24 de setembro de 2015
Pesquisa do Instituto de Psicologia (IP) da USP acompanhou durante um ano alunos do 2º ao 5º ano do Ensino Fundamental de uma escola do interior paulista. O objetivo foi conhecer a dinâmica do comportamento antissocial numa instituição de ensino e a relação estabelecida entre esses alunos e membros do colégio, especialmente professores.
Em seu estudo de doutorado, a pedagoga Daniela Oyama utilizou como referência os conceitos do psicanalista Donald Woods Winnicott para traçar o perfil do comportamento antissocial dessas crianças, com o objetivo de possibilitar que a escola pudesse oferecer um ambiente mais favorecedor ao seu desenvolvimento. A pesquisa Comportamento antissocial na escola: Um estudo a partir da teoria de D. W. Winnicott foi orientada pela professora Maria Lucia Toledo Moraes Amiralian.
“Fiz o mestrado na Faculdade de Educação da Universidade de Campinas (Unicamp) e, durante a pesquisa na escola, me chamou a atenção a questão da violência dentro do ambiente escolar”, revela Daniela. Segundo a pesquisadora, os professores relatavam a violência presente no dia a dia da escola – agressões de alunos contra alunos, professores e funcionários – e fora dela, em seu convívio familiar. “Muitos dos professores, inclusive, também demonstravam medo de alguns pais de alunos”, relata.
Tendência antissocial
Segundo Daniela, o comportamento antissocial é a manifestação clínica da tendência antissocial. Ela explica que, de acordo com Winnicott, a tendência antissocial pode ser uma dificuldade inerente ao desenvolvimento emocional. As manifestações clínicas da tendência antissocial variam desde a gula até perversões, delinquência e, no extremo, a psicopatia. Muitas de suas manifestações nos estágios iniciais são tratadas com êxito pelos próprios pais.
Há sempre duas direções na tendência antissocial, mas uma delas pode ser predominante à outra: uma é tipicamente representada pelo furto associado à mentira e a outra, pela destrutividade. “Para Winnicott, na origem da tendência antissocial há uma ‘deprivação’ sofrida pela criança, a qual se refere à perda de um ambiente bom após uma boa experiência inicial, a perda de uma pessoa amada ou de um ambiente seguro.”
A pesquisadora relata que a criança deixa de se sentir livre e sua vida instintual torna-se inibida ou dissociada dos cuidados oferecidos a ela. Contudo, caso haja alguma chance de se encontrar novamente o ambiente seguro perdido, a criança passará a testar a confiabilidade do ambiente por meio de seu comportamento antissocial. “Portanto, seu comportamento é um sinal de esperança, um pedido de ajuda da criança”, completa.
Crianças deprivadas são inquietas e incapazes de brincar. A tendência antissocial pode ser uma dificuldade inerente ao desenvolvimento emocional e por isso suas manifestações podem estar presentes na escola. Daniela aponta que a escola pode minimizar tais comportamentos, mas precisa compreender sua origem e o pedido de ajuda da criança. Ela explica que, se o ambiente for estável, forte e seguro o suficiente, a criança poderá experimentar novamente seus impulsos, especialmente os agressivos.
Observação
Na pesquisa, a metodologia utilizada foi a clínico-qualitativa. Para realizar a pesquisa, durante um ano letivo, Daniela observou intervalos e aulas, verificou registros no Livro de Ocorrências de Alunos da escola e participou passivamente de reuniões de Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC). Além disso, a pesquisadora realizou entrevistas individuais e conversas informais com direção, professores, funcionários e pais ou responsáveis de alunos, fazendo encontros semanais com três alunos indicados pela escola os quais aparentavam ter comportamento antissocial.
O estudo permitiu à pesquisadora descrever a forma como um típico aluno com tendência antissocial cobrava que o ambiente suportasse seus impulsos agressivos e como estabelecia a relação com os adultos na escola, assim como a mudança em seu comportamento durante o ano, apesar de algumas pessoas não a notarem. Daniela conseguiu observar a melhora de outros alunos acompanhados na pesquisa e constatar como um bom ambiente proporcionado por seus professores pode gerar mudanças no comportamento dos alunos e, possibilitando que eles retomassem seu processo de desenvolvimento emocional.
“Instituições como a escola têm a chance de ajudar um aluno com tendência antissocial por meio do manejo do ambiente. A escola, como instituição, poderia proporcionar aos professores um espaço de aprofundamento e discussão sobre a teoria e sobre as dificuldades que eles enfrentam no relacionamento com seus alunos.”, completa. Daniela ressalva a importância de conversar e ouvir esses profissionais, acolher suas angústias e ajudá-los em suas dificuldades.
Marília Fuller / Agência USP de Notícias
Mais informações: email dani_oyama@yahoo.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário