Na publicação, a ativista usou visual da marca norte-americana Pyer Moss. Ela concedeu entrevista à cineasta Ava DuVernay
Metrópoles
ILCA MARIA ESTEVÃO
28/08/2020
DEANA LAWSON/VANITY FAIR/DIVULGAÇÃO
Mulher, negra e ativista, Angela Davis é uma referência do movimento feminista, como também do marxismo. Integrante do grupo Panteras Negras, na década de 1970, ela foi presa injustamente. Ao longo dos anos, publicou inúmeros livros como filósofa. Uma das maiores referências de militância no combate ao racismo e na defesa dos direitos das mulheres, a norte-americana está na capa de edição especial da Vanity Fair. Na publicação, há uma entrevista concedida à cineasta Ava DuVernay.
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GIPHY/REPRODUÇÃO
Angela Davis estampa a revista de september issue, que costuma ser a mais relevante do ano. Na foto principal, a ativista usa visual da Pyer Moss. No look, a sobreposição foi feita com peça branca de detalhes vermelhos. Também conhecido pelo engajamento no movimento negro, o fundador da grife, Kerby Jean-Raymond, comemorou a novidade.
“Não tenho certeza do que está acontecendo agora ou como expressar em palavras o que sinto… Mas Angela Davis está usando Pyer Moss na capa da Vanity Fair de setembro de 2020. Fotografada por Deana Lawson. Palavras de Ava Duvernay. Essas frases nem parecem verdadeiras, cara”, escreveu o estilista.
Ava DuVernay, que teve a oportunidade de entrevistar virtualmente Davis, é uma premiada diretora e roteirista. Ela é reconhecida por produções marcantes e com importante papel social. Nos filmes, documentários e séries, sempre discute temas como o racismo e a violência policial. Entre os trabalhos, estão Olhos que Condenam, A 13ª Emenda, Uma Dobra no Tempo, Queen Sugar, Selma, e Esta é a Vida.
A cineasta também fez questão de compartilhar, nas redes sociais, a felicidade pela experiência com a filósofa abolicionista. “Eu amo aprender com ela. Encontro o inesperado sempre que nos falamos. Tesouros inesperados. Angela Davis emana, sem esforço, mais conhecimento do que a maioria das pessoas já adquiriu”, opinou. “E sua risada é suave, musical e adorável”, completou DuVernay.
Na entrevista, Angela Davis falou sobre a onda de reivindicações recentes, culminadas pelo assassinato de George Floyd, em meio à pandemia. Segundo ela, trata-se de uma conjuntura entre a crise da Covid-19 e a crescente consciência da natureza estrutural do racismo.
“Os protestos ofereceram às pessoas uma oportunidade de se unir a essa demanda coletiva de trazer mudanças profundas, mudanças radicais. De abolir o policiamento como o conhecemos agora. Esses são os mesmos argumentos que defendemos há tanto tempo sobre o sistema prisional e todo o sistema de justiça criminal. Foi como se todas essas décadas de trabalho de tantas pessoas, que não receberam nenhum crédito, tivessem se concretizado”, afirmou.
Em outro ponto do bate-papo, Ava DuVernay destacou que o posicionamento de Davis sempre incluiu classe, raça, gênero e sexualidade. “Parece que estamos em uma massa crítica em que a maioria das pessoas finalmente consegue ouvir e entender os conceitos dos quais você vem falando há décadas. Isso é satisfatório ou exaustivo depois de todo esse tempo?”, indagou a diretora.
Aos 76 anos, Davis vê a evolução como uma experiência coletiva. A norte-americana respondeu dizendo que o trabalho deve ser feito de forma contínua e apaixonada, mesmo que pareça momentaneamente que ninguém está ouvindo. Segundo ela, é preciso “criar as condições de possibilidade de mudança”.
A conversa também abordou o crescimento de pautas como diversidade e inclusão nas indústrias do entretenimento e da moda. Na visão de Davis, é necessário que haja modificações efetivas e precisamente radicais. “Eu sempre pergunto: ‘Bem, onde está a Justiça aqui?’. Você vai simplesmente pedir àqueles que foram marginalizados ou subjugados que entrem na instituição e participem do mesmo processo que levou precisamente à sua marginalização?”, analisou a entrevistada.
Para completar, a icônica militante comentou que enxerga a vida com otimismo. Ela lembrou que aprendeu essa perspectiva desde cedo, inserida em movimentos de luta. “Lembro que minha mãe nunca deixou de enfatizar que, por pior que fossem as coisas em nosso mundo segregado, a mudança era possível e o mundo mudaria. Aprendi a viver nessas circunstâncias e, ao mesmo tempo, habitar um mundo imaginário, reconhecendo que um dia as coisas seriam diferentes”, apontou.
“Temos que fazer o trabalho como se a mudança fosse possível e como se essa mudança acontecesse mais cedo ou mais tarde. Pode não ser; podemos não conseguir testemunhar isso. Mas se não fizermos o trabalho, ninguém jamais testemunhará”, concluiu Angela Davis.
Colaborou Rebeca Ligabue
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