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domingo, 22 de março de 2020

Sob o mesmo teto e sem sair: guia para superar a quarentena em casal

Conversamos com especialistas em psicologia para fazer com que o isolamento forçado não termine em separação. Primeira regra: respeito


EVA ABRIL

18 MAR 2020

Alguns dos efeitos colaterais do coronavírus e do isolamento decretado em alguns países para contê-lo levaram ao aumento (já quantificado) dos pedidos de divórcio na cidade chinesa de Xi’an. O impacto da doença e das medidas necessárias para impedir sua propagação são sentidos na sociedade e na economia, mas também em nossos relacionamentos. As medidas de emergência que vem resultando na permanência das pessoas em suas casas podem ter influência sobre o casal ―e sobre a família―, podendo significar o fim do relacionamento ou o início de um vínculo mais profundo, dependendo de como investimos esse tempo. Partindo sempre de uma situação em que nenhum dos membros do casal tenha o vírus, é isto que os especialistas recomendam fazer para inclinar a balança para o segundo cenário.

Preparação anímica
Insistimos, é imperativo seguir as instruções de higiene estabelecidas pelos especialistas em saúde. A partir daí, podemos falar sobre o cenário psicológico. Carme Sánchez Martín, psicóloga clínica e sexóloga do Instituto de Urologia e Serrate & Ribal, em Barcelona, ​​explica ao EL PAÍS que devemos assumir que provavelmente sentiremos sensações de estresse. Mesmo que não estejamos confinados nem infectados, a pandemia pode provocar ansiedade e neste link estão as instruções de vários psicólogos para atenuá-la. Sentir medo e incerteza em um contexto tão desconhecido quanto imprevisível é natural: tomando o país asiático novamente como exemplo, um estudo da Sociedade Chinesa de Psicologia descobriu em fevereiro que 42,6% dos cidadãos chineses tinham sintomas de ansiedade relacionados ao coronavírus, com indícios de depressão em 16,6% dos casos.

Relativizar as sensações

“A primeira coisa que eu recomendaria a qualquer pessoa nesta quarentena é ter duas coisas sempre em mente: isto tem um começo e um fim (o que nos for indicado pelas autoridades) e o objetivo é o bem para si mesmo e para a sociedade; é importante ter muito presentes as duas ideias sempre que nos sentirmos confinados ou angustiados”, diz Sánchez, que também é autora de El Sexo que Queremos las Mujeres. Insiste que é muito importante confiar nas autoridades e nas informações oficiais, e não dar atenção a boatos ou opiniões infundadas. “O medo, seja de contrair a doença ou de ter um desenlace ruim, é uma emoção que pode nos deixar mais desconfiados e em alerta, mas devemos racionalizar e lembrar que os infectados são uma minoria e que, entre os doentes, a imensa maioria consegue se curar.”

Examinarmo-nos sem projetar no outro

Leire Villaumbrales, psicóloga e diretora do centro Alcea, em Madri, também tem um lembrete sobre o medo que devemos levar em consideração: “Quando individualmente estamos travando importantes batalhas internas que supõem, como neste caso atual, lidar com nossa própria angústia, os medos despertados pela incerteza e a sensação de falta de controle, é difícil compartilhar algo diferente de demandas ou conflitos que falam do nosso desejo de que o outro faça algo que ajude a acalmar o que sentimos por dentro”. Em outras palavras, o bem-estar e a tranquilidade são coisas que devemos buscar em nós mesmos e não no outro. “Nesta situação, será importante”, prossegue Villaumbrales, “que individualmente dediquemos tempo para refletir, olhar para dentro, nos perguntar como estamos vivendo tudo isso e o que está despertando em nós. Se pudermos fazer esse exercício individual será mais fácil poder compartilhar com nossos parceiros a realidade do que está acontecendo conosco e, assim, nos sentiremos mais acompanhados”.

Enfoque positivo

Villaumbrales aconselha a tentar não se concentrar no sentimento de imposição e desamparo diante da ideia de não poder escolher: “É uma boa oportunidade para voltar a nos questionar sobre o que é realmente importante em nossa vida. Recuperar o essencial, o contato com as pessoas que amamos (neste caso virtual) e buscar dentro de nós os verdadeiros motivos pelos quais fazemos isso: a responsabilidade social, os valores humanos e comunitários”.

Educação e respeito radicais

É possível que o confinamento nos obrigue a ficarmos sozinhos, com o parceiro, os filhos, outros parentes e até com colegas de quarto. De qualquer forma, a receita é a mesma: “Só existe uma maneira de evitar os atritos, e é sendo extremamente educado. Temos que tentar mentalizar que não estamos com o parceiro ou com alguém que confiamos, mas com alguém com quem devemos ser muito respeitosos e educados, controlando nossas pequenas manias e sendo benevolentes com as da outra pessoa”, aponta Sánchez.

