Perto da data de “comemoração” dos 24 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sancionada por Fernando Collor, em 13 de julho de 1990, resta pertinente uma digressão crítica a respeito de sua curta historia, somada aos antecedentes históricos do direito do menor.
O Código de Menores (Lei 6.697/79) era a lei anterior ao Estatuto que estava destinada à proteção do menor. Quem discorrer a lei pela primeira vez se surpreenderá com o distanciamento com que o legislador define a proteção ao menor. Logo de início, quando do artigo 2º (da descrição das situações irregulares), mostra-se curioso o fato de literatura da época considerar a enumeração exauriente. Ou seja, só seria considerado em situação irregular o menor que se encaixasse em uma das situações dispostas nos seus seis incisos. Só seriam aplicadas as medidas e o rito do Código de Menores se houvesse total identificação entre o caso concreto e a lei. Desconsiderando, desta forma, as lacunas da lei, acabando por deixar os menores sem proteção da lei especial em inúmeras situações. Não existiam medidas preventivas, assim como não discorria sobre os direitos fundamentais dos menores.
Com a entrada em vigor do ECA foi adotada a doutrina da proteção integral, tendo como referência a proteção de todos os direitos infanto-juvenis advindos da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia- Geral das Nações Unidas, no dia 20/11/1989. O Brasil adotou o texto, em sua totalidade, pelo Decreto 99.710/90, após ser ratificado pelo Congresso Nacional.
As leis anteriores ao Estatuto ficavam restritas às sanções. No que corresponde aos direitos, resumiam-se à assistência religiosa. Já o ECA e a doutrina da proteção integral reafirmam o valor da criança enquanto pessoa; sua observância e reconhecimento enquanto ser em desenvolvimento; o valor da infância e da juventude e o reconhecimento de sua vulnerabilidade; o que torna o menor perecedor de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, o qual deve atuar através de políticas específicas para promoção de defesa de seus direitos.
A doutrina da proteção integral dos direitos supõe que o sistema garanta a realização das necessidades das crianças e adolescentes, tendo por prioridade as seguintes: direito à vida, à saúde, à educação, à convivência familiar e comunitária, ao lazer, ao esporte, à profissionalização, à liberdade, enfim, todos os direitos da pessoa humana (artigo 227 da CF). pela primeira vez na história constitucional brasileira, a criança é tratada com enfoque e elevada à questão pública.
A mudança mostra-se substancial, uma vez que a partir deste momento as crianças e adolescentes passaram a ser consideradas como pessoas em desenvolvimento e sujeitos de direitos, independente de sua condição social. A lei deverá respeitar essa condição especial, característica que difere este sujeito dos demais, que, até então, tinha direitos, mas mitigados pelo caráter assistencialista. Nessa perspectiva, criança e adolescente são os protagonistas de seus próprios direitos.
Em contramão de todas essas medidas que visam garantir a integralidade da proteção do menor, foi alterado o Estatuto pela Lei 12.962/2014 com o objetivo de facilitar a convivência com seu pai ou mãe preso. As alterações, bastante significativas são as seguintes:
A pessoa que ficar responsável pela criança ou adolescente deverá, periodicamente, levar esse menor para visitar a mãe ou o pai na unidade prisional ou centro de internação.
Em regra geral, a condenação criminal da pai ou da mãe não implicará na destituição do poder familiar. Exceção: haverá perda do poder familiar se a condenação foi por crime doloso, sujeito à pena de reclusão praticado contra o próprio filho ou filha (artigo 23, parágrafo 2º do ECA).
Por não ter vacatio legis, a lei se encontra em vigor desde a publicação (9 de abril de 2014). Ademais, por se tratar de norma processual, aplica-se a partir desta data nos processos em curso.
Alteração mais recente ao ECA está em andamento, uma vez que foi aprovada no Senado, no dia 4 de junho de 2014, a antiga Lei da Palmada que passou a ser nominada de Lei Menino Bernardo, que modifica o Estatuto no que tange a forma de educar. A lei proíbe agressão física, castigo violento, tratamento cruel ou degradante, como forma de corrigir ou disciplinar o menor. As sanções são aplicadas aos pais ou responsáveis, estendendo-se até mesmo ao agente que executa as medidas educativas.
Joana Faccini Salaverry é advogada da Caetano & Salaverry Assessoria Jurídica.
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