A cineasta Sandra Werneck lança no dia 5 de maio, no canal pago Curta!, o documentário Mexeu com Uma, Mexeu com Todas, que também faz parte da 22ª edição do Festival de Documentários É Tudo Verdade, aberto em São Paulo e no Rio entre 19 e 30 de abril. O filme debate a violência contra a mulher e tem o mesmo título do slogan da campanha realizada por funcionárias da Rede Globo após a denúncia de assédio da figurinista Susllem Tonani contra o galã José Mayer. Em entrevista a VEJA, a diretora explica ter sido uma coincidência — mas não mera coincidência: uma confluência que mostra como esse tema, felizmente, vem ganhando destaque na sociedade. “O mundo inteiro está lidando com essa questão do feminismo. Eu acho que o assédio e a violência doméstica, que antigamente eram escondidos pela família, sociedade, poder público, agora não são mais, as pessoas são realmente punidas.”
O documentário traz uma sequência de relatos de vítimas de agressão, abuso e assédio sexual. Entre elas, a farmacêutica Maria da Penha – é ela quem empresta o nome à lei de 2006 que criminaliza a violência contra a mulher –; a nadadora Joanna Maranhão, que deu nome à lei de 2012 que mudou o prazo de prescrição nos crimes contra dignidade sexual praticados contra crianças e adolescentes; a ex-modelo Luiza Brunet, que acusa o ex-parceiro Lírio Parisotto de agressão, e a escritora Clara Averbuck, abusada na adolescência. “Acho que ele ajuda a conscientizar muitas mulheres que têm medo porque acham que vão sofrer retaliações. Pode dar uma força para elas”, diz Sandra.
Confira abaixo a entrevista completa com Sandra Werneck:
Como o título do seu documentário se tornou o slogan da campanha das funcionárias da Globo contra o assédio? Não sei como aconteceu isso. Eu tinha escolhido o título do documentário em outubro do ano passado, quando vi a frase em um cartaz durante uma manifestação. Ao mesmo tempo em que fiquei indignada com a história do José Mayer, não posso dizer que não tenha servido de publicidade para o filme.
Você conhece pessoalmente o José Mayer? Ficou surpresa com o caso? Não conheço. Não sei de nada da vida íntima dele, só que ele era casado. A gente vive ainda em uma cultura tão machista, e as pessoas que têm um pouco mais de poder, que transitam por lugares como a Globo e outras emissoras, acham que podem tudo.
Você já foi vítima de assédio no seu trabalho? Não, porque profissionalmente eu sou muito séria e sempre coloco um limite, então as pessoas me respeitam. Nunca aconteceu isso comigo, ainda bem. Mas aconteceu com a minha filha. Ela tinha cinco anos de idade, estávamos em Búzios. Ela estava com dois amiguinhos, e eles sumiram e voltaram apavorados porque um dos meninos tinha machucado o pé e um pescador os tinha levado para casa para botar remédio. O pescador começou a passar a mão nela, mas ela conseguiu dizer que o pai estava chegando e fugiu. A gente não fez nada na época por medo.
Acredita que agora o assédio se tornará uma pauta de discussão nacional ou essa é apenas uma comoção momentânea por envolver nomes famosos? O mundo inteiro está lidando com essa questão do feminismo. A mulher ficou durante anos naquele papel submisso, e isso não trazia problemas para os homens. Mas a mulher mudou e os problemas começaram a surgir, porque ela diz não, e o marido a espanca. Quando falo homens, digo os machistas, os conservadores, não estou generalizando. Você fica pisando em ovos, porque nunca sabe o que pode deixá-lo irritado, nervoso, agressivo, fazê-lo te responder de uma forma que acabe com a sua auto-estima.
Tivemos três casos de assédio e agressão simultâneos: o caso José Mayer, o caso Victor Chaves e o caso Marcos Härter. Isso indica que evoluímos por denunciar? Eu acho que agora a questão do assédio e violência doméstica, que antigamente eram escondidas pela família, sociedade, poder público, agora não é mais, as pessoas são realmente punidas. Por exemplo, o José Mayer foi punido pela Globo. O BBB eu não vejo, não sei o que aconteceu com ele, o Victor eu também não sei. Hoje, existe todo um movimento principalmente de jovens que estão se dando conta de que não podem conviver com esse homem que acha que a mulher tem que ser uma gueixa. As mulheres estão ficando mais independentes. Isso cria muito problema para esses homens. No meu filme, eu vi relato de um cara que prendia a mulher dentro de casa.
Quanto o Brasil ainda precisa avançar nesse tema? Muito. Mas eu acho que a Lei Maria da Penha é um grande avanço. A lei Joanna Maranhão, em que você pode ser assediada aos nove anos e só relatar aos 18 é outro avanço. Eu acho que essa nova geração tem tanta consciência disso, e é ela que tem força para mudar essas questões. Ao meu ver, a única maneira de realmente resolver esse problema é fazer como no resto do mundo, você ter aulas de educação sexual, na escola, como uma matéria.
Como você acha que o seu documentário ajuda na discussão? Acho que ele ajuda a conscientizar muitas mulheres, que têm medo, porque acham que vão sofrer retaliações, que o marido pode fazer alguma coisa com os filhos. Pode dar uma força para elas.
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