15 fevereiro 2020
A fotografia de uma menina de 10 anos sentada com as pernas dobradas, vestindo uma saia justa e curta e tomando sorvete gerou forte controvérsia no Chile.
A imagem - publicada em diferentes partes do país como parte da campanha publicitária de uniformes escolares da marca chilena Monarch - foi questionada por "hipersexualizar" uma menina menor de idade.
O caso da Monarch não é isolado: em meio a um intenso debate nas redes sociais surgiram mais fotografias usadas em propagandas escolares de outras marcas, como Mota ou C/Moran, e que geraram discussões sobre uma possível erotização infantil no Chile.
Meninas expondo a roupa de baixo enquanto olham para a câmera com as mãos na cintura ou adolescentes que mostram as pernas em posições sensuais em propagandas de sapatos são algumas das imagens que ganharam o centro da polêmica.
"Não se deve tolerar"
Autoridades políticas e coletivos feministas apontaram que, em muitas situações, publicitários expõem as imagens das meninas como "objetos sexuais".
"As pessoas não devem ser retratadas como objetos sexuais e casos como esse estão no limite", disse a uma rádio local a ministra do Desenvolvimento Social e Familiar, Carol Bown.
"É impressionante que as empresas não tenham notado", acrescentou.
Por sua vez, a diretora da defensoria da infância do Chile, Patricia Muñoz, disse que esse tipo de publicidade "não deve ser tolerado" para garantir a proteção efetiva dos direitos das crianças e adolescentes envolvidos nas campanhas.
O órgão liderado por Muñoz enviou uma denúncia ao Conselho de Auto-Regulação e Ética em Publicidade contra as marcas envolvidas.
O debate também abriu as portas para a discussão sobre a eficácia da "auto-regulação" da indústria do marketing.
Para alguns, como a deputada Camila Vallejo, a aprovação de projetos para resguardar menores de idade seria cada vez mais importante.
"A indústria da publicidade e a mídia devem entender que o sexismo e a hipersexualização das crianças não são OK!", disse a deputada pelo Twitter,
A pressão sobre as marcas cresceu tanto nos últimos dias que a empresa Monarch anunciou que retirará a polêmica fotografia da garota de todas as suas lojas.
"De forma nenhuma, o objetivo desta imagem foi provocar o que foi interpretado e lamentamos o que aconteceu. Isso não representa nosso pensamento como empresa e, portanto, estamos tomando medidas imediatas nesse sentido, começando pela revisão dos protocolos com as agências envolvidas", disse a companhia.
O mesmo aconteceu com a empresa C / Moran, que pediu desculpas e removeu as fotografias que expunham meninas ou adolescentes.
"Pedofilia corporativa"
Para além da controvérsia no Chile, a que se refere especificamente o conceito de "hipersexualização infantil"? O que as marcas buscam com este recurso e quais podem ser suas consequências?
Nas últimas duas décadas, várias instituições em todo o mundo abordaram esse problema, tentando explicar como ele se tornou uma tendência comum em materiais de publicidade e marketing.
O conceito - definido como a sexualização de expressões, posturas e roupas para fazer uma criança parecer mais velha do que realmente é - também foi descrito como "pedofilia corporativa".
De acordo com a psicóloga infantil Susana Saravia, o que as marcas procuram é "transmitir um caráter sexual por meio de um comportamento, conduta ou atitude de uma criança que não seja adequado à sua idade, quando ela deveria estar brincando ou se divertindo com os amigos".
"Assim, as crianças são impostas a uma sexualidade adulta que é prejudicial, porque não estão preparadas nem física, nem emocionalmente para isso", disse Saravia à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
As consequências podem ser complexas, explica a psicóloga. Por exemplo, ao reforçar atributos físicos, as crianças podem desenvolver distúrbios alimentares, como anorexia e bulimia, ou insegurança.
"A mídia e as redes sociais há muito tempo transmitem um estereótipo de beleza associado ao físico, à magreza, e essas informações chegam aos adolescentes em um período em que estão passando por mudanças físicas muito importantes", diz ela.
No caso do Chile, a especialista diz que as mulheres são as mais afetadas.
"Estamos em uma sociedade que reforça o valor do físico principalmente nas mulheres: como elas devem fisicamente para que sejam bem-sucedidas. Parte disso está relacionado a estereótipos que estão sendo construídos socialmente", diz ela.
Susana Saravia acredita que seja necessário regular a publicidade. Para ela, oepisódio polêmico mostra que marcas "usam a imagem de garotas para vender, conquistar seguidores e atrair clientes" sem considerar os efeitos negativos que isso pode trazer para a população.
Nenhum comentário:
Postar um comentário