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sábado, 4 de fevereiro de 2012


No Irã, aqui, acolá: 

mulheres de costas pesadas

MARTHA MENDONÇA






Assisti esses dias a um filme muito bom, o iraniano A separação. A história já começa com o conflito entre Nader e sua esposa, Simin. Ela quer morar no exterior, onde acredita que sua filha adolescente poderá estudar melhor. Mas Nader não quer ir, porque dele depende seu pai, que sofre de Alzheimer em estágio já avançado. Como não chegam a um consenso, Simin vai para a casa dos pais. O problema é que era ela quem tomava conta de tudo, inclusive do sogro doente, enquanto o marido passava o dia no trabalho. Com a separação, Nader é obrigado a contratar uma acompanhante para tomar conta de seu pai. É quando começa a trabalhar na casa uma diarista grávida, sem o consentimento do marido – que não permitiria que ela passasse o dia na casa de um homem separado. Esses são só os primeiros dez minutos. O que se segue é um imbróglio incrível, que envolve ética, religião, diferenças culturais e a natureza humana (sim, tudo isso!). Não conto mais para não estragar o filme. Basta saber que é uma confusão de lascar, envolvendo cada um dos personagens.
O que quero falar aqui é de uma cena em que a filha do casal, adolescente, no olho do furacão, diz para a mãe:
-       A culpa de tudo isso é sua, por ter ido embora de casa.
Escrevi aqui há alguns meses um post sobre o quanto a coordenação da vida de uma família está nas costas das mulheres. Mesmo quando os homens participam das atividades da casa (e nem é tanto assim, segundo post recente da Ruth), pensar sobre cada detalhe é algo ainda muito feminino.
Em A Separação, fica evidente como, apesar de todas as diferenças culturais do Irã para o Ocidente, em todos os lugares é sobre a mulher que repousa a responsabilidade por tudo dar certo.
E não é algo imposto. Nós mesmas nos atribuímos essas responsabilidade. E sentimos culpa quando a deixamos, mesmo que momentaneamente, de lado.
O filme iraniano me lembrou a história de uma amiga: há alguns anos, ela viajou para um curso de três semanas na Argentina. Quando voltou, a empregada queria pedir demissão por se desentender com a sogra (que estava “tomando conta” da casa na sua ausência), o filho mais velho tinha recebido duas advertências por não ter feito o dever de casa e a filha mais nova já não ia à escola há uma semana porque estava com uma alergia alimentar braba – o pai havia esquecido que ela não podia comer frutos do mar. Lembro de ela me dizer: “Não dá. Agora curso, só pertinho e de, no máximo, três dias”.
Não adianta culpar só os homens. Há algum tempo entrevistei casais sobre a divisão das tarefas domésticas. Um deles me contou o seguinte: “Eu faço muita coisa, levo as crianças aqui e ali, arrumo as mochilas deles, etc. Mas ela sempre tem algo a reclamar. O problema é que não adianta só fazer. A gente tem que fazer do jeito delas”.
É um depoimento interessante, embora do lado de fora da história fique difícil dizer até que ponto é só uma questão de ponto de vista ou se ele realmente deixou de fazer o que precisava ser feito. De qualquer forma, seja por necessidade ou por “neura”, a quase totalidade das mulheres assume essa tarefa de gerente geral de tudo e todos. Com ou sem véu.


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