Agência Senado
Da Redação | 09/05/2018
Da Redação | 09/05/2018
Debatedores de audiência pública da Comissão Permanente Mista de Combate à Violência contra a Mulher (CMCVM) defenderam nesta quarta-feira (9) a adoção de exceções à guarda compartilhada obrigatória dos filhos, prevista em lei, em casos de violência doméstica. Os desafios e possibilidades do compartilhamento da guarda frente à violência doméstica foram tema do debate, sugerido pela relatora da comissão, deputada Luizianne Lins (PT-CE).
A divisão da custódia dos filhos de pais separados é regulamentada e definida como obrigatória pela Lei da Guarda Compartilhada (Lei 13.058, de 2014). Essa obrigatoriedade, contudo, é inconciliável em casos de violência doméstica, segundo a psicanalista clínica Ana Maria Iencarelli.
— Uma criança não pode se sentir bem e ter estabilidade emocional dentro do ambiente do agressor da mãe. É impossível essa conciliação, ou seja, a obrigatoriedade da guarda compartilhada em situação de litígio.
Para a psicanalista é “ilusório” pensar que a guarda compartilhada irá aproximar os cônjuges que estão em litígio. Ana Maria explicou ainda que a Organização dos Estados Americanos (OEA) recomenda que em casos de suspeita de abuso sexual ou violência doméstica não pode haver mediação ou conciliação.
— Como é que uma mãe que tem medida protetiva vai entregar o seu filho para o seu agressor? — questionou.
Ana Liési Thurler, doutora em Sociologia das Relações Sociais de Gênero e consultora em Direitos Humanos das Mulheres, pontuou que na maioria das vezes a violência contra a mulher é presenciada pelos filhos e, por isso, acaba sendo também uma violência contra as crianças e adolescentes. Para funcionar de forma adequada, a guarda compartilhada deve ser desejada pelas duas partes da relação e deve ainda passar por uma educação não sexista, segundo a socióloga.
— Eu acredito que deve haver a guarda compartilhada quando aquela família já tem um histórico de cuidados e responsabilidades compartilhados, quando ninguém precisa interferir e as próprias pessoas querem.
Visitação
Flávia Nascimento, coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, afirmou que a visitação prevista em um cenário de guarda compartilhada tem sido um grande ponto de vulnerabilidade para mulheres em situação de violência.
— Na prática, nós sabemos que os autores de violência usam a visitação para se aproximar das mulheres. O interesse [do homem] é realmente a criança ou é manter um vínculo com a mãe? — questionou.
O compartilhamento da guarda, segundo Flávia, gera uma insegurança jurídica quando existe, por exemplo, uma medida protetiva de afastamento. Ela informou, contudo, que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) tem entendido que as situações de conflito não impedem a aplicabilidade do compartilhamento.
— Se nós tratarmos isso [a violência doméstica] como um conflito estaremos minimizando a situação de violência, que é uma violação contra os direitos humanos da mulher — afirmou.
Para Flávia Nascimento, enquanto não houver uma previsão expressa na Lei da Guarda Compartilhada excepcionando os casos de violência doméstica, a legislação impedirá que a mulher rompa com o ciclo de violência a que é submetida.
Medidas protetivas
Dados de um estudo de 2015 sobre as medidas protetivas deferidas em casos de violência doméstica no estado do Rio de Janeiro foram apresentados por Flávia Nascimento. A pesquisa indicou que, apesar de previstas na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), as medidas de regulamentação de visitas e a pensão alimentícia provisória são encaminhadas para as varas de família.
Nos juizados familiares, segundo a pesquisa, estas medidas não são tratadas com urgência e passam por processos burocráticos. Além disso a mulher é obrigada a buscar por mais um serviço de atendimento.
Avaliação
Na segunda parte da reunião, o colegiado aprovou a realização de um seminário para discutir e avaliar a Lei Maria da Penha. Para a relatora da comissão, que sugeriu a realização do debate, embora um longo caminho já tenha sido percorrido até a sanção da lei, ainda é necessário muito mais para a transformação cultural de comportamento e respeito às mulheres e a ruptura com o machismo. Luizianne defende que é preciso avaliar a legislação, e, sobretudo, “reunir forças para garantir a efetividade dessa lei”.
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