experiência em que ele próprio e um colega sueco abordam mulheres russas na rua e comparam quem teve mais sucesso em conseguir encontros.
O “placar final”, que ficou em 6 a 2 para o sueco, foi usado por usuários para insultar mais as mulheres russas, afirmando que elas se comportam como “putas à venda”.
“A dignidade das mulheres russas está completamente ausente”
A deputada Tamara Pletneva, líder do Comitê da Família, Mulher e Criança na Duma, Câmara baixa do Parlamento russo, causou polêmica com uma declaração em que dizia que as mulheres russas não deveriam fazer sexo com estrangeiros para evitar que se tornassem mães solteiras.
Ela citou como exemplo os Jogos Olímpicos de Moscou de 1980 e alegou que, na época, muitas russas engravidaram após relações com turistas e, quando eles deixaram o país, elas ficaram sozinhas e “muito tristes”.
O assunto também foi pauta da coluna do escritor Platon Besedinno tabloide russo Moskovsky Komsomolets. Intitulado O tempo das putas: mulheres russas envergonham o país e a si mesmas durante o Mundial, o texto causou revolta e acendeu o debate em torno dos direitos das mulheres.
“Nós criamos uma geração de prostitutas, prontas para abrir suas pernas ao menor ruído de um sotaque estrangeiro. Se eles mostrarem notas de dólar, então, é absolutamente perfeito para elas”, diz.
“Mulheres fazendo sexo com quem elas querem, exatamente como os homens. Que horror”, ironizou uma leitora na página do jornal. Alguns homens, por outro lado, saíram em defesa de suas compatriotas: “Deixem-nas se divertirem com os estrangeiros, assim como nós homens podemos nos divertir com as estrangeiras”, disse um rapaz.
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