13/04/2017
Crianças do grupo muçulmano rohingya têm chegado a Bangladesh desde outubro do ano passado fugindo da violência em Rakhine, norte de Mianmar. Estima-se que mais de 70 mil pessoas tenham sido forçadas a fugir do país nos últimos cinco meses. Dessas, acredita-se que mais da metade seja menor de 18 anos.
A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) tem mobilizado grupos de apoio comunitários incluindo mulheres e jovens em campos de refugiados para atender essas crianças em situação de vulnerabilidade.
Assim como outras crianças, Asif e Suleman* deveriam brincar, correr e dar trabalho aos seus pais. Mas em vez disso, os jovens irmãos estão sentados como se fossem estátuas, olhando fixamente para o nada e sem perspectivas. Suleman tem 12 anos e Asif, 8, mas eles parecem muito mais novos do que seus colegas.
Nas últimas semanas, a rotina deles tem sido frequentar a escola religiosa e ter aulas particulares de inglês. Eles não brincam e dormem muito pouco. “Eu sonho com crianças brincando felizes”, disse Suleman. “Mas nos meus sonhos, eu nunca posso brincar com elas. Estou sempre com medo. Se alguma coisa cai no chão, ou ouço um barulho repentino, levo um susto e imediatamente me lembro de tudo que aconteceu”.
Os meninos estão entre as inúmeras e aflitas crianças do grupo muçulmano rohingya que têm chegado a Bangladesh desde outubro do ano passado quando a violência em Rakhine, norte de Mianmar, os separou de suas famílias. Estima-se que mais de 70 mil pessoas tenham sido forçadas a fugir para Bangladesh nos últimos cinco meses. Dessas, acredita-se que mais da metade seja menor de 18 anos.
Suleman e Asif estavam brincando em seu quintal quando a casa deles foi invadida. Correram, mas não conseguiram salvar o irmão caçula que estava na frente da casa. Eles acreditam que seus pais foram mortos a tiros durante o ataque, e não sabem se o irmão conseguiu sobreviver.
As crianças conseguiram fugir com alguns vizinhos e chegaram à casa do tio Mustafa, em Bangladesh, que já havia fugido em outubro com sua família. Atualmente, vivem em um abrigo improvisado e têm recebido alimentos e suprimentos de emergência.
Além de suas necessidades imediatas, esses meninos também precisarão de aconselhamento psicossocial para ajudá-los a superar a perda dos pais e a violência que testemunharam.
Nos campos de refugiados de Kutupalong e Nayapara, foram estabelecidas áreas recreativas para diversas idades com o objetivo de amenizar as dificuldades psicológicas.
“Brincar é fundamental para que todas as crianças consigam construir uma base para a aprendizagem, mas é ainda mais importante para crianças refugiadas devido à função terapêutica que as atividades proporcionam”, afirmou Marzia Dalto, oficial de proteção do ACNUR em Cox Bazar, Bangladesh.
“Quando conduzidas de forma apropriada, brincadeiras seguras e lúdicas podem ajudar a reduzir o estresse e a otimizar o desenvolvimento cerebral. Isso pode oferecer oportunidade de cura para os traumas infantis e oferecer esperança para interromper o ciclo de violência física e emocional”.
Para alguns, brincar pode ser considerado um luxo. Kamal*, de 12 anos, perdeu seus pais durante os atos de violência em Mianmar. Sem recurso algum, ele e suas três irmãs mais velhas fugiram para Bangladesh em novembro. Elas precisaram pedir 80.000 kyat (60 dólares) emprestados a um vizinho para atravessar o rio Naf de barco.
Em Bangladesh, eles foram encontrados por uma refugiada rohingya, Noor Kaida, que decidiu acolhê-los apesar de já ter quatro filhos.
“Encontrei essas crianças chorando em um cemitério aqui perto”, disse Noor Kaida, 27 anos, que quando ainda era um bebê fugiu de Mianmar com os seus pais. “Eu os acolhi porque eles não têm nada e nem ninguém. Eles estão tão vulneráveis que me sinto moralmente responsável por eles”.
Sendo o único menino, Kamal se voluntariou para trabalhar em uma loja de chá na cidade. Por isso, ele raramente volta ao abrigo.
Talifa*, sua irmã mais velha de 18 anos, está sempre preocupada. “Eles ainda são muito jovens. Como iremos encontrar comida e roupas, como sobreviveremos? Ainda temos uma dívida com o nosso vizinho pela passagem do barco. Ele vive nos cobrando e eu já disse que farei de tudo para pagá-lo de volta”. Noor Kaida já disse que os abrigará o tempo que for possível. “Até que tenham seu próprio lar ou que se casem”.
Apesar das boas intenções, a presença de tantos menores desacompanhados traz à tona diversas questões de proteção em torno do risco do trabalho infantil, casamento precoce, tráfico e exploração sexual.
A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) tem mobilizado grupos de apoio comunitários incluindo mulheres e jovens em campos de refugiados para atender essas crianças em situação de vulnerabilidade.
A agência também está trabalhando com parceiros para tentar encontrar os membros da família sempre que possível, e também oferecer as melhores condições para aqueles que não tem familiares vivos. As opções vão desde de promover o rastreamento e a reunião familiar com parentes próximos, até indicar tutores ou famílias de acolhimento que possam oferecer cuidados e orientações.
“Frequentemente penso nos meus pais”, disse Talifa. “Dentro de nós existe uma dor enorme, mas precisamos saber lidar com ela”.
*Nomes alterados por motivos de proteção.
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