Por Nicolás Satriano, G1 Rio
06/03/2020
Mães com idades entre 21 e 40 anos, atacadas com facas ou a tiros em casa, à noite ou de madrugada. É esse o principal perfil de mulheres vítimas de feminicídio no Rio de Janeiro, segundo levantamento da Defensoria Pública estadual (DPRJ).
O estudo, feito a partir de uma pesquisa em processos na Justiça envolvendo casos de feminicídio, demonstrou também que as agressões são geralmente cometidas pelo namorado, companheiro ou marido das vítimas, com quem elas em média se relacionaram por cinco anos.
O estudo, feito a partir de uma pesquisa em processos na Justiça envolvendo casos de feminicídio, demonstrou também que as agressões são geralmente cometidas pelo namorado, companheiro ou marido das vítimas, com quem elas em média se relacionaram por cinco anos.
"Os dados deixam claro que as vítimas de feminicídio são alvos de pessoas próximas, com quem mantiveram ou mantêm relacionamento amoroso, e sofrem de situações de violência em momentos e locais em que se encontram mais vulneráveis", analisou a diretora de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça, Carolina Haber.
A diretora acrescenta outro resultado: 73% dos crimes ocorreram "em período de descanso". De acordo com ela, "a incidência é a mesma para os casos registrados na residência da vítima, morasse ela ou não com o agressor".
Também foi realizado um cruzamento de dados pela Defensoria indicando que as agressões que terminam com a tentativa ou o assassinato da vítima têm pouco a ver com o tempo de relacionamento do casal.
Segundo o estudo, algumas relações começaram um mês antes do crime; outros tinham décadas de duração. Já o intervalo entre o rompimento e o ataque é bem mais curto: de 24 horas a 18 meses.
107 processos, 116 vítimas
O estudo é uma parceria do setor de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça com a Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria.
No total, foram analisados 107 casos envolvendo 116 vítimas, de processos ajuizados entre 1997 e 2019. Dos processos examinados, a maioria (75) ocorreu no Município do Rio – confira outros resultados da pesquisa no infográfico abaixo.
"O objetivo primordial dessa pesquisa é compreender as circunstâncias que envolvem a prática do feminicídio, especialmente no que se refere à realidade da mulher vítima desse tipo de violência", explicou a coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher, Flavia Nascimento.
- MONITOR DA VIOLÊNCIA: Brasil tem alta no número de feminicídios em 2019
- MAPA ESPECIAL: Os casos de feminicídios ano a ano no país
- ANÁLISE DO FBSP: Redução dos homicídios femininos não significa diminuição da violência doméstica
- ANÁLISE DO NEV: Avanços precisam ir além da melhoria dos registros, e foco deve estar na prevenção
- METODOLOGIA: Monitor da Violência
Feminicídio no RJ — Foto: Wagner Magalhães/Editoria de Arte G1
Motivação
Outra importante conclusão do estudo se dá quanto à motivação do crime. Segundo a Defensoria, para chegar à constatação foram consideradas informações constantes no inquérito policial ou nos autos do processo. São relatos feitos pelo próprio autor do crime.
"Uma em cada três agressões é atribuída, pelo autor, à dificuldade em aceitar o fim do relacionamento", resumiu Carolina Haber, que dirigiu a pesquisa.
Principais fatores que motivaram o crime:
- recusa da vítima em reatar o relacionamento;
- ciúme;
- discussão por razões diversas;
- vingança, inclusive por registro policial de agressão anterior;
- gravidez;
- recusa da mulher em ter relação sexual.
Distribuição de crimes no Rio
A pesquisa também tem um recorte voltado para a capital do estado. No Rio, os pesquisadores identificaram que na Zona Oeste foram registrados 60% dos casos. Em seguida, na Zona Norte (29%), Centro (7%) e Zona Sul (4%).
Violência anterior
A coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher, defensora pública Flavia Nascimento, expõe outra descoberta da pesquisa: em "55% dos casos analisados há relato de violência doméstica anterior". Ela acredita que isso ocorre porque "as vítimas deixaram de formalizar o registro em razão de medo ou coação praticada pelo réu".
"Esperamos, com esses dados, qualificar a atuação da Defensoria Pública na assistência às vítimas de violência de gênero e compreender melhor por que razões a rede de proteção à mulher não foi eficaz na sua proteção", ressaltou.
Denúncias desconsideram tipificação
Em outro detalhamento, o estudo indica que apesar de o Código Penal definir o feminicídio como a prática do homicídio quando a vítima é mulher e os motivos do crime se relacionam a essa condição, ainda há processos em que as denúncias não consideram a tipificação.
"Os números mostram que, passados quase cinco anos da Lei do Feminicídio, muitos casos ainda são denunciados como homicídio. Trazer à luz um levantamento como esse é um passo importante para combater a violência de gênero, em especial no ambiente doméstico", ressaltou a defensora pública Flavia Nascimento.
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