Rotinas essenciais

Se quisermos que nosso relacionamento (e nossa paz de espírito) não seja muito perturbado pela quarentena, alguma disciplina e organização são necessárias. “É muito recomendável estabelecer horários organizados e rotinas para dar sentido aos dias e evitar a sensação avassaladora de perda de tempo. Podemos aproveitá-lo de maneira positiva e produtiva, por exemplo, passando algumas horas organizando fotografias, lendo, fazendo um tutorial no YouTube...”, sugere Sánchez. Algo com que Leire Villaumbrales concorda: “Nos mantermos ocupados e estruturar nosso tempo sempre ajudará a ter uma maior sensação de segurança interna. Podemos resgatar leituras, séries pendentes, dedicar tempo ao cuidado de si ou adiantar trabalhos que normalmente deixamos de lado por falta de tempo”.

Velhos e novos conflitos

“A vida de casal será complicada nos próximos meses”, explica a diretora da Alcea Psicología, “porque quando passamos muito tempo juntos, assim como durante as férias, surgem problemas pendentes. Às vezes a reunião é muito positiva e agradecemos a oportunidade de passar um tempo que normalmente não temos. Outras vezes os assuntos pendentes podem abrir a porta para o conflito.” Diante de tal perspectiva, Sánchez Martín enfatiza sua receita: “educação e respeito extremos”.

Fazer equipe

Leire Villaumbrales nos lembra que, em situações extremas, “é fácil exigir que o parceiro faça algo que possa aliviar o mal-estar que estou sentindo e isso muitas vezes se manifesta em exigências do dia-a-dia aparentemente superficiais, mas que podem trazer grandes conflitos: ‘não deixe tudo jogado’, ‘não fale comigo nesse tom’, ‘cuide um pouco das crianças, tenho que trabalhar’, ‘não tive tempo para nada’...”. São atritos diários que se multiplicam em situação de isolamento. “Temos de lembrar que esse faça algo para que eu me sinta melhor muitas vezes não é possível, pois ambos estamos vivendo uma situação potencialmente difícil e devemos reservar um tempo para observar o que está acontecendo comigo em vez de culpar o parceiro e usá-lo como bode expiatório”. Esse pequeno exercício mental pode transformar o confinamento em uma espécie de terapia de casal: “Esta é uma oportunidade de fazermos equipe, de nos colocarmos do mesmo lado, de compartilhar como estamos nos sentindo com tudo isso e encontrar alguém ao lado que nos escute, que nos fale também de sua própria experiência e, finalmente, nos acompanhe”, conclui Villaumbrales.

Divertirmo-nos juntos

Carme Sánchez propõe uma grande variedade de atividades que podem ser realizadas em casal: “Aproveitar para cozinhar aqueles pratos que não temos tempo para fazer no dia a dia, assistir aos vídeos de Marie Kondo no YouTube e organizar a casa do zero (isso pode criar conflito, mas talvez seja o momento de fazer algo construtivo), tirar o pó do tapetinho (e da Wii Fit) para praticar ioga, alongamentos e outros exercícios em casa, resgatar jogos de tabuleiro, etc.”. Se houver crianças, todas essas sugestões podem incluí-las “e inclusive podemos jogar online com outros amigos confinados”. Villaumbrales também recomenda que, no caso de estarmos confinados com os filhos menores, “aproveitemos em família um tempo que normalmente não temos, por exemplo, observando mais nossos filhos, conversando sem tanta pressa, brincando e soltando a criatividade”. Apelar à esperança e à nostalgia, aproveitando a oportunidade para fazer um plano futuro (como uma viagem, uma reforma da casa...) ou rever juntos fotos também são atividades recomendadas pelos especialistas.

Tréguas em solidão

Por mais harmoniosa que esteja sendo a convivência (o que provavelmente não seja o caso), é imperativo fazer coisas separadamente. “Se o tamanho da casa permitir”, diz Carme Sánchez, “seria muito interessante passar um tempo sozinho e não ficar o tempo todo juntos”. Mesmo que o tamanho da casa não ajude, devemos desdramatizar o silêncio. “É muito importante deixar claro que os silêncios não precisam ser incômodos, essa coisa de que você sempre precisa estar fazendo coisas ou conversando com seu parceiro é uma pressão que devemos tirar de cima. Não acontece nada porque um está fazendo uma coisa e o outro, outra (e não apenas durante a quarentena). Vocês podem estar tranquilamente abstraídos em assuntos diferentes e isso não significa que alguém esteja falando com uma terceira pessoa ou que tenha perdido o interesse.” Durante essas pausas para si mesmo, acrescenta a psicóloga, “pode ser uma boa ideia limpar a mente da crispação causada pela situação ou pela atitude do nosso parceiro, por exemplo, praticando o relaxamento progressivo de Jacobson por cerca de vinte minutos ou exercitando a respiração abdominal ou diafragmática durante cinco minutos, especialmente quando estamos prestes a perder a paciência”.

Existe vida lá fora

As novas tecnologias, tão frequentemente vilipendiadas, podem nos ajudar nessa quarentena: WhatsApp, Skype, Facetime, etc. servirão para que nos comuniquemos com outras pessoas e evitemos a sensação de isolamento. “Seria aconselhável fazer videochamadas com pessoas de que gostamos e compartilhar a experiência com elas”, explica Villaumbrales. “É muito importante não experimentarmos isso sozinhos”.

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