Em termos de igualdade de gênero, a federação norueguesa, que já foi chefiada por uma mulher e tem uma ex-jogadora à frente de ambas as seleções, é exceção. Nos clubes e associações, imperam amplamente os homens.
14.06.2019
Ronny Blaschke
Karen Espelund passou muitas noites sem dormir. Ela desenvolveu ideias, temas, novas abordagens, mas muitas vezes se deparou com resistências. Mais de 30 anos atrás, ela foi a primeira mulher a integrar a diretoria da Federação Norueguesa de Futebol.
"Eu não queria ser a mascote dos homens", conta Espelund à DW. "Infelizmente as mulheres têm que provar constantemente sua competência nas diretorias. Você tem que trabalhar arduamente e ter a melhor preparação."
"Eu não queria ser a mascote dos homens", conta Espelund à DW. "Infelizmente as mulheres têm que provar constantemente sua competência nas diretorias. Você tem que trabalhar arduamente e ter a melhor preparação."
Espelund se impôs e, assim, deu visibilidade às mulheres. Em 1999, ela se tornou secretária-geral da Federação Norueguesa de Futebol. Entre 2012 e 2016, fez parte do Comitê Executivo da Uefa.
A norueguesa, porém, ainda é uma das poucas exceções. Segundo um estudo da rede internacional Futebol contra o Racismo na Europa (Fare), apenas 3,7% das posições de liderança no futebol europeu são ocupadas por mulheres.
Nos clubes da Bundesliga, na Federação Alemã de Futebol (DFB) e na Liga Alemã de Futebol (DFL), por exemplo, quase 250 pessoas têm assento nos conselhos de supervisão, administração e presidências: mais de 95% são homens.
Benefício das cotas
No final dos anos 1980, Karen Espelund se beneficiou de uma cota para mulheres na federação norueguesa. Nessa época, a diretoria deveria contar com pelo menos duas mulheres. Hoje, são quatro homens e quatro mulheres.
"Seja no recrutamento de empregados, concursos ou períodos eleitorais, muitas vezes procuramos pessoas que nos assemelham", diz Espelund. "Uma cota poderia romper com as estruturas tradicionais. A diversidade nos leva aos melhores resultados em qualquer organização."
Graças também a Espelund, a federação norueguesa está mais avançada do que outras organizações em termos de igualdade de gênero. A ex-jogadora Lise Klaveness é responsável por ambas as seleções nacionais do país.
Desde 2017, as jogadoras da seleção norueguesa recebem os mesmos salários que seus colegas homens. No entanto, o debate continua intenso: a craque Ada Hegerberg, por exemplo, lamentou "anos de discriminação" contra as jogadoras e, por isso, resolveu boicotar a Copa do Mundo de futebol feminino deste ano, na França.
Na maioria dos outros países, esse debate nem sequer teve lugar. Demorou muito tempo até que outras federações seguissem o modelo norueguês. A Fifa até diz que gostaria de ver pelo menos seis mulheres em seu comitê executivo. No entanto, está relutante em fazer exigências e recomendações às suas mais de 200 associações afiliadas.
A federação alemã tem apenas uma mulher na sua diretoria: Hannelore Ratzeburg é responsável pelo futebol feminino juvenil e adulto.
Devido à cota legal, a proporção de mulheres em cargos de liderança em empresas aumentou na Alemanha: para 44% na parte leste e para 27% na oeste do país. E no futebol?
No início de 2018, a advogada Eva-Maria Federhenn se candidatou à presidência do conselho de administração do FSV Mainz 05, time da primeira divisão da Bundesliga. Muitos fãs colocaram em xeque sua competência pelo fato de ela ser mulher.
Katharina Dahme, presidente do conselho de administração do clube SV Babelsberg, da quarta divisão, diz que tais declarações não são incomuns. Ela afirma que foi examinada de forma crítica em uma sala VIP por um funcionário do clube adversário.
"Eu disse que era membro do conselho de administração", afirma Dahme, sobre quando se encontrou com o funcionário. "A partir daí, ele ficou muito chocado e deixou claro que as mulheres não tinham nada a ver com futebol."
Nas quatro primeiras divisões alemãs, Katharina Dahme e Sandra Schwedler, do FC St. Pauli, são as únicas mulheres num conselho deliberativo de seu clube. As medidas para uma maior diversidade são raras: em 2016, a DFB e a Federação Alemã de Esportes Olímpicos lançaram o chamado "programa de liderança".
Nele, 24 mulheres foram familiarizadas com responsabilidades de cargos de liderança e, a partir daí, algumas das 21 federações nacionais de futebol desenvolveram seus próprios programas.
"Alguns clubes já se dão como satisfeitos por ter uma mulher na diretoria", conta Dahme. "Mas devíamos procurar mais candidatas. Muitas vezes as mulheres são céticas e precisam ser incentivadas de uma forma diferente. Por outro lado, os homens estão muitas vezes convencidos de que podem fazer as coisas."
Daphna Goldschmidt hesitou mais de três anos em se candidatar à diretoria do time Hapoel Katamon, de Jerusalém
Pioneira no futebol israelense
Desde setembro de 2018, a exposição itinerante "Fan.tastic femmes: football her story" chama a atenção para as mulheres que estão no mundo do futebol. As fotos e os curta-metragens retratam mais de 80 mulheres de 21 países, sejam elas torcedores, ativistas ou diretoras.
"O projeto leva a sério nossa paixão em todas as suas facetas", diz a israelense Daphna Goldschmidt, uma das retratadas e que possui uma rara biografia no futebol.
Ela foi uma das fundadoras de seu clube, em 2007. Assistiu a todos os jogos do Hapoel Katamon, de Jerusalém. Cantou, aplaudiu, pulou nas arquibancadas e se tornou uma das sócias mais influentes do clube. Mas hesitou durante mais de três anos em se candidatar à diretoria.
"A única coisa que me impediu foi o medo de não ser eleita e não ter sucesso", afirma Goldschmidt. Há um ano, ela foi eleita presidente do clube e se tornou a primeira mulher a dirigir um clube profissional em Israel. "Isso também pode abrir a porta para outras mulheres que não acreditam que tal caminho seja possível", frisa.
Nos últimos anos, a equipe subiu da quinta para a segunda divisão masculina, mas Goldschmidt prefere descrever os projetos sociais do clube: cursos de línguas para imigrantes e torneios para jovens judeus e muçulmanos.
Goldschmidt diz que as coisas nem sempre são fáceis – por exemplo, em reuniões com funcionários de outros clubes. "Ainda é estranho ser a única mulher numa sala de conferência", conta.
"Às vezes alguém me diz que só tomei esta ou aquela decisão porque sou mulher. Então eu respondo: você tem algum argumento que seja mais relevante?" A esse questionamento, ela não costuma receber resposta.
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