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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Precisamos falar de gênero e sexualidade na escola? (Parte 2)

O corpo: superfície de inscrição dos acontecimentos (enquanto que a linguagem os marca e as ideias os dissolvem), lugar de dissociação do Eu (que supõe a quimera de uma unidade substancial), volume em perpétua pulverização. (Michel Foucault, Microfísica do Poder, p.22).
UNICAMP
9 de Janeiro de 2018 Ana de Medeiros Arnt
Falar de gênero e sexualidade envolve outro conceito que é sumamente importante: corpo.
Quando tratamos das questões do corpo, na biologia, lidamos com terminologias próprias desse campo de conhecimento. Tomamos o corpo muitas vezes uma expressão pura, nomeando-o como “organismo”. Qual o problema disto?
A questão é que quando falamos dentro de uma perspectiva biológica limpamos tudo o que há de vivência neste corpo (que é o nosso corpo). É importante ressaltar que tratá-lo como conceito (teórico e prático) não é negar seu funcionamento biológico. Negar não faria sentido. Trata-se de entrelaçar isso à obviedade de que nos constituímos dentro de uma sociedade e cultura. Essa noção faz parte de quem e como somos, como funcionamos e que as relações entre biologia e cultura são de difícil segmentação.

O que estou querendo afirmar, aqui, é que nós não só temos um corpo… Nós também somos nosso corpo. Este corpo carrega em si todas as marcas de nossa vida: experiências, vontades, tristezas, alegrias, esportes, dietas, fome e festas.
E o que isto tem a ver com gênero e sexualidade? Ora! É a partir deste corpo que nos relacionamos com o mundo, incluindo como nos entendemos a partir do que a sociedade impõe como regra e como vivemos estas regras, aceitando-as e confrontando-as. Nossos desejos e atrações sexuais e afetivas também se vinculam a estes preceitos sociais, além de suas características biológicas. Aliás, é na articulação entre nossa biologia e como aprendemos a ser humano em nossa cultura que nos constituímos sujeitos e aprendemos a lidar com este corpo que somos.
Em relação à escola, de maneira mais específica, podemos dizer que este é um espaço social de intenso aprendizado. Não só do conteúdo formal de suas áreas, mas em toda a convivência que temos ao longo dos anos nesta instituição. Assim, é ali que aprendemos sobre: diferenças, lidamos com inúmeras pessoas, percebendo-as com uma diversidade de ideias e ideais, formamos grupos sociais e afetivos e, mais do que isso, aprendemos regras e normas sociais. Desta forma, mesmo que não tratemos de gênero e sexualidade (e corpo) como conteúdo: estamos aprendendo a lidar com isto desde muito cedo.
Tratar do corpo como uma construção social é, portanto, buscar compreender como nós – seres que possuímos uma biologia, sim – também nos constituímos como seres sociais e como nosso corpo se modifica e como nós nos tornamos o que somos (enquanto indivíduos e enquanto sociedade), neste entrelaçamento.
Falar disto na escola não é obrigar ninguém a ser gay, cisgênero, transgênero, lésbica, heterossexual, ou qualquer categoria inventada por nós, para nos encaixarmos de forma estanque. Tratar deste tema no espaço escolar é mais do que defender a simplicidade da existência de dois gêneros – masculino e feminino. É mais do que perceber somente a heterossexualidade como “norma”. É buscar compreender que seres humanos são parte de uma complexidade. É saber que aprender os conceitos biológicos não basta para nos entendermos e que tratar do nosso corpo apenas a partir dos preceitos desta ciência não é suficiente para que consigamos abarcar a diversidade, aprendendo a respeitá-la (quiçá tolerá-la). Silenciar este entrelaçamento é negar as possibilidades de aprendermos melhor sobre nós enquanto espécie e, talvez pior que isso, rejeitar parte da diversidade que somos.
Nos próximos posts, tratarei ainda das questões de saúde – envolvendo estes três conceitos fundamentais: corpo, gênero e sexualidade. E também como a escola não deve se omitir sobre isso… Para, ao fim, apontar as questões políticas e legais que têm sido abordadas nos últimos anos em nosso país. Até o próximo 😉
Para saber mais:
Foucault, Michel. 2002. Nietzsche, a genealogia e a história. In: ___. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal. p. 15-38.
Goellner, Silvana. 2010. A educação dos corpos, dos gêneros e das sexualidades e o reconhecimento da diversidade. Cadernos de Formação RBCEp. 71-83. Disponível em: http://www.rbce.cbce.org.br/index.php/cadernos/article/view/984/556. Acesso em: 09/01/2018.
Souza, Nádia G.S., Arnt, Ana M., Rabuske, Anelise. 2007. A fabricação do corpo: efeitos da disciplinarização dos saberes e do corpo nas práticas escolares. Revista Gênero, v.7, n.2. Disponível em: http://www.revistagenero.uff.br/index.php/revistagenero/article/view/147/90. Acesso em: 09/01/2018.
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