Para além de escrever e tocar projetos especiais no PapodeHomem, eu sou membro do coletivo Balaio de Pais, em que eu e outro homens promovemos rodas de conversa, workshops e um podcast sobre paternidade. Eu sou pai socioafetivo do Francisco, que conheci com pouco mais de um ano de vida, e de quatro anos pra cá tenho aprendido continuamente com ele, com minha companheira e com esses e outros amigos sobre o que é ser pai.
Mas, definitivamente, a minha maior referência no tema é meu pai, Tarciso.
Durante muitos e muitos anos, vivemos às rusgas — ainda que silenciosamente. Apesar de uma admiração profunda, eu não concordava com muito da maneira dele ser e estar no mundo, e ele tampouco ficava satisfeito com minhas escolhas. Com o tempo, minha independência crescente e as voltas que o mundo dá, fomos nos afastando física (saí de Beagá e me mudei para São Paulo) e psicologicamente.
Durante muitos e muitos anos, vivemos às rusgas — ainda que silenciosamente. Apesar de uma admiração profunda, eu não concordava com muito da maneira dele ser e estar no mundo, e ele tampouco ficava satisfeito com minhas escolhas. Com o tempo, minha independência crescente e as voltas que o mundo dá, fomos nos afastando física (saí de Beagá e me mudei para São Paulo) e psicologicamente.
Eu sentia que tinha mais com que me preocupar, pouca energia para olhar para a nossa relação e estava confortável com o lugar de encontros e conversas fortuitas, que poderiam levar meses, ficar restritas a datas comemorativas e por aí vai. Eu não sabia, mas quando o Francisco entrou na minha vida, fiz inadvertidamente a escolha de trazer o meu pai de volta para ela também.
A cada decisão, plano, brincadeira, passeio, cuidado ou bronca que tive de dar, as minhas memórias como filho voltavam à tona, como se tivessem acontecido ontem. “Não lembro do meu pai brincar comigo, então quero dar essa lembrança pro Cisco”. “Será que é com um mero ‘não pode” que quero ensinar a ele que algo é errado?”. “Não lembro do meu pai falar eu te amo, então vou dizer todo dia até o Francisco cansar!”.
A linha guia da minha paternidade era, basicamente: se meu pai fez isso, vou fazer aquilo. Na minha cabeça, se não desse certo, no mínimo eu iria errar de forma diferente da que (eu julgava) ele havia errado.
Se ele falava de cima para baixo, eu abaixaria para olhar no olho do meu filho.
Se ele decidia limites unilateralmente, eu convidaria o Francisco a fazer escolhas controladas.
Se ele falava para parar de chorar, eu deveria dizer pode chorar, põe pra fora, papai tá aqui.
É engraçado como os fins e os começos se interligam.
Durante os 217 dias da internação final da minha mãe, aprendi em primeira mão sobre cuidado com alguém que, eu imaginaria anos antes, não seria capaz de fazê-lo. Junto com minhas tias, eu e meu pai nos revezamos em turnos durante meses a fio para não deixar minha mãe sozinha um momento sequer.
Quando eu ouvia de médicas e enfermeiras que aquela era a internação mais longa e a família mais amorosa e presente de que eles se lembravam, eu fui me dando conta de que o que antes eu julgava como falta de amor do meu pai, distância emocional ou seja-o-que-for, já era ele entregando tudo o que conseguia entregar. Como pai, como homem.
De alguma maneira, nesses anos todos, eu estava mais preocupado em apontar ou me preocupar com o que faltava, e não com o muito que eu tinha naquela relação. Bem mais do que ele, inclusive, cujo pai, o avô Vicente que não conheci, morreu quando ele tinha dois meses de idade.
É claro que as noções antigas do que era paternidade, baseadas muitas vezes apenas em prover e proteger, existem. É evidente, também, que com o que sei e sou hoje, pretendo entregar mais do que isso para meu filho.
Mas acho que, se tem uma coisa que aprendi com meu pai (a cada interação, que revejo com outro olhar hoje, ou no todo) e quero que meu filho tenha a chance de aprender comigo é bem simples: seja o melhor pai que você pode ser.
Isso vale para hoje, para ontem, no dia dos pais e nos outros 364 dias do resto dos anos que vocês tiverem a chance de passar juntos.
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