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segunda-feira, 16 de março de 2020

Filhos de relacionamentos diferentes recebem pensão alimentícia de igual valor?

Entenda a ponderação do Princípio da Igualdade entre os filhos

Publicado por Marcela Camargo
15/03/2020

Os genitores possuem o dever de contribuir para o sustento dos filhos, fornecendo-lhes tanto a assistência material como a moral, para que sejam providas as necessidades com alimentação, vestuário, educação e tudo que se faça imprescindível para a manutenção e sobrevivência de sua prole.

lei de alimentos fixou como parâmetro para a estipulação da pensão alimentícia o binômio necessidade e possibilidade, ou seja, a análise a ser feita pelo juiz deve observar a necessidade de quem recebe (credor/alimentando) e capacidade/possibilidade de quem presta (devedor/alimentante).
Com o advento do Código Civil de 2002, o binômio se transformou em trinômio, sendo acrescentada a proporcionalidade. Vejamos:
Art. 1694§ 1ºCC → Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
Assim, além da regra da necessidade e capacidade, exige-se também que ocorra a observância da proporcionalidade (necessidade X capacidade X proporcionalidade). Os alimentos devem ser fixados considerando as necessidades do alimentando e a possibilidade da pessoa obrigada a prestá-los, utilizando da proporcionalidade do pagamento dos alimentos entre os parentais.
Assim, as inúmeras necessidades dos filhos devem ser atendidas de acordo com as possibilidades dos pais, os quais devem lhes conferir a mesma condição social por si vivenciada. As despesas são estabelecidas na proporção dos recursos disponíveis, juntando-se as contribuições paterna e materna.
A utilização da proporção sustenta a natureza personalíssima da obrigação alimentar, devendo ser feita uma análise concreta de cada caso.
Constituição Federal de 1988, em seus artigos 226 e 227, trouxe o princípio da igualdade entre os filhos. Igualdade esta que vedou além das designações discriminatórias com relação aos filhos legítimos e ilegítimos, a mera discriminação em relação aos direitos econômicos.
Diante deste princípio, como os alimentos são fixados com relação a filhos de diferentes relacionamentos? Eles devem ser de igual proporção/valor?
A questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça, que entendeu que os alimentos prestados para filhos oriundos de relacionamentos diversos podem SIM ser estipulados em valores diferentes, sem que isso importe em afronta ao princípio da isonomia ou em ilegalidade, vez que deverão ser sopesadas as peculiaridades do caso concreto.
Segue a ementa do julgado:
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. DIFERENÇA DE VALOR OU DE PERCENTUAL NA FIXAÇÃO DOS ALIMENTOS ENTRE FILHOS. IMPOSSIBILIDADE, EM REGRA. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE ENTRE FILHOS, TODAVIA, QUE NÃO POSSUI CARÁTER ABSOLUTO. POSSIBILIDADE DE EXCEPCIONAR A REGRA QUANDO HOUVER NECESSIDADES DIFERENCIADAS ENTRE OS FILHOS OU CAPACIDADES DE CONTRIBUIÇÕES DIFERENCIADAS DOS GENITORES. DEVER DE CONTRIBUIR PARA A MANUTENÇÃO DOS FILHOS QUE ATINGE AMBOS OS CÔNJUGES. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COGNIÇÃO DIFERENCIADA ENTRE PARADIGMA E HIPÓTESE. PREMISSAS FÁTICAS DISTINTAS.
1- Ação distribuída em 06/03/2012. Recurso especial interposto em 22/04/2015 e atribuído à Relatora em 26/08/2016. 2- O propósito recursal consiste em definir se é ou não admissível a fixação de alimentos em valores ou em percentuais diferentes entre os filhos. 3- Do princípio da igualdade entre os filhos, previsto no art. 227§ 6º, da Constituição Federal, deduz-se que não deverá haver, em regra, diferença no valor ou no percentual dos alimentos destinados a prole, pois se presume que, em tese, os filhos - indistintamente - possuem as mesmas demandas vitais, tenham as mesmas condições dignas de sobrevivência e igual acesso às necessidades mais elementares da pessoa humana. 4- A igualdade entre os filhos, todavia, não tem natureza absoluta e inflexível, devendo, de acordo com a concepção aristotélica de isonomia e justiça, tratar-se igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades, de modo que é admissível a fixação de alimentos em valor ou percentual distinto entre os filhos se demonstrada a existência de necessidades diferenciadas entre eles ou, ainda, de capacidades contributivas diferenciadas dos genitores. 5- Na hipótese, tendo sido apurado que havia maior capacidade contributiva de uma das genitoras em relação a outra, é justificável que se estabeleçam percentuais diferenciados de alimentos entre os filhos, especialmente porque é dever de ambos os cônjuges contribuir para a manutenção dos filhos na proporção de seus recursos. 6- Não se conhece do recurso especial pelo dissídio jurisprudencial quando houver substancial diferença entre a cognição exercida no paradigma e a cognição exercida na hipótese, justamente porque são distintas as premissas fáticas em que se assentam os julgados sob comparação. Precedentes. 7- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (STJ - REsp 1624050/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 22/06/2018) (STJ - Informativo de Jurisprudência n. 0628, de 03.8.2018).
A relatora do caso ainda reconheceu que, em regra, não se deve fixar a obrigação de alimentos em valor absoluto ou percentual diferente entre a prole, considerando que os filhos precisam ter acesso à condições igualitárias. No entanto, ressaltou: “É dever de ambos os cônjuges contribuir para a manutenção dos filhos na proporção de seus recursos. Assim, poderá ser justificável a fixação de alimentos diferenciados entre a prole se, por exemplo, sendo os filhos oriundos de distintos relacionamentos, houver melhor capacidade de contribuição de um genitor ou genitora em relação ao outro”.
No caso onde o pai paga alimentos a dois filhos de diferentes relacionamentos, se a mãe de um dos filhos possui melhores condições financeiras e a mãe do outro filho possui piores condições, deve-se analisar a proporção que cada genitor deve arcar com sua prole, havendo desproporção caso fossem fixadas pensões de igual valor. Essa diferenciação não ofende ao princípio da igualdade. Os alimentos podem não ter o mesmo valor para todos os filhos em casos como os em tela, pois merece específica análise das necessidades particulares de cada alimentando e dos alimentantes.
Logo, ao se verificar a capacidade de alimentar do outro responsável pelo filho, o valor da obrigação de pagar alimentos pode ser diferente para os filhos de relacionamentos diferentes.

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