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segunda-feira, 21 de março de 2016

O risco de ser mulher no México

Na capital do país, 72% das mulheres denunciam ter sofrido abuso sexual

ELENA REINA
Cidade do México 12 MAR 2016

A jornalista agredida no DF, Andrea Noel.
A jornalista agredida no DF, Andrea Noel. Cortesía de Andrea Noel

Fim do assédio sexual e mais 10 pontos para o “busão dos sonhos” paulistano
A jornalista norte-americana Andrea Noel foi humilhada por um homem no dia 8 de março, enquanto caminhava por um dos bairros da moda da Cidade do México. Foi um gesto rápido: ele levantou o vestido da jornalista e puxou sua roupa íntima. Noel, de 26 anos, conseguiu o vídeo de uma câmara de segurança privada e postou nas redes sociais. Logo se tornou viral. Mas no Dia Internacional da Mulher outras mulheres no México sofreram agressões sexuais que não se transformaram em trending topic. Estes são os riscos de ser mulher na capital mexicana.

A grande maioria das mulheres da Cidade do México denuncia ter sofrido algum tipo de violência sexual, 72%, segundo os números o Instituto Nacional de Estatística (INEGI). Isso é mais que a média nacional e supera os Estados mais violentos do país, como Guerrero ou Chihuahua. E a violência é mais recorrente com as mais jovens, como Noel. Nesses casos o número de abusos aumenta para 78 de cada 100 mulheres entre 20 e 29 anos.

“O que esse sujeito fez comigo nem sequer é o mais forte que me aconteceu nesta semana”, sentencia  Noel pelo telefone. Ela continua indignada e recorda que naquela tarde, quando foi realizar a denúncia, havia outras garotas que tinham sofrido agressões “muito mais graves” e não receberam o mesmo tratamento: “Ao meu lado havia garotas chorando. Achei muito absurdo que dedicassem tanto tempo e tantas pessoas para me atender quando havia outras com problemas mais sérios. O meu tinha sido o mais frívolo, mas tinha feito sucesso nas redes sociais”, conta.

Outra jovem, Noelia Kubatov, de 28 anos, não teve a mesma sorte sorte no Ministério Público. Na semana passada, quando foi denunciar que um homem tinha tirado fotos de suas nádegas enquanto caminhava por um dos bairros nobres da cidade, trataram-na como “louca”, embora pudesse provar que ele tinha as fotos, conta. “De início, não quiseram registrar a ocorrência, fizeram ameaças dizendo que, se estivesse dando falso testemunho, poderia pegar de 2 a 6 anos de prisão”, conta. Duas mulheres tiveram dó dela, a médica que a examinou e uma advogada: “Recomendaram que eu me mostrasse vulnerável, que de nada servia parecer segura e valente. Assim o caso não interessa. Tem que demonstrar medo, diziam”, recorda Kubatov. O sujeito que ela denunciou trabalha a poucas ruas de sua casa.

Um dos lugares onde fica mais evidente que as mulheres aprenderam a conviver com a situação é no transporte público. O metrô da Cidade do México mantém a separação de homens e mulheres no horário pico para evitar “toques”, como afirmou o diretor do serviço em uma entrevista ao EL PAÍS. A segregação por sexo também se observa em alguns ônibus e táxis cor-de-rosa que circulam pela capital. Isso se deve ao fato de que 48% de mulheres admitem ter sofrido assédio sexual nesses locais, em sua maioria de tipo físico, segundo um estudo de 2014 elaborado pela associação El Poder del Consumidor e o instituto de pesquisas Dinamia. A maioria dos 1.400 pesquisados dizia ser a favor da separação de gêneros no transporte.

“Todo mundo achava uma bobagem o que tinha acontecido comigo. Compreendi então que se você consegue escapar de um assédio ou abuso grave e decide denunciar, não te escutam. Não existem medidas preventivas. Não sabemos para que aquele cara queria minhas fotos e não é exagerado pensar no tráfico de mulheres no México”, queixa-se Kubatov. “Neste país, o que aconteceu comigo na rua é o mínimo que pode acontecer com uma mulher. Naquele mesmo dia certamente muitas mulheres estavam sendo estupradas, sequestradas ou desaparecendo”, diz a jornalista norte-americana.

No México morreram sete mulheres por dia entre 2013 e 2014, segundo dados do órgão nacional de estatísticas. Enquanto a taxa de homicídios de homens diminuiu gradualmente desde 2011 em nível nacional, a de mulheres se mantém como um problema estrutural. “Os assassinatos femininos derivam de um padrão cultural e menos das mudanças da violência pelo crime organizado”, explica o INEGI em seu relatório.

Na capital, foram assassinadas 402 mulheres entre 2013 e 2015, três por semana, e o número não para de aumentar há 10 anos. As taxas mais altas ocorrem no distrito de Cuauhtémoc, região central da Cidade do México, exatamente onde foram agredidas Noel e Kubatov nas últimas semanas.

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