por Fernanda Morena — publicado 24/06/2015
No ativismo digital de Monique Prada, prostituição e feminismo caminham juntos pelo direito da mulher à sexualidadeMonique Prada não é uma mulher comum. A forte personalidade, com fala pausada e ponderada, é comparável apenas à marcante presença online em seus perfis nas redes sociais. Entre suas grandes ousadias, está o fato de ser uma mulher que ousa ser feminista, sexuada e inteligente ao mesmo tempo.
Para todos os casos, não poupa palavras – escritas, na maioria das vezes. Monique é prostituta e divide seu tempo entre o trabalho que lhe provém sustento e a atuação como feminista que extrapola a esfera virtual. Se todo ato é político, ela leva a máxima a todos os lugares, até para a cama. "Mesmo quando estou entrando em um trabalho, tenho a liberdade de falar alguma coisa graças à internet do telefone. Não é que eu fique parada num escritório fazendo o meu ativismo, estou na rua, em qualquer lugar”, conta.
Numa tarde de feriado fria e cinza na capital gaúcha, Monique aparece para um encontro com a reportagem em que falará da batalha pelos direitos das prostitutas e pelos das mulheres. Vive e fala sobre prostituição, ativismo e feminismo, intensa e furiosamente, o que, às vezes, não deixa de lhe trazer contratempos.
“A partir do momento em que tu começa a falar, o teu trabalho começa a dar uma despencada”, revela, ponderando que já deve ter perdido alguns clientes. “Não é uma interação que se espere de uma prostituta, que tenha opinião e que, eventualmente, essa opinião entre em conflito com a tua. Não é conveniente, mas eu já tenho uma lista de clientes bem antiga, então não chega a me prejudicar gravemente”, afirma Monique, que é prostituta desde os 19 anos e ativista há cinco.
Acontece de, é claro, ela deixar a cama de alguém em função de algum tópico sensível. Outras vezes, deixa a política pra lá: “Conversamos muto o tempo todo [online], então, quando encontro com eles, prefiro o sexo”. Acontece ainda de ser procurada justamente por seus posicionamentos. “Um cliente me seguia no Twitter e começou a me chamar pra sair, como se fosse pra me convencer de que o que ele fez foi uma coisa boa”, lembra ao falar de um militar que participou da ditadura no Brasil.
Monique defende os direitos das minorias e não recusa trabalho por conta de visões reacionárias. “Mas não escreveria para um portal de direita”, garante a coeditora do Mundo Invisível, um site que trata de temas LGBT, feministas, da prostituição e de direitos de cada um dos grupos. Com a tradução também de artigos publicados no exterior, o portal ajuda a expandir a educação sobre o tema.
Com base na premissa, ela mantém uma carta de clientes de longa data, numa história que começou por um impulso já desde muito cedo sentido: tinha curiosidade em fazer sexo com estranhos. “Acontecia de eu pegar uma carona ou outra e fazer sexo”, revela. Mais sobre sua trajetória? Silêncio. "Não faz sentido [falar disso]", justifica.
A opção pelo trabalho sexual não foi fácil. Aos 19 anos, era estagiária do Ensino Médio e ganhava muito pouco. “Você tem que conviver num mundo em que há pessoas com poucas opções. Há pessoas que têm a opção de catar lixo ou de fazer um trabalho doméstico ou sexual. Considero que há uma condição mais empoderadora no trabalho sexual. Parece melhor trabalhar com sexo, mas todo trabalho tem seu lado complexo”, avalia.
Monique defende a profissão como uma escolha, mas lembra que ser trabalhadora sexual não é aquela imagem bonita da prostituta jovem que quer pagar os estudos e sustentar a família, como é representado nas novelas. “É uma escolha muito difícil, tem um estigma muito grande. Do meu trabalho eu gosto, as consequências dele é que são desagradáveis.”
Muito da visão preconceituosa que é mostrada do trabalho sexual parte de um entendimento que há na atividade exploração da mulher. É o que Gabriela Leite, a primeira prostituta a militar em favor dos direitos das trabalhadoras sexuais no País e fundadora da Rede Brasileira de Prostitutas, tentava explicar, lembra Monique: “Há a prostituta que vai fazer qualquer coisa por uma pedra. Para essa moça, se você pedir que ela faça um malabarismo, ela vai fazer. Ela não é uma profissional, ela está lutando pelo direito dela”. O mesmo serve para uma mulher que troca sexo por comida.
Gabriela faleceu em outubro de 2013 e deixou o “movimento órfão”, segundo Monique. Por isso, o aparecimento de militantes como ela se torna ainda mais importante para dar seguimento ao trabalho e promover pautas que estão há muito engessadas. Mesmo contando com um apoio emergente de ativistas feministas no mundo todo, a escolha da prostituição como profissão é alvo de críticas.
“Somos vistas como vítimas, como na Síndrome de Estocolmo. E não somos, estamos trabalhando. Todas as pessoas exercem seu trabalho e precisam de algum modo se submeter aos patrões. O desafio do trabalhador sexual é não se submeter ao desejo alheio, simplesmente”.
Para Monique, ser prostituta e feminista ao mesmo tempo é possível, e buscar este ponto de convergência é uma das missões que ela assumiu para 2015, cinco anos depois de ter assumido o ativismo digital.
“A sexualidade da mulher é uma coisa clandestina. Enquanto o homem pode e deve expor o quanto ele é promíscuo, conquistador, maravilhoso, nós nos escondemos. E imagina como é isso para uma prostituta que tá lá na esquina, ou na esquina da tua internet, no site, sempre de rosto coberto, de nomes trocados, com muito medo.”
