Apesar de previsto tanto pela Lei Maria da Penha quanto por convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, o atendimento integral às mulheres em situação de violência ainda é um desafio a superar. Essa lacuna impõe às vítimas a chamada ‘rota crítica’ – o caminho fragmentado que a mulher percorre buscando o atendimento do Estado, arcando com as dificuldades estruturais colocadas, como de transporte, repetindo o relato da violência sofrida reiteradas vezes e, ainda, enfrentando muitas vezes a violência institucional por parte de profissionais que, pouco sensibilizados, reproduzem discriminações contra as mulheres nos serviços de atendimento (ver quadro).
Essa rota fragmentada é o inverso do preconizado pelos marcos legais e do recomendado por especialistas do campo dos direitos das mulheres, uma vez que cabe ao Estado acolher e apoiar a mulher no complexo processo de rompimento com o ciclo de violência, frequentemente marcado por obstáculos como a dependência financeira do agressor e as dificuldades afetivas peculiares nos casos em que a agressão acontece em relações íntimas e familiares.
“O primeiro obstáculo com o qual a mulher vítima de violência se depara diz respeito a ela mesma, que deve enfrentar a cultura patriarcal em que vive e que preconiza a superioridade do homem e a passividade e obediência da mulher e que, em muitos casos, ainda está introjetada na vítima, limitando sua reação. São esses padrões culturais que, inclusive, invertem os papéis, fazendo com que ela se sinta culpada pelas agressões que sofre, como se merecesse”, explica a coordenadora executiva da organização Cepia – Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação, Jacqueline Pitanguy.
Como superar?
De acordo com a advogada Maria Amélia de Almeida Teles – Amelinha, como é conhecida há décadas no movimento de mulheres –, a rota critica permanece porque ainda faltam serviços com profissionais capacitados e que representem uma porta aberta à mulher em situação de violência.
“Ter uma porta aberta que vai receber essa mulher é fundamental para impedir que ela continue na violência. Então, é preciso que haja uma escuta, é preciso ouvir essa mulher, orientá-la sobre seus direitos e sobre as possibilidades para sair dessa situação e oferecer alternativas, como uma casa abrigo, uma Defensoria Pública, um serviço de saúde que vai oferecer um tratamento psicológico”, exemplifica.
Amelinha também recomenda a promoção do debate como forma de impedir a reprodução desta violência socialmente. “Precisamos dar muita ênfase às medidas preventivas, como a capacitação de profissionais, mas também campanhas junto à sociedade, à mídia, a todos os órgãos do Poder Judiciário e do Sistema de Segurança Pública, para discutir o que significa a violência contra as mulheres, para que a sociedade possa de fato aprofundar a democracia”, frisa.
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