Marie claire
21.08.2018 | POR DEBORA DINIZ
Em sua nova coluna desta semana, Debora Diniz fala sobre o perfil dos eleitores que desejam manter seus privilégios às custas da opressão
Por um momento pensei que estava lendo a pesquisa errada: era sobre as intenções de votos para a presidência da república, mas eu lia como um retrato do perfil dos encurralados da história. O erro não foi sem razão – o perfil dos encurralados é o mesmo dos que votam em Bolsonaro. Quem são eles? Homens, mais ricos e mais educados, de regiões onde vivem os privilegiados da sociedade brasileira.
São homens que se sentem encurralados pela força das mulheres no mercado de trabalho – nas novas gerações, somos maioria em todos os cursos universitários, exceto naqueles em que florescem os redutos do capitão do mato, como as engenharias ou escolas militares. A razão é simples: o Brasil não é mais um país industrial, em que se constroem pontes ou estradas, prédios para a criação da nova capital. Ou que se vive em ditadura. O sonho de filhos médicos, engenheiros, militares ou padres como o de poder ou dinheiro no banco é nostalgia do passado.
Os encurralados da história sofrem porque se imaginariam em festa pelos privilégios das castas anteriores, pela conquista da arma na cintura ou pelo título de doutor ou coronel. Convivem com mulheres de patentes elevadas, como pastoras que lideram igrejas ou como médicas negras segurando o bisturi. E com uma ousadia sem tamanho para a história da discriminação racial, étnica e de gênero no país temos uma indígena nordestina como candidata à vice-presidência da república e uma filha de seringueiro do norte como candidata à presidência.
É muita ousadia das mulheres aos homens encurralados da história. Só lhes resta falar em armas e gritar, ameaçar e perseguir. Erram novamente de estratégia – nós somos filhas e netas de outras mulheres que não votavam, que não podiam trabalhar além da servidão doméstica, de mulheres que sofriam violência como parte da lei natural da vida. Nós trabalhamos e reclamamos igualdade salarial. Exigimos nem uma menos por violência de gênero. Além de sermos mães, queremos decidir se abortamos ou não, e sem cadeia. Somos nós quem decidiremos o destino dos encurralados da história. Sabemos como resistir, somos pacientes. Resiliência é palavra política feminina.
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