Ao negar medidas protetivas a uma mulher ameaçada de morte pelo ex-namorado, o juiz de Direito Joseli Luiz Silva, da 3ª Vara Cível de Goiânia, criticou a decisão dela de fazer o pedido sem apresentar uma representação criminal. Para o magistrado, ao agir assim, a mulher não se dá ao respeito. E sugeriu que ela colocasse "para moer", dizendo que legítima defesa é "muito mais eficaz que qualquer medidazinha de proteção".
Segundo o magistrado, "é um nada" decidir que o agressor deve manter determinada distância. Assim, por considerar que a mulher quer pouco se proteger ao pedir somente isso, ele entendeu que não cabe a medida protetiva.
Afirmou ainda que o desejo da vítima de se ver respeitada e protegida deveria ser manifestado na disposição de representar contra o agressor, para que houvesse de fato efetividade na Justiça.
Conforme consta da decisão, Silva afirmou que, "enquanto a mulher não se respeitar, não se valorizar, ficará nesse ramerrão sem fim — agride/reclama na polícia/desprotegida", fazendo desmerecido o poder público.
"Se a representante quer mesmo se valorizar, se respeitar, se proteger, então bata com firme, bata com força, vá às últimas consequências, e então veremos o quanto o couro grosso do metido a valente suporta", complementou o juiz. Sem isso, segundo o magistrado, não há medida protetiva que seja eficaz.
Despreparo do Judiciário
Para a integrante do coletivo Mais Respeito e procuradora do Estado de Goiás Carla von Bentzen, o caso revela o quanto o despreparo do Judiciário contribui para o aumento no número de casos de violência doméstica.
Para Carla, decisões como esta demonstram a necessidade de contínua atualização daqueles vão atuar nos juizados de violência doméstica. "Isso é machismo. Os juízes que atuam nessas demandas precisam aplicar a lei e não fazer juízo de valor dos casos que lhe são submetidos", avalia a procuradora.
Ela acredita que tal desrespeito às mulheres em condições de violência doméstica é um desserviço social, uma vez que só contribui para as estatísticas alarmantes dos casos de violência contra a mulher. Nesse sentido, ela cita dados da Secretaria de Segurança Pública de Goiás que apontam um aumento de 82% nos números de feminicídios de 2016 para 2017.
Decisão inaceitável
Em nota, a seccional goiana da Ordem dos Advogados do Brasil repudiou a decisão, afirmando que ela é preconceituosa, sexista e misógina. "O direito à jurisdição e à resolução de conflito é um dos pilares do Estado Democrático de Direito e não deve ser tratado como um 'remerrão' por nenhum cidadão, muito menos por agente público responsável pela aplicação da lei", diz a OAB-GO.
A entidade prometeu apresentar reclamações no Tribunal de Justiça de Goiás e no Conselho Nacional de Justiça. "Salientamos que o poder público tem por obrigação garantir a proteção, a acolhida e o tratamento humanitário a todos os que forem vítimas de violência. Decisões como essa, que claramente buscam colocar a mulher em situação ridícula ou de vítima a responsável pelo ato de violência, são um desfavor à ordem pública e à administração da justiça", diz a entidade.
Veja a decisão:
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