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sábado, 20 de outubro de 2018

Em Heliópolis, tecnologia será arma de meninas contra assédio sexual

Quatro jovens de 14 anos criam aplicativo com mapa para alertar mulheres sobre locais com assediadores 

Bela Megale
19/10/2018

Em tempos marcados por disseminação de fake news estimulando intolerância, agressões e polarização da sociedade, a mulher, por incrível que pareça, tem sido colocada mais uma vez à prova. Direitos, na minha opinião, básicos, como termos o mesmo salário que o dos homens e decidir sobre o nosso próprio corpo, inclusive quando o assunto é ter um filho fruto de um estupro, infelizmente estão mais ameaçados do que nunca. Mas no meio desse turbilhão me deparei com uma história que precisa ser compartilhada: o nascimento do “Rubi”, aplicativo desenvolvido por quatro meninas de 14 anos moradoras da favela Heliópolis, em São Paulo, para prevenir que mulheres sejam vítimas de assédio ou outro tipo de violência sexual.

A ideia desenvolvida pelas estudantes Heloisa Oliveira, Danielly Leite, Luana Rodrigues Lacera e Victória Araújo é simples. Se você, mulher, passar por uma rua ou em frente de um estabelecimento, ouvir aquele usual “gostosa”, “oh, lá casa” e se sentir incomodada, marque esse endereço no mapa da ferramenta alertando que ali há um assediador. A proposta é que as usuárias também denunciem tentativas de abuso ou agressão mais explícitas que vão além do insulto verbal. Com isso, quem tiver acesso ao “Rubi” estará alerta quando passar em determinado local diminuindo os riscos de sofrer um assédio ou até uma tentativa de abuso. A sinalização chegará no celular de quem chegar a 600 metros de proximidade de uma área de risco. Outro dispositivo é um botão do pânico que pode ser acionado quando a mulher se encontrar em perigo e que a colocará diretamente em contato com a polícia.

A preocupação de Heloisa, Danielly, Luana e Victória não é gratuita. A comunidade onde vivem, Heliópolis, é uma das maiores do Brasil, com 200 mil habitantes, e o 7º bairro em São Paulo no ranking de estupros da cidade, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública. No entanto, as meninas têm uma visão clara de que a violência sexual é um problema que vai além da região onde moram. "Não é um problema de classe social, é um problema da sociedade. O que acontece é que aqui os criminosos não são punidos como em bairros mais ricos”, disse Victória.

A criação do aplicativo surgiu com a entrada das meninas em um concurso de tecnologia. A proposta inicial era fazer uma ferramenta sobre recolhimento de óleo de cozinha, mas os gritos de “gostosa” e “delícia” ouvidos pelas quatro estudantes no caminho para o laboratório de informática para desenvolver o projeto mudou a rota.

“Tem um homem de um bar que assedia todas as mulheres que vê. Quando nós passamos na frente do local ele nos falou coisas que nos deixaram muito desconfortáveis. Chegamos no laboratório falando sobre isso. Uma vizinha minha escutou a conversa e disse que isso era normal. Mas não é! A gente não pode aceitar que seja! E daí começamos a criar o Rubi”, contou Heloísa.

Rubi, o aplicativo desenvolvido contra o assédio, por meninas de Heliópolis - Reprodução

Nos três meses em que desenvolveram o aplicativo, as estudantes colheram informações com mais de cem meninas entra 11 e 15 anos. Praticamente todas afirmaram ter sido alvos de algum tipo de assédio. “Fizemos uma pesquisa anônima, para as meninas escreverem o que passaram. Muitas tinham vergonha, amassavam o papel para nos entregar escondido. O problema é que a gente já cresce com esse pensamento machista de que a mulher é um objeto e fica com vergonha de denunciar, contestar”, argumentou Danielly.

O Rubi foi semifinalista no concurso de tecnologia, mas perdeu para um aplicativo de informação de animais perdidos. Heloísa, Danielly, Luana e Victória, porém, seguem na luta para colocar a ferramenta no ar com a ajuda da professora Andreia Drska, que apoiou as estudantes em todo o processo. Atualmente, elas trabalham no mapa do sistema, que começará restrito a Heliópolis. Para isso, elas têm contado com a ajuda de alunos egressos da mesma escola e que fazem curso técnico de informática. Eles estão cuidando da programação do Rubi.

O protótipo também foi apresentado a duas empresas privadas que mostraram interesse em investir na ideia, mas ainda não fecharam acordo. Hoje, o plano de Heloisa, Danielly, Luana e Victória é colocar o Rubi para funcionar até o fim deste ano. Para isso, elas seguem buscando pessoas que sonham grande, como elas. “Primeiro começaremos com Heliópolis, mas nossa meta é que o mundo tenha acesso”, disse Danielly.

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