Oaxaca é o segundo Estado, além da capital, a permitir a interrupção voluntária da gestação até as 12 semanas
ELENA REINA
México - 26 SEP 2019
Oaxaca foi um exemplo para o México nesta quarta-feira. O Legislativo desse Estado do sul —um dos mais pobres e desiguais do país— aprovou a descriminalização do aborto. Sobrepondo-se aos gritos de “assassinos, assassinos!”, 24 dos 41 deputados manifestaram seu voto a favor dos direitos das mulheres. E o Estado se tornou a segunda unidade federativa mexicana, depois da capital, a permitir a livre interrupção da gravidez até as 12 semanas de gestação. Os legisladores preveem que a medida entre em vigor no próximo mês.
Mais de 9.000 mulheres se submetem a abortos clandestinos a cada ano em Oaxaca, conforme denunciaram nesta quarta-feira as deputadas do partido Morena (Movimento de Regeneração Nacional). Desde 2016, 20 mulheres foram encarceradas por esse crime, e as complicações decorrentes dos abortos ilegais são a terceira principal causa de morte entre as mulheres nesse Estado. Estes foram os argumentos das legisladoras que defenderam a medida na tribuna antes da votação. “Não conseguiremos deter o aborto se o proibirmos, senhorias”, insistiam.
Mais de 9.000 mulheres se submetem a abortos clandestinos a cada ano em Oaxaca, conforme denunciaram nesta quarta-feira as deputadas do partido Morena (Movimento de Regeneração Nacional). Desde 2016, 20 mulheres foram encarceradas por esse crime, e as complicações decorrentes dos abortos ilegais são a terceira principal causa de morte entre as mulheres nesse Estado. Estes foram os argumentos das legisladoras que defenderam a medida na tribuna antes da votação. “Não conseguiremos deter o aborto se o proibirmos, senhorias”, insistiam.
Os deputados de Oaxaca tinham duas votações históricas na pauta deste 25 de setembro: a primeira modificava o Código Penal do Estado para eliminar os crimes relacionados ao aborto voluntário, punido com seis meses a dois anos da prisão; a outra, que exigia uma maioria de dois terços, alterava o artigo 12 da Constituição local, que “protege e garante o direito à vida desde o momento da fecundação”. O Congresso Estadual só conseguiu aprovar a primeira. A reforma da Carta Magna foi adiada, perante um plenário enfurecido, dividido a gritos entre partidários e opositores.
A diretora da organização GIRE (Grupo de Informação em Reprodução Escolhida), Regina Tamés, conta por telefone que está “em choque”. “Depois que a capital aprovou, há 12 anos, houve muitas outras tentativas em legislativos locais, e todas fracassaram. E realmente não tínhamos muita esperança de que esta pudesse conseguir. Lançaram um sinal muito importante para o resto do país. Isto é imparável”, defendeu Tamés.
Neste momento, a reforma aprovada para o Código Penal de Oaxaca contradiz o que estipula a Constituição local. Os promotores da medida, deputados dos partidos Morena, Partido do Trabalho e Mulheres Independentes —esperam que a solução seja pela via judicial. Um recurso à Suprema Corte, que já estabeleceu jurisprudência a favor dos direitos das mulheres, pode abrir caminho para a medida. Porque de outra maneira, com os votos emitidos a favor nesta quarta-feira, a conta não fecha para reformar a Carta Magna, pois são necessários dois terços do total, ou seja, 28 deputados.
“Em todo caso, mesmo sem a Constituição do nosso lado por enquanto, Oaxaca deu um passo definitivo pelas mulheres deste Estado”, declarou orgulhosa a deputada Hilda Pérez Luis (Morena), em uma entrevista a este jornal. E afirmou que, daqui a duas semanas, nenhuma instituição pública de saúde poderá se negar a realizar um aborto voluntário dentro das 12 semanas de gestação, apesar do que diz a Constituição. Não será mais necessário, como até agora, que viajem à Cidade do México, que se arrisquem em clínicas clandestinas ou que só as que tenham recursos possam se permitir. “E anote isto, por favor: sem o movimento feminista de Oaxaca isto nunca teria sido possível. Hoje temos que estar eternamente gratas a elas”, insiste Pérez.
As deputadas do Morena, principais impulsionadoras da iniciativa, junto com os apoios do Partido do Trabalho e Mulheres Independentes, conseguiram um feito histórico nesta quarta-feira. Mas não foi fácil. Até uma hora antes do início da sessão, as parlamentares não tinham claro o que ocorreria na votação. Haviam conseguido convencer uma ampla maioria da bancada do Morena, mas havia alguns indecisos (contabilizavam uns quatro) que poderiam impedir o resultado.
Tinham claro que os opositores do PRI, PAN, Verde e Partido Encontro Social (de ultradireita) votariam contra. Mas sua luta esteve, desde o começo, no seio de seu próprio grupo parlamentar, o Morena. “Muitos pertencem a grupos religiosos e outros tinham medo de que isto influenciasse seu eleitorado em nível municipal”, dizia a deputada Pérez ao EL PAÍS horas antes da votação.
“Alguns achavam que eu não sabia como ia votar, porque não fiz proselitismo deste tema. Não quis comentar meu voto com ninguém. Mas tenho duas filhas e estive muito comprometido em sua educação sexual. E hoje votei por elas”, comentava, pouco depois do anúncio do resultado, o deputado Othón Cuevas, do Morena.
O partido liderado pelo presidente Andrés Manuel López Obrador, que arrasou nas urnas em julho do ano passado e mantém o poder nas duas câmaras em nível federal, mostra-se ambíguo em temas como o aborto e o casamento igualitário. Trata-se de um grupo político cujos fundadores se definiram de esquerda, mas que abriu suas listas a candidatos de todas as cores políticas, de evangélicos à ultradireita. E qualquer aspirante a “regenerar” o México e lutar contra a corrupção foi bem-vindo. As lutas ideológicas entre progressistas e conservadores dentro do mesmo grupo se produzem agora nos legislativos locais.
A senadora Citalli Hernández, do Morena, é muito crítica à contradição ideológica dentro do seu partido, mas observa que a Lei de Anistia anunciada na semana passada por López Obrador pode favorecer a aprovação de projetos desse tipo: “Um dos grupos beneficiados por esta medida é o das mulheres que estão na prisão por abortar, e os legisladores que votaram nesta quarta-feira sabem disso”.
“Temos que aprender com Oaxaca, com sua capacidade de luta, de resistência às pressões de grupos religiosos e de ultradireita. Hoje foram um exemplo para o México. E fica claro que afetará o debate nacional. E outros legislativos terão que entrar nisso, queiram ou não”, afirma, esperançada, a senadora Hernández. A diretora do GIRE, Regina Tamés, sentenciou: “Oaxaca é a amostra de que a Maré Verde está inundando o México”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário