Intolerância religiosa ameaça a paz mundial
por Pavol Stracansky, da IPS
Viena, Áustria, 28/2/2013 – Uma conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) destinada a promover a tolerância, a pluralidade e a inclusão mundial começou ontem com duras advertências sobre a ameaça que representa a intolerância religiosa e étnica. Também houve expressões pelo fato de muitos países continuarem adotando leis e práticas que restringem a liberdade de culto, marginalizando comunidades inteiras.
A Aliança de Civilizações das Nações Unidas (Unaoc), criada para promover o diálogo e o entendimento intercultural, inclui mais de 130 países e centenas de milhares de organizações não governamentais de todo o mundo. No V Fórum Mundial da Unaoc, que termina hoje na capital austríaca, líderes da ONU, incluindo seu secretário-geral, Ban Ki-moon, e o novo alto representante da Aliança, o catariano Nasser Abdulaziz Al-Nasser, alertaram para os riscos da intolerância e do extremismo.
“Vivemos em um mundo de xenofobia, conflitos e intolerância. Algumas sociedades veem a cultura como uma fonte de divisão em lugar de um caminho para a inclusão e a paz”, apontou Al Nasser. “Vemos uma perigosa intolerância religiosa. Em alguns países denigrem os símbolos religiosos e se queima literatura religiosa. Devemos trabalhar para prevenir isto e promover a paz e a tolerância”, acrescentou.
Outros participantes expressaram sua preocupação pelas leis aprovadas em muitos países, incluindo alguns com representantes na conferência, que vão contra os ideais da ONU. “O que se deve fazer é revisar o estado de direito em cada país da Unaoc para ver se está de acordo com as cartas de direitos humanos da ONU”, disse o presidente da Fundação do Chamado à Consciência, o rabino Arthur Schneier.
Líderes religiosos que participam do encontro se referiram à perseguição de cristãos no Oriente Médio e à violência contra muçulmanos em países ocidentais. Também falaram dos ataques documentados a templos, igrejas, mesquitas e sinagogas. E ainda alertaram para o grau de apoio à opressão religiosa por parte dos próprios Estados, tanto por meio de leis como de políticas.
Brian Grim, do Centro de Pesquisas Pew, disse que um terço dos países do mundo tem restrições altas ou muito altas à liberdade de culto, acrescentando que o Centro identificou uma fortíssima correlação entre certos tipos de ação de governo contra a liberdade religiosa e a hostilidade social. E essas restrições muitas vezes vão além de fronteiras, apontou, citando como exemplo o caso de um saudita que fugiu de seu país acusado de blasfêmia por uma opinião que colocou no Twitter. Foi detido na Malásia e extraditado para a Arábia Saudita.
Alguns Estados são bem conhecidos por suas repressivas leis religiosas. A Arábia Saudita talvez seja a nação com as normas mais rígidas sobre a observância do Islã. Nesse país se pune com a morte a blasfêmia e a conversão a outras confissões de fé. Também é proibida a observância de qualquer outra religião.
No entanto, restrições semelhantes, embora não tão severas, são aplicadas em muitos outros Estados. Na Malásia, autoproclamada como uma sociedade aberta e multicultural, a Constituição enfatiza a posição elevada da população malaia, a etnia majoritária do país, e estabelece que o Islã é a religião oficial. O governo designou policiais especiais para desestimular qualquer atividade religiosa que não seja muçulmana e para promover o Islã. Além disso, proíbe a construção de igrejas cristãs e templos de outras confissões.
Na Indonésia, a situação para as minorias talvez seja pior. Segundo o Instituto Wahid, apenas em 2011 houve 93 violações à liberdade religiosa instigadas pelo próprio governo, contra 64 no ano anterior, e há casos documentados de fechamento de templos e igrejas, bem como restrições à construção de casas de adoração de outras confissões.
O Cazaquistão, país que enviou representantes de alto nível à conferência em Viena, aprovou em 2011 uma lei que reduziu de 46 para 17 as religiões reconhecidas pelo Estado. A lei obriga todas as denominações religiosas e organizações de fé a se registrarem. Além disso, toda a literatura religiosa deve ser aprovada por um órgão estatal antes de ser distribuída.
Contudo, esses tipos de restrições não ocorrem apenas em países menos desenvolvidos ou predominantemente muçulmanos. A Suíça proibiu a construção de minaretes, e na Áustria, sede do fórum da Unaoc, se discute uma proibição semelhante em nível regional. Todos estes países são membros da Aliança e subscrevem seus ideais.
Apesar de tudo isto, vários dos presentes ao encontro destacaram que veem progressos em matéria de liberdade religiosa no mundo. “Embora muitos países tenham altos ou muito alto níveis de restrição religiosa, em três quartas partes do mundo houve casos de governos realizando ações para reduzir essas restrições”, relatou Grim.
No entanto, o rabino Schneier disse à IPS que “o fato de esses países terem aderido à Unaoc mostra que estão, ao menos em espírito, de acordo com o que defendemos. As coisas não podem mudar da noite para o dia. Trata-se de um processo. Unir-se à Unaoc é o primeiro passo. É a forma que um país tem de adotar os padrões da comunidade internacional”, acrescentou. Envolverde/IPS
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