Na minha época de preparação para o vestibular, lembro-me de uma prova de redação que tinha a felicidade como tema. Naturalmente, a maior parte dos estudantes escreveu sobre a tristeza, como se a própria ideia de se manifestar artística ou politicamente sobre algo que não é exatamente um problema soasse estranho, ou, pelo menos, fora do comum.
A minha primeira reação diante de “Entre o Amor e a Paixão” (segundo filme de Sarah Polley) foi parecida com a destes vestibulandos. Eu rejeitei o filme pelo que, para mim, caracterizava uma falta de problemática. À primeira vista, detestei aquela protagonista que tinha tudo e cujo grande drama é a possibilidade de trocar uma vida perfeita por outra tão satisfatória quanto.
Essa sortuda detestável seria Margot (Michelle Williams), ela é casada com o doce Lou (Seth Rogen), eles vivem em um bairro bom, numa casa confortável e trabalham com aquilo que gostam. Ele escreve livros de receita, e ela de turismo. Além disso, Margot tem uma excelente relação com a família do marido e um forte laço de amizade com a irmã, Gerry (Sarah Silverman).
O abalo que provoca a trama é a entrada de Daniel (Luke Kirby) nessa valsa. Ele é um homem gentil e respeitoso, que demonstra estar interessado em Margot sem nunca exigir nada em troca ou insistir em uma resposta da moça. Ele está lá, claramente disponível para ela, mas sem nenhuma intenção de agir como vilão.
O incômodo foi aceitar (o que, de certa forma, sempre soube) que a felicidade pode também ser um espaço para a dor da angústia. Margot está consciente de que qualquer movimento em falso pode pôr tudo a perder. E este é o preço por viver no topo do mundo: o constante medo de se arriscar, o receio de sair da zona de conforto e nunca mais voltar.
De algum jeito, o roteiro de Polley consegue unir esta sensação de angústia na felicidade com a pluralidade de possibilidades da juventude, fazendo a complexidade dos sentimentos de Margot ganhar um satisfatório senso de realidade. Assim, “Entre o Amor e a Paixão” traz personagens comuns que costumam ser ignorados por contadores de histórias. Pessoas para quem o final feliz foi apenas o início, uma condição de existência, e que não aceitam encerrar o livro até que o último pingo de tinta esteja sobre o papel.
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