Família influencia representação parental de homossexuais
Por Bruna Romão - bruna.romao.silva@usp.br
Por Bruna Romão - bruna.romao.silva@usp.br
A relação com as famílias, especialmente com os pais, é um fator de grande influência na constituição da identidade homossexual e da representação do exercício da parentalidade para casais homoafetivos masculinos. Em uma pesquisa do Instituto de Psicologia (IP) da USP, a psicóloga Brunella Carla Rodriguez investigou a representação psíquica dessas pessoas a respeito do que é ser pai, explorando seus relacionamentos com os pais e avós, e as motivações conscientes e inconscientes do desejo de ter filhos ou não tê-los. “Os discursos estavam sempre ligados à família de origem. Muito mais do que visando a parentalidade futura, eles ainda estão presos às questões ligadas às suas famílias de origem, aos seus pais”, conta a pesquisadora. “Isso acontece porque a elaboração do conflito identitário vivenciado por eles perpassa a aceitação familiar em primeiro lugar”, completa.
Foram realizadas entrevistas com cinco casais sem filhos, estando quatro deles juntos há menos de três anos e o outro há quinze. O assunto central das conversas, que duraram entre 2 e 3 horas e ocorreram nas casas dos casais, eram as relações familiares, sob o vértice da revelação da homossexualidade e dos conflitos familiares decorrentes.
A psicóloga também pedia para que eles desenhassem a família que gostariam de ter. “Assim poderia ser investigada melhor a representação daquela família idealizada e observar se eles se colocariam nesse desenho, se representariam como uma família homoparental”, explica Brunella.
Vínculos familiares
A psicóloga conta que todo o discurso dos casais a respeito da família estava permeado pelo tema da homossexualidade, mesmo nos momentos em que a entrevista não era dirigida a esta questão. “Começavam contando principalmente como foi se assumir dentro dessa família como homossexual. Os efeitos que isso teve e como afetou as relações dentro do grupo familiar”, diz. Entre as principais situações relatadas estão a dificuldade da família em aceitar sua sexualidade e o consequente sofrimento causado, por exemplo, pela recusa do convívio, muito comum no início da descoberta. Os desenhos também mostravam a forte ligação com as figuras das famílias de origem, incluídas na representação junto ao casal.
“A família é o primeiro espaço em que a pessoa constitui e pode praticar sua subjetividade, concebendo-se uma individualidade ou identidade”, diz Brunella. Para a estudiosa, essa forte ligação entre a representação da família e a homossexualidade se dá em função de esta relação ser algo que não foi psiquicamente bem elaborado. “Com a recusa da família a essa parte da identidade deles [a sexualidade], torna-se mais difícil e trabalhosa a elaboração da questão identitária individual”, explica. Ela continua: “A família, que é o primeiro grupo de que participam e que deveria ser um grupo de confiança, aceitação e acolhimento, acaba balançada. Com frequência eles não podem contar com essa rede de apoio”.
Despreparo para a parentalidade
Em geral, as representações parentais dos casais estavam tecidas por aspectos negativos, ou seja, aquilo que se configurou como falta, por exemplo, a pouca participação de um dos pais. Por isso, conta a psicóloga, “quando pensam na relação parental, é trazido um desejo de parentalidade reparatória, de poder ser um pai diferente dos pais que tiveram”.
Dessa maneira, frente às questões mal resolvidas com a própria família de origem, como a falta de aceitação, foi notado o despreparo desses homens para a vivência da parentalidade. Brunella relata que o desejo de adotar crianças é trazido à tona, porém não como um plano concreto ou discutido pelo casal. “A adoção permanece no plano da fantasia, porque eles ainda não estão preparados para exercer o papel de pais, pois ainda estão muito ocupados cuidando do que falta para si próprios: serem reaceitos nas suas famílias e poder elaborar psiquicamente suas identidades de forma íntegra”, explica. Com sua resolução identitária mal elaborada, eles ainda não conseguem deixar seu lugar como filhos para se tornarem pais.
Referenciais e arranjos familiares
Todavia, a pesquisadora chama a atenção para o fato de que a parentalidade talvez não tenha sido tão discutida por alguns casais em função especialmente da coabitação precoce. Justamente pela busca do apoio e fortalecimento não encontrado junto às famílias, casais homossexuais, ela explica, tem a tendência de se unirem e comprometerem em relacionamentos mais rapidamente que os casais heterossexuais.
Com o crescente aparecimento de novos arranjos familiares, diz a pesquisadora, se faz cada vez mais necessário que se repense as formas de relacionamento e a vivência dos papeis dentro das famílias. “É preciso olhar essa nova realidade de perto para permitir o exercício da parentalidade, que é tão importante na constituição das pessoas, de uma forma harmoniosa e saudável. E para que também possam ser oferecidas referências de uma nova forma de constituição familiar”, conclui.
Imagem: Wikimedia Commons
Mais informações: email brunellacarla@gmail.com, com Brunella Rodriguez
http://www.usp.br/agen/?p=131723
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