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sexta-feira, 14 de novembro de 2014

O homem sozinho

Descasado não sabe passar uma camisa, lava cueca no chuveiro do flat. Copo? Todos imundos na pia...

WALCYR CARRASCO
11/11/2014

Um dia ele se decide: separa. Às vezes nem tem um motivo tão claro. A paixão acabou, mas continua gostando dela. Tem vontade de se apaixonar novamente. Mas vai acontecer? Acusa a mulher de chata, implicante, sente-se tolhido em suas liberdades. Quer independência. Acha que a vida pode ser mais estimulante. Ou tem outra, algo também comum.

Ele faz as malas. Se tem filhos, o casal tenta convencer as crianças de que tudo está bem – como se fosse possível mentir para filho. Ele vai para um flat. Sente que a vida começou novamente. Diante das cuecas sujas, entra no desespero. A organização da casa, as pequenas coisas em que nunca pensara se tornam tarefas admiráveis. Apesar de toda a luta das mulheres, raros são os homens que realmente dividem as tarefas do lar. O descasado não sabe passar bem uma camisa, começa a ir amarrotado para o trabalho. Lava cuecas no chuveiro. Ah, tem a lavanderia do flat, mas muitas vezes esquece de mandar as roupas. Ou acha caro gastar tanto. Agora são duas despesas, a da casa anterior e a da nova vida. Tenho um amigo que, durante algum tempo, se divertiu. Saía com os colegas solteiros, bebia. O flat se transformou num matadouro, para onde atraía gatas incríveis. Subitamente, procurava um copo – e nada de achar. Todos imundos. Tinha de lavar. Pior, ao se deitar, era obrigado a conviver com a visão dos pratinhos empilhados, de restos de pizza ou comida chinesa. Acordava e tinha raiva de olhar a pia.

Outro foi para a casa da mãe, num bairro distante de onde morava. Foi recebido de braços abertos, com a exclamação materna:

– Eu sabia que seu casamento não ia dar certo.

Isso depois de dois filhos, anos e anos de vida conjugal! A maioria das mães tem esta certeza: o casamento do filho não dará certo. Mãe tem ciúme de filho homem. Quando ele gasta com a mulher, sente um aperto no coração.

– Ela vive no luxo! E meu filho nunca me levou para Disney!

De novo em seu quarto, com as lembranças dos tempos anteriores ao casamento, ele se sente confortável. A mãe cuida de tudo.

Só que a casa não era dele. Começou a se incomodar com as pequenas manias da mãe, como assistir à televisão alto demais. E com a comida. Depois da comemoração pela chegada, com seus pratos prediletos, tornou-se cotidiana e sem sal – a mãe tinha pressão alta. Não se sentia em casa. O lar materno deixara de ser o seu, queria ter seu próprio espaço. Financeiramente, era impossível. Mesmo porque a ex entrou com um processo furioso de pensão.

E a sensação do descasado ao visitar os filhos? Tornou-se um estranho na própria casa. Os móveis que comprou com ela não são mais seus. Nem tem intimidade para ir ao quarto pegar alguma coisa. No carro, a caminho, seus sentimentos melodramáticos anteciparam o encontro com as crianças, abraços e lágrimas. O filho quer ir praticar skate com os amigos, dá um abraço rápido, diz que está com saudade e sai rapidamente. Ou a filha bate a porta do quarto e avisa que não fala mais com ele. A ex afirma que faz tudo para os filhos entenderem, mas...

– Criança é criança.

Se ela já arrumou namorado, ele sente vontade de morrer. Como, tão rápida? Tenta ser civilizado. Mas examina o sujeito com lente de aumento. Quer descobrir defeitos. No mínimo, acha que deve ser gay.

Muitos saem de um casamento diretamente para outro. Mudam-se para a casa da namorada, sua nova mulher. No início, tudos são flores. A sensação de novidade é assassinada pela rotina. Há muitos elementos em jogo. Possíveis filhos dela que não o suportam. Ou que o adoram, mas que ele não sente como seus. Pode até descobrir que ela não lava os pratos e usa a mesma calcinha duas vezes. Ou que bota muito curry na comida, para seu horror. Amor depende de tudo, até do curry.

Em breve, descobre que sua vida está parecida com a de antes. São as mesmas obrigações, idênticas chatices do dia a dia. Mais que isso: a nova mulher lembra a anterior. Isso é comum. As pessoas têm mais atração por um tipo físico, sempre. A nova mulher lembra mesmo vagamente a ex.

Então, ou ele passa a pautar a vida por uma sucessão de separações e uniões. Ou se conforma com o novo lar.

No fundo, fica a insatisfação que o levou a separar-se pela primeira vez. A maioria aprende a guardar esse sentimento lá no fundo, a não deixar que pule para fora e mude sua vida de novo. Só que às vezes ele diz a si mesmo:

– Se era para ser tão parecido, por que me separei?

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