Aos poucos, ela deixa a clandestinidade com o apoio de seus interlocutores na internet, da família e de movimentos espalhados pelo mundo. “Mas a personagem Monique deixou de existir pra mim faz tempo”, garante a prostituta que sempre trabalhou longe da abordagem direta. "Sou muito tímida."
O estigma que acompanha o sexo feminino é muito maior se pensado sob a ótica da trabalhadora sexual, que não tem direitos trabalhistas – uma luta que a gaúcha também abraçou, organizando um debate na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul para discutir os problemas da profissão e seus possíveis rumos.
Monique defende os direitos das minorias e não recusa trabalho por conta de visões reacionárias. “Mas não escreveria para um portal de direita”, garante a coeditora do Mundo Invisível, um site que trata de temas LGBT, feministas, da prostituição e de direitos de cada um dos grupos. Com a tradução também de artigos publicados no exterior, o portal ajuda a expandir a educação sobre o tema.
Com base na premissa, ela mantém uma carta de clientes de longa data, numa história que começou por um impulso já desde muito cedo sentido: tinha curiosidade em fazer sexo com estranhos. “Acontecia de eu pegar uma carona ou outra e fazer sexo”, revela. Mais sobre sua trajetória? Silêncio. "Não faz sentido [falar disso]", justifica.
A opção pelo trabalho sexual não foi fácil. Aos 19 anos, era estagiária do Ensino Médio e ganhava muito pouco. “Você tem que conviver num mundo em que há pessoas com poucas opções. Há pessoas que têm a opção de catar lixo ou de fazer um trabalho doméstico ou sexual. Considero que há uma condição mais empoderadora no trabalho sexual. Parece melhor trabalhar com sexo, mas todo trabalho tem seu lado complexo”, avalia.
Monique defende a profissão como uma escolha, mas lembra que ser trabalhadora sexual não é aquela imagem bonita da prostituta jovem que quer pagar os estudos e sustentar a família, como é representado nas novelas. “É uma escolha muito difícil, tem um estigma muito grande. Do meu trabalho eu gosto, as consequências dele é que são desagradáveis.”
A ativista no evento Puta Dei, em Porto Alegre, agora em junho |
Gabriela faleceu em outubro de 2013 e deixou o “movimento órfão”, segundo Monique. Por isso, o aparecimento de militantes como ela se torna ainda mais importante para dar seguimento ao trabalho e promover pautas que estão há muito engessadas. Mesmo contando com um apoio emergente de ativistas feministas no mundo todo, a escolha da prostituição como profissão é alvo de críticas.
“Somos vistas como vítimas, como na Síndrome de Estocolmo. E não somos, estamos trabalhando. Todas as pessoas exercem seu trabalho e precisam de algum modo se submeter aos patrões. O desafio do trabalhador sexual é não se submeter ao desejo alheio, simplesmente”.
Para Monique, ser prostituta e feminista ao mesmo tempo é possível, e buscar este ponto de convergência é uma das missões que ela assumiu para 2015, cinco anos depois de ter assumido o ativismo digital.
“A sexualidade da mulher é uma coisa clandestina. Enquanto o homem pode e deve expor o quanto ele é promíscuo, conquistador, maravilhoso, nós nos escondemos. E imagina como é isso para uma prostituta que tá lá na esquina, ou na esquina da tua internet, no site, sempre de rosto coberto, de nomes trocados, com muito medo.”
Aos poucos, ela deixa a clandestinidade com o apoio de seus interlocutores na internet, da família e de movimentos espalhados pelo mundo. “Mas a personagem Monique deixou de existir pra mim faz tempo”, garante a prostituta que sempre trabalhou longe da abordagem direta. "Sou muito tímida."
O estigma que acompanha o sexo feminino é muito maior se pensado sob a ótica da trabalhadora sexual, que não tem direitos trabalhistas – uma luta que a gaúcha também abraçou, organizando um debate na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul para discutir os problemas da profissão e seus possíveis rumos.
No cerne da questão, balizada pelo Projeto de Lei (PL) Gabriela Leite, de Jean Wyllys (PSOL-RJ), está a regulamentação do trabalho sexual e a descriminalização da prostituição em locais privados – que atinge não só as casas de prostituição, mas também os espaços privados das prostitutas, suas próprias camas. A prostituição é uma profissão reconhecida pelo Código Brasileiro de Profissões desde 2002.
O trabalho de Monique é uma forma de afirmar o poder feminino frente às visões conservadoras que ainda persistem em 2015. O que não deveria separar as mulheres, mas uni-las, numa forma de luta contra o status quo, que mantém o feminino refém de uma criação social fundamentada no patriarcal. “A pior ofensa para uma mulher é ter uma vida sexual, e uma vida sexual ativa, mudar de parceiros. Esse é o estigma da puta”, explica.
Um estigma e um preconceito que não se encerra nas mentes conservadoras ou masculinas, como se bem sabe: “Não tem a ver com cobrar por sexo. Tem a ver com regular o sexo das mulheres. Nós vigiamos a sexualidade uma da outra, nós mesmas reprimimos. Não entendo como nos convenceram disso”.
Carta Capital
O trabalho de Monique é uma forma de afirmar o poder feminino frente às visões conservadoras que ainda persistem em 2015. O que não deveria separar as mulheres, mas uni-las, numa forma de luta contra o status quo, que mantém o feminino refém de uma criação social fundamentada no patriarcal. “A pior ofensa para uma mulher é ter uma vida sexual, e uma vida sexual ativa, mudar de parceiros. Esse é o estigma da puta”, explica.
Um estigma e um preconceito que não se encerra nas mentes conservadoras ou masculinas, como se bem sabe: “Não tem a ver com cobrar por sexo. Tem a ver com regular o sexo das mulheres. Nós vigiamos a sexualidade uma da outra, nós mesmas reprimimos. Não entendo como nos convenceram disso”.
Carta Capital
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