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sábado, 13 de junho de 2015

Polêmica mudança na lei de trabalho infantil na Índia

Por 12/06/2015

Algumas crianças ganham até US$ 5 por dia para
reciclar lixo na Índia. Foto: Neeta Lal/IPS
 
Por Neeta Lal, da IPS – 
 
Nova Délhi, Índia, 12/6/2011 – O governo da Índia proibiu o trabalho de menores de 14 anos em setores comerciais, mas permitirá seu emprego em empresas familiares e nas terras de cultivo depois do horário escolar e durante as férias, em uma medida que provocou reação por parte das organizações defensoras da infância.
 
“Em um grande número de famílias, as crianças ajudam os pais em ocupações como agricultura e artesanato. E dessa forma também aprendem os conceitos básicos das ocupações”, diz um comunicado do gabinete ministerial, que aprovou uma emenda à lei de Trabalho Infantil (Proibição e Regulamentação), de 1986.
 
A modificação legal na Índia ocorre hoje, quando é celebrado o Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil, que afeta cerca de 120 milhões de meninos e meninas no planeta, segundo denúncias da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que pede para que esse trabalho, majoritariamente não remunerado, seja substituído por educação de qualidade para as crianças.
 
O novo texto da lei define como perigosos 64 setores trabalhistas e penaliza o emprego infantil em qualquer um deles. Os pais ou tutores não receberão punição na primeira infração, mas serão multados em um máximo de US$ 150 na segunda vez e subsequentes.
 
Entretanto, a lei permite que crianças trabalhem em empresas “não perigosas”, na indústria do entretenimento, que inclui cinema, publicidade e séries de televisão, e eventos esportivos relacionados com 18 ocupações e 65 processos produtivos especificados na lei de 1986.
 
A lei provocou um grande debate sobre o tema na Índia, em um momento em que a opinião pública está esmagadoramente a favor da erradicação de todo tipo de trabalho infantil. O ganhador do prêmio Nobel da Paz em 2014, Kailash Satyarti, que preside a organização defensora dos direitos da infância Bachpan Bachao Andolan, pede a proibição de toda forma de trabalho infantil até os 14 anos.
 
Os ativistas temem que a disposição, que permite que crianças ajudem nas ocupações domésticas ou derivadas da família, permita burlar o a lei. “A nova emenda empurrará milhões de crianças inocentes para o trabalho forçado e as privará da educação e de uma infância normal”, afirmou à IPS Rakesh Slenger, da Bachpan Bachao Andolan. “As meninas serão especialmente desfavorecidas, já que lhes será negada a educação e ficarão responsáveis por todo o trabalho da casa”, apontou.
 
Os ativistas estão em pé de guerra contra a mudança na lei do trabalho infantil na Índia, que permite o trabalho de meninos e meninas menores de 14 anos nas chamadas “empresas familiares”. Foto: Manipadma Jena/IPS
 
Os especialistas também temem que essa exceção legal viole o espírito da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Infância, que a Índia assinou e ratificou em 1992. Os mais prejudicados serão as crianças procedentes de setores marginalizados, que precisam se educar e se formar para melhorar suas perspectivas trabalhistas na terceira maior economia da Ásia.
 
O governo erra ao afirmar que a modificação da lei ajudará as famílias pobres a ganhar a vida, já que dotam seus filhos de experiência trabalhista, afirmam os ativistas pelos direitos da infância. O péssimo sistema de aplicação da lei complicará os esforços para vigiar as famílias que exploram seus filhos, advertem.
 
Outros dizem que a exceção legal terá impacto negativo nos progressos que o país conseguiu para levar a população infantil dos lugares de trabalho para as aulas, seguindo a meta número 2 dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) para alcançar o ensino primário universal até o final de 2015. Também vai contra a lei de Direito à Educação, de 2009, que garante às meninas e aos meninos o direito de terminar o ensino primário mesmo depois dos 14 anos.
 
Os especialistas afirmam que o governo passa por cima do fato de que, mesmo nas empresas familiares, as crianças continuam sendo vulneráveis aos riscos de exploração e de saúde que afetam sua educação. Outros alertaram para a possibilidade de que pais com uma ambição desmedida obriguem seus filhos a trabalharem no setor esportivo ou do entretenimento.
 
Para a OIT, o trabalho infantil é “uma violação dos direitos humanos fundamentais”, que afeta o desenvolvimento da menina e do menino e que pode provocar danos físicos ou psicológicos irreversíveis. A profunda investigação da OIT sobre o tema demonstra que a erradicação do trabalho infantil pode ajudar as economias em desenvolvimento a gerar benefícios econômicos quase sete vezes maiores do que os custos para melhorar o ensino e os serviços sociais.
 
A Índia tem a duvidosa honra de contar com o maior número de crianças que trabalham no mundo. Segundo o censo de 2011, havia 4,35 milhões de crianças com idades entre cinco e 14 anos trabalhando. Um em cada cem trabalhadores de tempo integral era menor de 14 anos, e um terço deles era formado por menores de nove anos. Isso não faz prever nada bom para um país de 1,25 bilhão de habitantes, dos quais 42% são meninos e meninas.
 
Muitas crianças estão presas na pobreza, já que aproximadamente 23% da população sobrevive com menos de US$ 1,25 por dia, especialmente desde que o governo reduziu, em US$ 1,5 bilhão este ano, a cota do orçamento destinada ao Ministério da Mulher e do Desenvolvimento Infantil. Os ativistas alertam que essa medida poderá privar milhões de crianças marginalizadas da oportunidade de melhorar suas vidas.
 
Segundo o Ministério do Trabalho, na Índia as crianças trabalham em uma extensa gama de ocupações perigosas e estressantes. No setor agrícola, muitas devem transportar pesadas cargas e jogar pesticidas prejudiciais sobre os cultivos. Em outubro do ano passado, uma explosão em uma fábrica de fogos de artifício em Godavari, no Estado de Andhra Pradesh, deixou uma dezena de pessoas mortas, entre elas várias crianças.
 
A indústria do cigarro é particularmente conhecida por empregar crianças de até sete anos de idade. O governo informa que há 4,4 milhões de trabalhadores empregados nesse setor informal, mas organizações da sociedade civil afirmam que o número real chega a cerca de dez milhões de crianças. A produção de cigarro implica a exposição prolongada às folhas de tabaco, que podem causar doenças potencialmente mortais como tuberculose, bronquite crônica, asma e desnutrição, entre outras.
 
As chamadas “empresas familiares” não são melhores, segundo os especialistas. Entre estas há fabricantes de caixas de fósforos, de tapetes e polidores de joias. Nesses setores, onde o trabalho infantil é muito solicitado, as ações policiais trouxeram à tona as condições desumanas nas quais as crianças são obrigadas a trabalhar sem remuneração, com pouca comida e sem acesso aos serviços de higiene.
 
Envolverde/IPS

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