Como evitar que a Escola Estadual Prof Helena Lombardi Braga reproduza o roteiro de “13 reasons why”?
publicado 17/04/2017 por NANA QUEIROZ
“Já tava no chão. Agora com essa, quero morrer”. Esse foi o desabafo de uma adolescente da Escola Estadual Professora Helena Lombardi Braga, de São Paulo, a uma amiga no Whatsapp na semana passada. Os acontecimentos que a levaram até a declaração se assemelham ao roteiro da série “13 Reasons Why”, popular no Netflix, que aborda o suicídio de uma adolescente após meses de bullying machista nos corredores da escola.
Entre os alunos do segundo ano do Ensino Médio da instituição de ensino, tornou-se hábito há algumas semanas eleger, em vídeos viralizados via Whatsapp, as “vagabundas”, “putas” e os “broxas” da vez. “Minha amiga tem muitos problemas em casa e está mal de verdade. Nós a apoiamos e aconselhamos”, desabafa, preocupada, T.*, a confidente. E completa:
“Este vídeo é machista porque ninguém tem nada a ver com o que a pessoa faz ou não em sua vida sexual. É como se as meninas não tivessem que fazer sexo e os meninos tivessem a obrigação!”
T. também entrou para a seleção como uma menina que “não pode ver macho”. Chorou bastante, mas sentiu-se confiante para compartilhar com os pais o incômodo. Os dois foram à direção da escola prestar queixa, mas lá alegam ter ouvido, da diretora Fabiana Cabral, que a escola não podia fazer nada e “sua filha deveria escolher melhor as amizades que tem nas redes sociais”. Sem saber para onde ir, eles buscaram a Revista AzMina para denunciar o caso.
“Minha filha ficou muito preocupada e não queria mais ir à escola. No dia seguinte, eu e meu marido conversamos muito com ela, porque isso não é normal!”, desabafa a mãe de T. Segundo os adolescentes entrevistados, ninguém sabe ao certo quem é o autor ou autora dos vídeos. Seu conteúdo, porém, foi bastante comentado nos corredores e T. afirma que havia algumas pessoas apontando e falando dela nos intervalos.
A diretora Fabiana disse que que em nenhum momento responsabilizou os pais pelo fato, mas os orientou quanto ao uso das redes sociais e da exposição que pode tornar os jovens vulneráveis a estes casos. Afirmou que os professores de sociologia e filosofia já foram informados sobre o acontecimento e tratariam do assunto com os alunos em seu projeto contra o bullying. E acrescentou que a escola já desenvolve, há cerca de um ano, um projeto pedagógico interdisciplinar sobre a intolerância, que culmina com seminários e exposições feitos pelos alunos no mês de novembro.
Para a educadora Milena Carasso, responsabilizar somente os pais pelo que os estudantes fazem nas redes sociais seria um erro da escola. “Não é justificativa dizer que é algo do âmbito privado porque foi a escola quem uniu esses indivíduos”, defende. “O Whatsapp, assim como as redondezas físicas da escola, são uma extensão de seu espaço. E é também de sua responsabilidade – ainda que parcial – o que se passa neles. Dentro da escola, no dia seguinte e depois, vão estar reunidas essas pessoas, assim como as consequências do que foi dito e feito nas redes.”
Mas o que deveria ser feito?
Alguns pais de estudantes chegaram a cogitar fazer uma queixa oficial na polícia. Doutorando em Educação da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, Priscilla Ramalho acredita que seria muito mais produtiva uma abordagem educativa.
“O primeiro ponto a ser trabalhado na escola é entender que isso que aconteceu é, sim, currículo escolar”, defende. “Hoje em dia, os principais teóricos da educação trabalham com a ideia de que currículo não é apenas o plano de estudos mas, sim, tudo o que ocorre no recreio, na saída. Não tem como separar o que acontece na sala de aula e fora dela porque os estudantes não separam isso na cabeça deles.”
Ela acredita que um trabalho escolar pedindo que os alunos pesquisem mulheres e homens que admiram em sua comunidade e por quê, seguido de um debate guiado por um educador, pode trazer boas reflexões sobre o que os adolescentes entendem dos papéis de gênero.
“Se a escola se ausentar deste tema, estará reproduzindo uma cultura opressora que coloca determinados papéis para as mulheres e outros para os homens”, diz.
A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo afirmou, através de sua assessoria de imprensa, que apoia as atitudes tomadas pela direção da escola junto aos professores de filosofia e sociologia. Acrescentou que a prevenção ao bullying exige várias frentes de atuação, incluindo a participação dos pais, da comunidade e da polícia.
“Mesmo em episódios que ocorrem fora do ambiente escolar, como o caso mencionado pela reportagem, a Pasta trabalha de forma a conscientizar os alunos sobre temas atuais e de vivência dos adolescentes como violência e sexualidade, além de cyberbullying e uso das redes sociais. Uma das ferramentas é o projeto Prevenção Também se Ensina. A Secretaria também possui um Núcleo de Inclusão Educacional (NINC) que trata de temáticas educacionais para diversidade de gênero e mantém uma parceria com a OAB São Paulo para utilização do Guia de Prevenção ao Bullying, uma cartilha que sugere ações específicas em sala de aula para combater a prática tão comum na sociedade, contendo inclusive a legislação vigente”, disse, ainda, através de nota.
Após a publicação desta reportagem, a secretaria voltou a entrar em contato com a Revista AzMina e afirmou que ainda nesta semana a diretora se reunirá com o grêmio estudantil para criar um plano de ação e um trabalho de conscientização proposto pelos próprios alunos sobre esses temas.
* Os nomes foram omitidos para evitar que as adolescentes pudessem ser identificadas.
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